Alem do gás natural de xisto produzido por “fracking”, que transformou o país num exportador de combustível, a energia solar com geração distribuída também pode incorporar milhões de instalações residenciais, cujo excedente de consumo passa a ser um crédito líquido na conta mensal

No melhor estilo de economia capitalista, uma revolução silenciosa se alastra nos Estados Unidos, quando muitos estados adotaram a tarifação líquida, pela qual uma residência recebe um crédito pela energia excedente que transmite à rede pública, após o consumo próprio. Essa tendência se acelerou, quando foi autorizada, em 22 estados, a instalação de painéis fotovoltaicos por terceiros nas residências, sem custos para os proprietários. Criou-se literalmente um novo mercado, em que os participantes são os proprietários das residências que garantem o consumo, os instaladores dos painéis fotovoltaicos que custeiam o sistema e a rede pública que recebe a energia excedente — sob monitoramento das agências reguladoras. Em 2013, os sistemas de energia solar instalados por terceiros já predominavam nos estados de Califórnia, Arizona, Colorado e Massachusetts.
 

Naturalmente as distribuidoras de energia reclamam dos ganhos obtidos pelos usuários via tarifação líquida, sem ter de pagar pela manutenção da rede elétrica que eles utilizam para transferir de volta o excedente de energia gerado. A entidade norte-americana Solar Electric Power Association sugere três alternativas para as distribuidoras: cobrar uma taxa mensal de infraestrutura dos usuários com fonte solar; dividir em itens os custos de manutenção da rede elétrica de modo que se possa calcular esse item isoladamente; e separar as contas de energia consumida e vendida, de modo que o usuário de fonte solar venda toda a energia que produz e compre de volta a que consome.

 

Essas propostas, entretanto, não respondem à questão do valor a ser pago pelas distribuidoras pela energia solar produzida pelo usuário, a ser decidida pelos órgãos reguladores. De qualquer maneira, o modelo tradicional de negócio de distribuição elétrica está ameaçado de vez pelo crescente uso de geração pulverizada de energia solar nos Estados Unidos.

 

Se não podemos vencer o inimigo, vamos nos aliar a ele. As distribuidoras norte-americanas estão expandindo rapidamente sua capacidade de geração solar, saindo de 2.390 MW instalados em 2012 para 4.100 MW no ano passado. Trinta estados no país já obrigam as empresas de energia a utilizar fontes limpas em parte, mas a geração solar ainda se destaca pelos baixos custos da instalação, capacidade máxima por volta do horário de pico de meio-dia e proteção contra a volatilidade dos combustíveis.

 

A maio parte desses ganhos está precificada — tanto que o preço dos módulos fotovoltaicos sofreu uma ligeira alta nos meses recentes, que deve se acentuar se o governo norte-americano taxar as importações da China, em benefício dos produtos locais. 

 

A maior planta solar do mercado

Um oceano de 173,500 mil espelhos reflete os raios do sol da Califórnia na direção de caldeiras instaladas no topo de três torres de 150 m de altura, em Ivanpah Dry Lake, perto de Las Vegas (Nevada). A planta solar de Ivanpah é a maior já construída no mercado, comissionada em fevereiro passado, com capacidade total final de 377 MW, que vai atender a 140 mil casas. O projeto pertence à NRG Energy, ao Google e à BrightSource Energy, esta detentora da tecnologia da torre solar, cuja construção está sob responsabilidade da Bechtel. Em agosto passado, o contingente de trabalhadores atingiu o pico de 2.100 homens e mulheres.

 

O gerente de campo Hagai Hess constrói heliostats — o nome técnico do espelho — desde 2009, na planta solar da Chevron em Coalinga, Califórnia, usando a tecnologia da BrightSource. Ela produz 29 MW empregando quase 4 mil heliostats. Ivanpah tem 43 vezes mais espelhos.

 

Na região desértica de Ivanpah, os ventos obrigam as equipes a trabalhar muitas vezes à noite, por razões de segurança, quando as rajadas são mais fracas. A etapa seguinte é integrar os “cérebros” dos heliostats e o sistema de controle do campo solar, fazendo com que os espelhos sigam o sol e interajam com o gerador de vapor e o receptor solar no topo da torre.

 

A energia solar avança a olhos vistos nos Estados Unidos, representando 29% da capacidade geradora instalada em 2013, atrás apenas do gás natural, com 46%. Analistas acreditam que crescerá outro tanto este ano. O governo norte-americano fixou a meta de elevar a energia solar para suprir um terço da demanda nacional por volta de 2050 — partindo de menos de 1% hoje.

 

Mas plantas gigantes, como Ivanpah, não vão se multiplicar na paisagem, porque as linhas de financiamento barato do governo não foram renovadas. As apostas estão nos painéis fotovoltaicos, que transformam os raios solares diretamente em eletricidade, e são fáceis de instalar no telhado das casas ou lojas. Seu preço vem caindo com a demanda em alta, levando a um total de 200 mil instalações feitas desde 2012 nos Estados Unidos, com metade na Califórnia.

 

Provando que poderá resistir ao fim dos subsídios oficiais, o programa de incentivo na Califórnia, que contou com US$ 2 bilhões, já expirou, após dar bônus em dinheiro para proprietários individuais que instalassem fontes solares. A prova definitiva virá em 2017, quando o crédito de imposto federal cairá de 30% para 10%. Os especialistas não acreditam em impacto maior sobre este mercado; ao contrário, eles apostam que, neste intervalo, surja alguma tecnologia eficiente e barata para estocar energia, como a entrada em operação da fábrica de baterias do criador do carro elétrico Tesla, que promete derrubar os preços desse componente. A estocagem de energia é o elo que falta para tornar plantas gigantes, como Ivanpah, mais competitivas.

Fonte: Revista O Empreiteiro