Imagine uma fábrica que não pára de crescer, mas não tem carros suficientes para entregar suas mercadorias. O armazenamento e a segurança do estoque ficam caros, os produtos envelhecem e produzir passa a não valer a pena.
É assim o Brasil: uma grande empresa que quer crescer,
mas cuja infraestrutura não ajuda

Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) apontam que a produção de grãos de 2010 foi 8,5% superior à de 2009 (133,8 milhões de t). De acordo com a Confederação Nacional da Indústria (CNI), a situação financeira e o progresso na indústria brasileira seguem satisfatórios. Numa escala de zero a 100 pontos, o Brasil fica com 50 a 52 pontos, sendo crescente esse índice, ano após ano.
No entanto, o escoamento para os grandes centros urbanos ou mesmo para o exterior encarece o valor final das mercadorias e, assim, perdemos competitividade. O Brasil é um gigante com potencial, mas com gargalos que freiam qualquer arrancada.
Problemas como estradas mal conservadas e inacabadas, ferrovias em extensão insuficiente, hidrovias inadequadas e portos obsoletos põem em risco a competitividade do País, que fica à mercê e refém desses entraves. Para que estes nós sejam desatados, o Brasil precisará investir cada vez mais em infraestrutura; garantindo competitividade; desobstruindo suas rotas e gerando energia eficiente.
O então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em discurso no lançamento do Programa de Aceleração do Crescimento 2, em março de 2010, afirmou em relação aos investimentos dos PAC.: "Ferrovias, usinas hidrelétricas, estradas, portos, aeroportos e outras grandes obras estruturantes são peças fundamentais para o Brasil de hoje e para o Brasil do futuro. Precisamos continuar fazendo obras com eficácia e rapidez para recuperarmos o tempo que perdemos nas últimas décadas (…). Eu acredito no Brasil como uma das principais economias do mundo em 2015".
O economista e professor da Universidade de Brasília (UnB), José Luís Oreiro, não tem a mesma convicção. Garante que o Brasil, por mais investimento que esteja injetando atualmente projetos, ainda investe pouco. "O País, que vem investindo apenas 1,8 %do Produto Interno Bruto (PIB), poderá ser uma 5ª potência em 2025 a 2030. É necessário acelerar a faixa de crescimento sustentável, pelo menos em 5,5 % ao ano".
O PAC 1, lançado em 2007, tentou organizar e estimular os grandes investimentos estratégicos do Brasil, e muitas obras deverão ter continuidade no PAC 2. Na primeira fase do programa foram investidos R$ 619 bilhões e 18% dos projetos não foram iniciados. O investimento público para o PAC 2 ( 2011 a 2014) será de R$ 657,4 bilhões.

