A ideia é estranha e, os argumentos defendidos para sustentá-la, mais estranhos ainda. A administração Kassab está vetando vagas de garagens nos novos prédios que vierem a ser construídos pela Cohab paulistana ou até aqueles financiados pelo programa federal Minha casa, minha vida, em áreas da Capital.
O argumento principal é de que prédios populares sem garagem podem estimular o uso do transporte coletivo. Ou o uso da bicicleta. Além do que, ainda segundo cérebros burocráticos da administração Kassab, as pessoas que fazem a opção por aquele tipo de habitação popular a rigor se encontram em uma faixa salarial que fatalmente as inibirá a adquirir carros particulares. Por outro lado – e imagino que na raiz desse raciocínio esse é o argumento de maior peso – a construção de prédios sem garagem custaria menos.
Em linhas gerais, seja qual for o argumento, a ideia é desastrosa. Até inconcebível, para o padrão dos nossos dias. Primeiro, porque imaginar o estímulo ao uso do transporte coletivo, sem que tal meio de transporte exista nos padrões e qualidade requeridos, é imaginar o impossível ou querer tripudiar sobre o poder de raciocínio da população. Segundo, porque quem ganha um salário numa faixa irrisória, hoje, pode ganhar um salário melhor amanhã e pretender, sim, adquirir o seu carro particular, mesmo que seja para uso de fim de semana. E, terceiro, a construção de prédios sem garagem, por preços mais baixos, interessaria a quem?
Lembro algum tempo, já um tanto disperso na memória, que um mestre da arquitetura paulista, convocado a projetar prédios populares, projetou-os com pilotis, exatamente para que o comprador não se sentisse alijado da possibilidade futura de comprar o seu carrinho. Foram prédios bem concebidos, articulados, nos quais a economia final não se centrava na falta disso ou daquilo, mas na inteligência exposta no projeto, na economia de escala e nos critérios adotados para construí-los. Nivelar por baixo, no contrapé, é excluir. E a prefeitura não pode programar construção de prédios populares já com a premissa da exclusão.
Fonte: Estadão
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