Muita água ainda fluirá sob a ponte até que a sociedade, como um todo, tenha uma idéia mais clara do que foram, são e do que serão as consequências dos oito anos do governo Lula da Silva. O impacto delas na economia, na política interna e externa, na política para a ascensão social das amplas camadas miseráveis e pobres e no processo da modernização brasileira.
Nem tudo serão loas. A avaliação de um governo não pode ficar por conta de uma mitificação personalista. Os atos terão desdobramentos no curto e longo prazo. Mas, essa triagem, somente a peneira implacável da história terá condições de fazer bem feito.
Por ora, se considerarmos os governos que transformaram em profundidade o Brasil – Vargas, JK e o ciclo dos ditadores – poderemos afirmar que o governo Lula foi satisfatório. A saúde continua de ruim a péssima; a educação prossegue capenga; a questão habitacional não foi resolvida. O saneamento está pela hora da morte em amplas regiões brasileiras e a infraestrutura passa sufoco nos portos, aeroportos, rodovias, hidrovias e ferrovias. As cidades incharam e esse inchaço se reflete na deterioração e ineficiência dos transportes públicas nas grandes metrópoles.
Diante desse quadro, onde, então, ele foi bom e o que justifica a avaliação estratosférica? Respondo: nas oportunidades que ele abriu para a ascensão de uma faixa populacional que não tinha nada e que, agora, ao menos tem um pouco, como resultado da transferência de renda da classe média (classe média?) para os mais desvalidos. De quebra, ele deixou oportunidades para os ricos ficarem mais ricos.
Houve oportunidades, também, ensejadas pelas obras de infrestrutura. Um País que não fazia nada, nessa área, há 25 anos, de repente começou a fazer alguma coisa. Estaleiros voltaram a funcionar; usinas hidrelétricas começaram a ser construídas; projetos engavetados começaram a ser colocados na mesa para reexame. Tudo isso à luz de um sol favorável: a economia externa e, mais recentemente, as projeções dos efeitos prováveis da Copa e da Olimpíada.
Isso tudo não pode jogar no esquecimento ou para debaixo do tapete a degenerescência de costumes políticos: o caso do mensalão e da farra do boi com cartões de crédito corporativos. O escândalo recente, à margem do poder executivo, do aumento exorbitante dos parlamentares, que é uma forma de esbulho do bolso da sociedade, e o desvio de R$ 43 bilhões de fundos da área de telecomunicações para "financiar desequilíbrios do Estado", conforme editorial do jornal FSP do dia 22 último.
Então, não se pode esquecer, no balanço do governo Lula, um dado fundamental: o mito, muitas vezes, tem pés de barro.
Fonte: Estadão
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