Ferrovias
Uma das prioridades do PAC 2 é o sistema ferroviário. Embora seja o meio ideal para as vencer as grandes distâncias de cargas, principalmente a granel, o Brasil ignorou este modal nas últimas décadas. Em 1958, havia mais de 38 mil km de ferrovia. Hoje, este número caiu para 28 mil km de malha – um decréscimo de 25%.
Todavia, este segmento está, aos poucos, voltando a se reerguer. Investimentos oriundos do governo federal e de empresas privadas, em forma de concessões, despejam recursos na melhoria do material rodante e na malha. Há oito anos, o País fabricava anualmente 100 vagões ferroviários; atualmente, são cerca de 800 por ano. O Brasil importava locomotivas. Em 2010, foram fabricadas aqui mais de 100.
Também em 2010 a Valec – Engenharia, Construção e Ferrovia, empresa pública responsável pela operação de ferrovias no Brasil, investiu R$ 1,9 bilhão, sendo que R$ 1,89 bi foram gastos com as obras de construção da Ferrovia Norte-Sul, R$ 12 milhões, com estudos e elaboração do projeto da Extensão Sul da FNS; R$ 27 milhões, com estudos e projetos da Ferrovia de Integração Oeste-Leste; R$ 18,5 milhões, com estudos e projetos diversos como o prolongamento da Ferrovia Norte-Sul (ao Norte – Açailândia até Belém e ao Sul – Estrela do Oeste-Panorama; em São Paulo, até Porto Murtinho (MS); além dos estudos da FICO, do Ramal da Ferrovia Norte-Sul: Estreito(MA) – Balsas(MA) -Elizeu Martins (PI), entre outros.
Não é possível dizer qual ferrovia precisa de mais atenção. Toda a rede precisa requer melhorias. Além da ferrovia Norte – Sul, a Transnordestina, empreendimento de 1.728 km, que passará pelos estados de Pernambuco, Piauí e Ceará, também é prioridade. Apesar dos atrasos nas obras, os números mostram a dimensão da obra, iniciada em 2006 e retomada recentemente: 11,3 mil operários e 1,6 mil máquinas em 20 frentes de trabalho diretos.
A pauta a ser discutida ainda este ano pelo Ministério dos Transportes é tocar o polêmico projeto Trem de Alta Velocidade (TAV), que prevê a ligação Rio-São Paulo-Campinas. O trecho será percorrido em, aproximadamente, 90 minutos. O valor originalmente estimado era de R$ 34 bilhões. Deste montante 60% deverão ser garantidos pelos cofres públicos, por meio de financiamento do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e de recursos da União. Os outros 30% serão investidos pela empresa a ser criada especialmente para absorver a tecnologia do TAV. Os 10% restantes serão financiados pela Eximbank, que opera como órgão oficial de crédito para exportação.
A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) oficializou, em novembro do ano passado, a entrega das propostas do TVA, ficando para a primeira quinzena de abril deste ano e, o leilão, para dia 29 do mesmo mês. Uma viagem de trem-bala deverá custar para os passageiros cerca de R$ 200 na classe econômica e R$ 350 na classe executiva. As principais críticas ao projeto referem-se aos estudos geológicos insatisfatórios ao longo do traçado e a sua duvidosa viabilidade econômica.
O "termômetro" da economia aponta que 2011 será um ano promissor para a malha ferroviária. Após anos de abandono, ela começou a voltar a andar nos trilhos a partir de 1996. De lá pra cá, as concessionárias privadas investiram mais de R$ 11 bilhões em recuperação e manutenção da malha existente. Investimentos em tecnologia, mão de obra qualificada, máquinas mais modernas estão previstos para fazer com que este meio de transporte conduza uma quantidade de pessoas e bens materiais pelo Brasil afora.

Rodovias
Não é preciso ser um caminhoneiro para saber: as estradas não concedidas estão em condições deploráveis. É complicado dizer até o que é mais urgente: acostamento, placas sinalizadoras, segurança ou qualidade do material de pavimentação.
Conservando as vias, serão possíveis ganhos significativos para a economia brasileira. Tendo em vista que isso reflete na renda dos produtores, na lucratividade das suas exportações e até mesmo nos índices de inflação.

