A ideia até que é boa. O diabo é o traçado. Fazer uma ligação viária entre as avenidas Eliseu de Almeida e Corifeu de Azevedo Marques reduz sinuosidades e economiza tempo, numa cidade onde não se tem mais tempo para sentir, nem se comover com a beleza de sua forma e espaço.
Mas o traçado comete pecados. Um deles, o principal, é o túnel que, a partir da Eliseu, comprometeria o Parque da Previdência e desembocaria na praça Elis Regina, na Vila Gomes, ali no Butantã. Essa região, já sem número satisfatório de praças para a sua população, seria sacrificada em favor do carro, involuntariamente, o inimigo número 1 da cidade.
A praça Elis Regina, cotidianamente maltratada, eventualmente vítima da fúria anárquica de vândalos, continua a ser, apesar disso, o espaço para passeios e para as caminhadas em círculo, de manhã à noite, de moradores próximos ou distantes, mas que sentem necessidade dela. Destruí-la, seria um golpe contra o pouco de felicidade que ela atrai, na paisagem do entorno.
Por sorte, os moradores se uniram, bateram pé, fizeram abaixo-assinado e se agruparam em um site para protestar. A cidadania fortaleceu-se no protesto unificado. O resultado parece que está levando os adversários públicos da praça, e eternos amigos das empreitadas, a raciocinar. Se assim é, por que não alterar o traçado? Por que insistir numa queda de braço contra os que querem proteger o espaço, que embora minimamente delimitado, corresponde a uma possibilidade de mais oxigênio em sua vontade de viver?
O túnel e a praça. Obra boa é aquela que não sacrifica o povo, sobretudo quando ele ainda consegue revelar a capacidade cidadã de indignar-se. Quero cumprimentar, por conta disso, o meu povo da Vila Gomes.
Fonte: Estadão
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