A ferrovia Transnordestina não deverá ficar pronta em 2010, como previsto inicialmente no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Segundo o consultor em logística e conselheiro do Grupo de Estudos da Logística em Pernambuco (Gelpe), Marcílio Cunha, o projeto deverá atrasar mais de um ano, por causa da lentidão nos processos de licitação para serviços e fornecimentos, e devido ao período de chuvas, que estão atrasando as obras. Há dificuldades ainda relacionadas ao licenciamento ambiental, segundo informações do governo federal. As desapropriações de terra, que também vinham atrasando as obras, foram aceleradas nos últimos meses. Os governos do Ceará, Piauí e Pernambuco fizeram um mutirão para articular o processo, cedendo funcionários dos seus próprios estados. Pernambuco, por exemplo, acionou sua Procuradoria para acelerar as desapropriações a serem feitas pelo Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes (DNIT).
Pelo escopo do projeto, a ferrovia vai ligar o porto fluvial de Petrolina (PE) a Missão Velha (CE), onde se interligará a malha da CFN. Um segundo trecho projetado ligará o município cearense de Araripe e o Porto de Suape (PE). Essa via já foi apelidada de “ramal do gesso”, pois servirá para transportar esse produto para exportação.
Os trabalhos de construção da Transnordestina foram iniciados há dois anos, em junho de 2006. De todo o trecho de 110 km, a ser construído, conforme previsto nessa primeira etapa, somente metade, ou seja, 52 km, foram efetivamente iniciados. Do custo total do empreendimento, avaliado em R$ 4,5 bilhões, apenas o equivalente a R$ 245 milhões está sendo aplicado.
Duas frentes de serviços estão em execução, a cargo da EIT – Empresa Industrial Técnica S/A. Do lado cearense, as obras se concentram em um trecho de 22 km de extensão, separados pela Rodovia CE-293, conhecida como estrada “Unha de Gato”, que liga Missão Velha a Brejo Santo. Ali, na localidade chamada de “Café da Linha”, será aberto um túnel que passará por baixo da rodovia. A outra frente de obras, numa extensão de 30 km, partiu de Salgueiro para o Ceará. As frentes de serviço já estão nas proximidades da cidade cearense de Jati.
No final de 2006, foi concluído, pelo Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes (DNIT) e pelo governo de Pernambuco o projeto executivo do trecho Salgueiro-Trindade, orçado em R$ 515 milhões. As obras deveriam ser concluídas em um ano e meio. Mas até o momento não foram iniciadas.
Já no início de 2007 foram escolhidas as empresas responsáveis pela elaboração dos projetos executivos de três outros trechos da ferrovia: a Enefer, para o trecho Suape e Salgueiro; e a Concremat, que assumiu outros dois trechos – entre Eliseu Martins e Trindade, e entre Missão Velha e Pecém.
Para elaboração dos projetos, a CFN comprometeu-se a bancar R$ 30 milhões. A concessionária até iniciou as obras com recursos próprios, enquanto aguardava a liberação do dinheiro previsto pelo Governo Federal. Apesar das evidências de atraso na execução do projeto, o Governo Federal ao apresentar no início de junho um balanço do PAC, afirmou que o andamento da Transnordestina está “adequado”.
Prejuízos financeiros e políticos
“Os primeiros 110 km iniciados já deveriam estar concluídos”, afirma Marcílio Cunha. Para ele, não há como dimensionar o quanto o Nordeste terá prejuízo por causa do atraso. “A Transnordestina é de fundamental importância, é um projeto da época do Império. Estamos há muito tempo na expectativa de ter a ferrovia implementada, para baratear os custos de produção”, afirma.
De acordo com o consultor, não se pode falar em logística sem ter a maioria dos modais em pleno funcionamento. Hoje, no Nordeste, toda a estrutura de movimentação está baseada no transporte rodoviário. Além de facilitar a exportação, ele avalia que a nova ferrovia vai melhorar o fluxo de fertilizantes e combustíveis para o interior do País.
“Temos portos importantes em termos logísticos, que dependem tanto da rodovia quanto da ferrovia. E a ferrovia, em termos de custos operacionais, chega a custar apenas 50% do valor do frete rodoviário. Isso representa um diferencial bastante elevado, principalmente para transporte de commodities”.
Para o professor do Departamento de Engenharia Civil da Universidade Federal de Pernambuco, Maurício Pina, o principal entrave da Transnordestina é a sua composição financeira, composta por recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), do Fundo de Desenvolvimento do Nordeste e de recursos privados, oriundos da Companhia Ferroviária do Nordeste (CFN), concessionária da Malha Nordeste da antiga Rede Ferroviária Federal.
Segundo Pina, a obra terá forte impacto no desenvolvimento da Região Nordeste e deverá diminuir os custos de produção no Brasil. “Principalmente pela oportunidade de quebrar o ciclo vicioso: não tem infra-estrutura porque não tinha carga, aí não tinha carga porque não tinha infra-estrutura. Como a ferrovia vai ter condições de transportar até 30 milhões t, estima-se que ela vai possibilitar o escoamento da produção da região: soja, milho, biodiesel, frutas, álcool e também produção de minérios”, afirma.
Frota nova
Além das obras, os R$ 4,5 bilhões previstos em investimentos serão aplicados na compra de novos vagões e locomotivas e na recuperação de trechos da ferrovia existente – serviço que também está atrasado. Em abril deste ano estava sendo elaborado o projeto executivo da nova linha (sem financiamento aprovado) entre Nova Russas e Quixeramobim, no Ceará. O objetivo do governo do Estado é que esse percurso passe pela cidade de Santa Quitéria, para viabilizar a mina de Itataia.
Fonte: Estadão