Célio Cunha

Quais os caminhos a serem seguidos e as principais dificuldades, considerando que o Brasil é a 9ª potência econômica do mundo, embora se encontre entre os países com os maiores níveis de exclusão e desigualdade social: no ranking de Desenvolvimento Humano ocupa o 70º lugar? Somente no ensino fundamental público, o País precisaria de 247 anos para igualar o nível de conhecimento de crianças e jovens brasileiros aos de alunos de países desenvolvidos.
Essa crise econômica coloca uma interrogação em tudo. Se antes da crise o problema da falta de investimentos na educação já existia, certamente agora ele irá se agravar. Há certa importância na presença de um presidente negro à frente de uma potência econômica mundial para equilibrar esse quadro. O discurso de Barack Obama nos leva a acreditar que ele será um grande defensor da inclusão social. Acho que esse derretimento das bolsas mundiais mostrou que o capitalismo não pode continuar nessa direção, que o lucro tem um limite. A diminuição de recursos na educação é proporcional ao aumento dessa visão do lucro em escala mundial. À medida que se conseguir o desenho das relações econômicas do mundo deverá equilibrar os investimentos sociais. Esse é o sonho que temos daqui para frente. De que um novo padrão possa ser discutido entre os países ricos e os emergentes para a criação de um novo quadro. A crise mostrou que essa postura que subtraía investimento da área social é inviável e que coloca o mundo em risco. E o desafio de Obama é conduzir o mundo a um novo quadro de equilíbrio.
Vários fatores têm dificultado o desenvolvimento da educação mundial, mas um dos mais importantes é que foram poucos os países que, de fato, tomaram a decisão de colocar a educação como prioridade de estado. Ou seja, há um discurso mundial de educação para todos, de ênfase na qualidade da educação. Mas, entre o discurso e a concretização dessa postura, existe ainda uma distância muito grande. Em decorrência disso, os investimentos que se esperavam para a educação ainda estão muito aquém do ideal. A UNESCO recomenda que os países da America Latina invistam no mínimo 6% do PIB. Poucos países no mundo atingem esse percentual… Outro fator é a organização dos sistemas escolares. Existem muitos problemas de gestão do sistema de educação, da falta de valorização do professor. Poucos países asseguram ao professor uma carreira decente, além dos diversos problemas que surgem em sala de aula. A escola, de modo geral, não está suficientemente preparada para enfrentar todas as dificuldades de aprendizado do aluno. Se ele não está aprendendo, devemos descobrir o que está acontecendo. Quais são as suas dificuldades? A questão não é reprovar. O Brasil tem uma média de reprovação de 19%. Cada aluno reprovado é um problema que você acumula. E isso amplia o desafio educacional. Temos que ter uma política de educação de estado, que possa, gradativamente, dar conta da grande tarefa da educação. Precisamos de escolas em que o aluno possa, de fato, ter condições de estudar e aprender, para assim se inserir num movimento mundial de educação continuada ao longo da vida.
O Brasil, por exemplo, apesar do discurso bem feito do presidente Lula, investe apenas 4% do PIB em educação. O desafio brasileiro é maior que o da Argentina, do Chile e do Uruguai porque o país se omitiu no quesito educação popular. Nos anos 20, Almeida Júnior, que foi um grande educador, já denunciava o esquecimento da educação primária. Os municípios brasileiros reivindicavam delegacias, fontes luminosas, mas não falavam sobre educação, escolas.
Hoje, ainda percebemos esse problema social. Se você fizer uma enquete das prioridades da população, a educação irá aparecer em quarto, quinto lugar. Não parte da sociedade brasileira a percepção clara da importância estratégica da educação na vida das pessoas. Ela é o instrumento mais seguro para superar a pobreza. Mas se essa percepção não existe na sociedade, ela não estará entre os políticos, pois eles se reportam à população.
Se compararmos os atuais meios de comunicação e os que existiam antigamente iremos perceber que a comunicação entra num novo paradigma. Que ela tem uma implicação política de grande alcance. Com as novas ferramentas de comunicação daremos um impulso na universalização da cidadania no século XXI. A democratização irá avançar apesar das pressões e dos conflitos. O mundo começa a se comunicar e as pessoas começam a se incomodar com a sua situação. A internet gratuita opera em escala mundial.
Assim, a educação começa a correr independente da escola. A internet se tornou um ator educacional. Vivemos na era da sociedade da informação. A UNESCO se esforça para investir na alfabetização a todos porque assim contribui também para o acesso às novas fontes de informação. Este é um processo que está em marcha.

Célio da Cunha – Educador e assessor especial da UNESCO no Brasil

Fonte: Estadão