Sendo a agricultura uma das bases de nossa economia, se perde tempo e dinheiro ao transportar suas principais commodities agroindustriais, como milho, café e açúcar pelas estradas em condições precárias, isso quando não acontece o absurdo do produto não chegar ao destino final, com caminhões enguiçados pelo caminho.
Um exemplo é a BR-163, uma das principais ligações do oeste do Paraná aos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Além da má conservação, o asfalto é irregular. São vários trechos nessa situação.
Segundo o diretor geral do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), Antônio Luís Pagot, a evolução na malha rodoviária federal está sendo reestabelecida. "Estamos a caminho da completa recuperação até 2014."
O diretor salientou que, mesmo com o crescente aumento do volume e a constante ampliação da frota nacional de veículos de todos os portes, a melhoria nas rodovias foi possível graças à aprovação, em 2008, do Programa Nacional de Manutenção.
Utopia? Talvez. Mas o fato é que projetos de duplicação, como as BR-101 Nordeste (Trecho Rio Grande do Norte, Paraíba a Pernambuco), 060 (Brasília – Mato Grosso do Sul) e BR-101 Sul (Rio Grande do Sul a Santa Catarina) estão ajudando a desafogar o tráfego.
Em 2010, o DNIT começou um programa de duplicação de rodovias e de contornos rodoviários, principalmente nas regiões metropolitanas, com destaque para as obras em Minas Gerais e Rio Grande do Sul. A intervenção do DNIT nessas obras facilitará a locomoção de brasileiros nos próximos eventos esportivos: Copa do Mundo e Olimpíada.
Pagot tem informa que "os investimentos do governo federal em infraestrutura passaram de R$ 79 bilhões, em 2006, para R$ 170 bilhões, em 2010. Isso significa passar de 0,5% do PIB para 1,2% do PIB apenas em infraestrutura. O PAC representou a retomada do planejamento em infraestrutura e de obras paralisadas, a exemplo das eclusas de Tucuruí, inauguradas no dia 30 de novembro do ano passado".
As obras das eclusas foram iniciadas em 1981 e interrompidas várias vezes. Em 2007 foram retomadas pelo PAC, o que possibilitou sua conclusão, com um investimento de R$ 1,6 bilhão através de convênio do Dnit com a Eletronorte.

Portos
Se os principais modais da logística brasileira apresentam deficiências, o sistema portuário sofre duplamente. Além de não contar com vias de acesso – estradas e ferrovias – em quantidade e qualidade, os portos brasileiros ainda enfrentam sérios problemas de infraestrutura, que vão desde a insuficiência de terminais de embarque e desembarque até a limitação de calado, devido à falta de recursos para obras de drenagem, que depois passaram a ser garantidos pelo Programa Nacional de Dragagem.
O gargalo na área portuária tem sido o investimento desproporcional às necessidades dos portos. O PAC 1 previu em torno de R$ 2,6 bilhões, quando o necessário, segundo Confederação Nacional do Transporte (CNT), é de R$ 5 bilhões. Há no País mais de 16 portos para circulação de contêineres, dentre os quais de maior atividade são os de Santos, Rio de Janeiro e Porto Alegre. No Nordeste, o maior porto da região, Suape, em Pernambuco, prevê obras de ampliação a serem iniciadas no primeiro trimestre deste ano.
Foi divulgado em janeiro, que o porto de Suape deve licitar a construção de três terminais, um deles para receber cargas da Transnordestina, a ferrovia de 1.728 km que ligará o porto pernambucano a Pecém (CE) e ao município de Eliseu Martins (PI). Para os próximos quatro anos, os investimentos previstos – a maior parte deles com recursos do PAC 2 – chegam a R$ 2,6 bilhões. Neste primeiro semestre, recursos serão injetados na melhoria dos acessos rodoviários e em serviços de dragagem, o que ampliará o acesso de navios maiores a Suape.

Hidrovias
O potencial hidroviário (vias navegáveis em rios, lagos ou lagoas) para escoar as riquezas brasileiras é imenso. Dos mais de 40 mil quilômetros de vias navegáveis, apenas 9% é explorado. As hidrovias em uso no Brasil são: Tietê-Paraná, São Francisco, Paraná-Paraguai, Araguai-Tocantin e Madeira. Número irrisório para um país continental como o nosso.
As hidrovias podem resultar numa diminuição do custo de transporte de cargas, aumentando naturalmente o intercâmbio de produtos entre os países. Ou seja, a exportação também cresce.
Para os próximos três anos, o Dnit planeja uma ação intensiva no cuidado das hidrovias. "O período de 2011 a 2014 vai significar um marco para o Dnit. Vamos ter recursos no PAC 2 para estudos e projetos. Nos últimos anos, sempre falamos sobre a implantação de hidrovias, a construção de eclusas, o derrocamento e dragagem dos rios, mas os orçamentos anteriores foram aquém das necessidades. Com os projetos concluídos, poderemos iniciar a fase de obras", afirma Pagot.
Ele confirma também que na Amazônia Legal e em outros estados, estão construindo 47 terminais fluviais de pequeno porte. "Esses terminais significam oportunidades e dignidade aos habitantes de inúmeras sedes de município cujo acesso se dá exclusivamente pelos rios. Teremos um terminal de passageiros e o acesso franco às embarcações em qualquer época do ano através de uma plataforma flutuante e de uma ponte metálica e, também, um terminal de cargas – em alguns locais será possível, inclusive, armazenar pescado".

