Arquiteta gaúcha, que mora em Porto Alegre, mas nasceu em Caxias do Sul, amplia o campo das pesquisas de materiais alternativospara a construção. Ela desenvolveu trabalho sob o tema“Concreto polímero com PET reciclado”

Nildo Carlos Oliveira

Karina Tonet, esse é o seu nome. Há 13 anos mantém escritório de arquitetura em Porto Alegre. Embora trabalhe exclusivamente com interiores residenciais e comerciais em duas modalidades – reforma de imóveis usados ou assessoria – não descuida de pesquisas de materiais alternativos. Nem de um projeto pelo qual deverá dedicar-se, no decorrer deste ano (2014), à área de perícias.
Karina Tonet: da pesquisa à prática

Com o seu espírito inquieto decidiu, há algum tempo, mergulhar na pesquisa do concreto polímero com garrafas PET recicladas. O trabalho, resultante de uma dissertação de mestrado desenvolvida sob a orientação da doutora Jane Gorninski, professora da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (RS), mostra a eficiência da substituição de uma resina convencional por uma resina obtida através daquele tipo de procedimento.

“Provamos assim”, diz a arquiteta, “que pesquisas como essa contribuem para a criação e uso de materiais reciclados na construção, ajudando a economizar recursos naturais e a garantir um destino ambientalmente correto para os resíduos industriais”. No depoimento que se segue, exclusivo para a revistaO Empreiteiro, estão mais pormenores sobre a pesquisa da arquiteta. Segue a íntegra da entrevista:

Sempre quis pesquisar materiais alternativos para a construção civil, principalmente com materiais descartados, que oferecem potencial de reúso. Mas tudo começou em 2007, no mestrado de gerenciamento de resíduos, na Faculdade de Engenharia Civil da Unisinos.

Do lixo para o concreto: as boas ideias precisam do apoio setorial

Recebemos ali o resíduo alumina de polimento de uma metalúrgica que fica em uma cidade próxima da universidade. Interessei-me por ele imediatamente. Tratava-se, afinal, de um material nobre. Comecei a pesquisar a sua composição, bem como a maneira de utilizá-lo na construção civil. Acabamos, eu e minha orientadora, Jane Gorninski, concluindo que ele poderia ser útil, desde que adicionado a algum material que tivesse maior combustibilidade, aumentando, com isso, sua resistência ao fogo.

Quando comecei a pesquisa propriamente dita, observei que a relação com o fogo era exatamente o ponto fraco do concreto polímero. Isto porque ele é um concreto no qual o cimento é substituído por uma resina polimérica. Optamos, então, por trabalhar com uma resina reciclada de garrafas PET, pois estas já estavam sendo apresentadas como objeto de outras pesquisas no mundo. Normalmente, aquele concreto recebe adições de retardantes de chamas industriais, e a possibilidade de substituí-las por um resíduo tornaria tal pesquisa inédita.

Os resultados que obtivemos com a adição do resíduo alumina foram comparados a amostras que receberam a adição de um retardante de chamas comercial, bem como a uma amostra sem nenhuma adição de retardante de chamas. Os ensaios de propagação de chamas demonstraram que as amostras com resíduo e com retardante comercial apresentavam comportamentos semelhantes. E as amostras com maior quantidade de adição de retardante apresentaram uma redução de 87% no tempo de propagação da chama quando comparado a uma amostra sem nenhuma adição. Esta redução é de suma importância no caso de um incêndio em uma construção.

Diversos materiais da construção civil são combustíveis e acabam aumentando a propagação do fogo em caso de um incêndio. A pesquisa demonstra que a adição de componentes com retardante pode fazer uma grande diferença na magnitude do sinistro. Além disso, existem diversos resíduos industriais nobres sendo encaminhados a aterros por falta de pesquisas na área de reciclagem. No caso da pesquisa que realizamos, o resíduo utilizado é proveniente de uma indústria metalúrgica e foi utilizado da forma original, sem processamento, apenas tendo passado por uma peneira (no caso da minha pesquisa). Ou seja: a aplicação deste é muito fácil. Os detalhes podem ser encontrados na patente originada nesta pesquisa.

Apesar de ter testado apenas com concretos poliméricos, o resíduo poderrá ser empregado em outros produtos poliméricos da construção, tais como tubulações, mantas, resinas, revestimentos, borrachas etc. Se as indústrias que fabricam estes materiais tivessem tal preocupação quanto à proteção contra o fogo, poderíamos ter construções mais seguras, com tempo de fuga maior para as pessoas, e com menos destruição da edificação. Ou seja, uma redução importante nas perdas frente a um sinistro.

O concreto polímero é extensamente utilizado em diversos países do mundo, porém pouco empregado ainda no Brasil. Eu aposto na inserção deste material no País, pois o cimento provém da extração de recursos naturais não renováveis. Portanto, alternativas, como a substituição do cimento por resina reciclada do PET, seriam uma alternativa ecologicamente correta.

Depois que publicamos, este ano, um artigo sobre a pesquisa em uma revista internacional, recebemos diversos convites para novas publicações, participações em congressos, visitas de alunos na universidade etc. Embora o mundo inteiro esteja interessado em encontrar alternativas ecologicamente corretas para seus produtos, me parece que estes assuntos têm prioridade maior apenas no meio acadêmico e como pesquisa. Contudo, já é chegado o momento de darmos solução para os resíduos gerados e de partirmos para a substituição dos naturais, cada vez mais escassos.

Fonte: Revista O Empreiteiro