Pedro da Luz Moreira
Vamos abordar inicialmente os problemas de mobilidade da cidade, que de uma maneira geral vêm sendo pensados privilegiando a utilização de carros particulares e não sistemas de alta capacidade, como trens e metrô.
Os BRTs, por exemplo, são uma boa iniciativa que deve melhorar a qualidade de vida de parcelas expressivas da população, principalmente no que se refere à mobilidade. Isto é, tempo de viagem e tarifa adequados. Principalmente a Transolímpica e a Transcarioca, que interceptarão sistemas de alta capacidade como os trens urbanos e o metrô, pois o transporte público deve ser pensado como uma rede interligada e não como linha.
Já não considero o metrô uma obra importante, pois ele não atenderá a um percentual expressivo da população e subverte alguns dos planejamentos iniciais do sistema. A obra do metrô para a Barra da Tijuca está pensada sobre uma ótica, não da rede interligada, mas de uma linha, pois não se articula com outros modais.
No meu entendimento, uma obra de maior impacto no campo da mobilidade urbana seria a reforma dos trens urbanos da cidade, fazendo-os funcionar com a eficiência de intervalos entre composições eficientes e com estações adequadas ao conforto dos passageiros. Esta obra possui um custo menor de implantação e beneficiaria uma população muito maior da região metropolitana, quando comparada com o metrô da Barra da Tijuca.
As intervenções previstas no PDTU 2002
Por outro lado, ainda no campo da mobilidade urbana, poderíamos estar realizando intervenções que estão previstas no Plano Diretor de Transporte Urbano da Região Metropolitana do Rio de Janeiro (PDTU/RMRJ) de 2002, que melhorariam a qualidade dos deslocamentos na cidade. Um bom exemplo seria a ampliação do sistema de barcas na baía de Guanabara, que possui um custo de implantação relativamente baixo, pois não há necessidade de construção do leito, apenas de estações de embarque e desembarque.
O citado PDTU de 2002 previa a ligação da Praça XV com Duque de Caxias e com São Gonçalo, atuando de forma a desestimular o uso de carros em vias sobrecarregadas como a ponte Rio-Niterói e a Linha Vermelha. Estas duas linhas, se articuladas com grandes áreas de estacionamento, tanto em Duque de Caxias quanto em São Gonçalo, poderiam representar um forte descarregamento destas vias que hoje estão próximas da saturação. Há ainda uma terceira linha, também prevista no mesmo PDTU, que ligaria a enseada de Botafogo à Praça XV e ao Aeroporto Internacional Tom Jobim, com previsão de instalação de guichês de companhias aéreas na estação Botafogo, facilitando o check-in de turistas. Uma ligação desta natureza poderia representar uma importante valorização da baía de Guanabara, ampliando sua visibilidade para turistas e estrangeiros.
Localização do Parque Olímpico
Quanto ao Parque Olímpico, localizado na Barra da Tijuca, acredito que se constitui num incentivo para a indústria imobiliária da cidade, num bairro onde este estímulo não era necessário. Portanto, sua localização é inadequada, pois reforça um vetor já presente neste setor, não revertendo tendências instaladas. No meu entendimento, o Parque Olímpico não deveria se instalar em áreas de expansão da mancha urbana, como é o caso da Barra da Tijuca, mas em áreas já infraestruturadas e que foram abandonadas ou não são atrativas para o mercado imobiliário, como o porto ou São Cristóvão.
Quanto às obras de infraestrutura, notadamente no campo das águas pluviais, como os piscinões de acúmulo de águas de chuva, como o da Praça da Bandeira e o tratamento da beira dos rios na área da Baixada Fluminense, são urgentes e já deveriam estar prontas.
A previsão inicial era urbanizar todas as favelas cariocas até 2020, o que certamente representaria um ganho fundamental na qualidade de vida das pessoas em extratos sociais variados. Além de que atua sobre a mitigação de riscos, como contenção de encostas e tratamento de beiras de rio de forma pulverizada e na ponta do problema.
A articulação de qualquer programa de urbanização de favelas, como o Morar Carioca, com os problemas de infraestrutura, tanto de saneamento, como de águas pluviais, é notável e reconhecido internacionalmente. A retomada do ritmo do programa é fundamental para que a cidade não conviva, a cada chuva, com o risco de novas tragédias.
Por outro lado, a articulação deste programa de urbanização de favelas com o Minha Casa, Minha Vida, do governo federal, pode representar uma mudança importante de paradigma na produção de habitação de interesse social, uma vez que ele atua sobre áreas consolidadas e infraestruturadas.
Com relação ao Porto Maravilha, que está articulado com os grandes eventos da Copa e da Olimpíada, vê-se que ele reverte uma tendência instalada de deterioração de uma área adjacente ao centro da cidade. Acredito ser fundamental que esta área seja reincorporada ao conjunto da cidade sob uma ótica inclusiva, onde possa existir uma convivência civilizadora entre diferentes extratos sociais. No entanto, não é isto que o poder público sinaliza com suas ações, que apontam para busca de uma sobrevalorização da terra urbana, que sempre determinou a expulsão da população mais fragilizada economicamente.
Participação externa nos projetos e obras
A questão da participação de arquitetos, consultores e também empreendedores e construtores externos em princípio deve ser vista de forma positiva, desde que estejam engajados em associações e parcerias niveladas com agentes brasileiros, e partam do princípio de que suas atividades não deveriam se restringir a um curto espaço de tempo.
O grande problema do mundo contemporâneo é uma certa volatilidade dos empreendimentos, que por isto tendem a se tornar altamente especulativos e danosos. Há no mundo contemporâneo uma hegemonia da lógica financeira, frente a uma produtiva. A lógica desta participação externa não deveria ser dominada pela questão financeira, mas sim pela implantação de uma produtividade instalada localmente. O monitoramento destas tendências e forças, entre a produtividade e a “financeirização”, deve ser constante e deve ter como objetivo a transferência efetiva de know-how nestas atividades.
Fonte: Padrão
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