Energia
Em novembro de 2006, o Brasil descobriu uma reserva gigantesca de "ouro negro" chamado pré-sal. Atualmente investe na captação de petróleo nas áreas de rochas abaixo de uma camada de sal com cerca de 2 km de espessura e que se estende no oceano, do litoral do Espírito Santo até Santa Catarina.
Algumas usinas estão engatilhadas para estrear já neste mês, como termoelétricas localizadas no Rio Grande do Sul, Santo Antônio e Candiota III que receberam licença para operarem.
Josué Macedo, arquiteto e especialista em obras energéticas e seus impactos, analisou que construir usinas de grande porte, como as do Rio Madeira e Belo Monte, se torna uma missão "quase impossível" por conta das licenças ambientais. Segundo ele, este é o principal desafio na área de energia. "Muita coisa andou na geração de energia. Entretanto, ainda é preciso estudar mais os impactos ambientais, fiscalizar e revisar o código florestal do Brasil", afirma.
A oposição a projetos para geração de energia em quase todas as áreas se dá principalmente por questões ambientais. É necessário rever a regulamentação de sustentabilidade ambiental, acompanhar com mais rigidez o processo das obras, para que não haja desvio do projeto inicial e mão de obra capacitada.
A construção da usin

a Belo Monte, por exemplo, gera polêmica, mas o seu licenciamento prévio para montagem do canteiro e começo das obras dependerá de licença de instalação. "O Brasil tem clima e solo propícios para criar energia de qualidade e com eficiência. Só precisamos discutir um pouco mais o meio ambiente e as cidades afetadas.", diz Josué Macedo.
Em se tratando de energia nuclear, para uso pacífico, o especialista afirma que o Brasil estagnou. "Estamos parados em relação às pesquisas e encaminhamento da deste tipo de energia. O debate sobre os danos desta fonte de energia é grande, mas com um exame aprofundado o Brasil poderá desenvolver essa tecnologia, crescer ainda mais, tendo em vista que é um dos poucos países do mundo a dominar todo o processo de fabricação de combustível para usinas nucleares e possui depósitos minerais de urânio".
O PAC 2 prevê investimentos de R$ 1 trilhão em energia. Somente em geração de energia elétrica estão previstos R$ 136,6 bilhões. No entanto, a área que mais abocanhará investimento é petróleo e gás natural: R$ 879,2 bilhões.
Está prevista, também, a construção de dez hidrelétricas, modelo plataforma e 44 usinas hidrelétricas convencionais. Algumas deles estão na Bacia do Tapajós, como São Luiz do Tapajós, Cachoeira do Cai, Jatobá e Chacorão. A construção de hidrelétricas no Sudeste, como Pompeu e Formoso, ambas em Minas Gerais. A energia eólica será contemplada com 71 centrais localizadas principalmente no Nordeste e no Sul do Brasil.
Para 2011, a Eletronuclear renegociou os principais contratos da usina Angra 3 e, dentre eles, falta o de montagem, que será licitado no ano que vem. Esse contrato é de R$ 1,5 bilhão. A usina, que faz parte das obras do PAC, terá potência instalada de 1.405 megawatts (MW), e será conectada ao Sistema Interligado Nacional por meio da linha de transmissão que já atende às usinas Angra 1 e 2, informou o BNDES.
O então presidente da Eletrobrás, João Antônio Muniz Lopes, disse que os desafios no setor energético são realmente muitos. "O Brasil tem muito a crescer e a base está sólida. Se continuarmos nesse caminho e cumprimos as metas, não correremos risco de racionamento daqui há 10 ou 20 anos".

Fonte: Estadão