Otrecho Norte do Rodoanel Mário Covas (SP-21) é mais uma das grandes obras que recorrem à construção de túneis como forma de minimizar o impacto sobre áreas de relevância ambiental. Seu traçado, que totaliza 44 km (mais 3 km de conexão com o aeroporto de Guarulhos, SP), tangencia e atravessa, em certa medida, a Serra da Cantareira e seu parque estadual, área de proteção ambiental que é patrimônio de São Paulo, localizada na Zona Norte.

Como se sabe, atravessar montanhas, em vez de subi-las ou contorná-las, diminui a área de remoção de vegetação e o impacto sobre o ecossistema como um todo, incluindo a fauna, e facilita a obtenção das licenças formais para instalação do empreendimento, cada vez mais rígidas no quesito meio ambiente.

O projeto básico licitado do Rodoanel Norte prevê a construção de sete túneis, que somam mais de 6 km de extensão (13 km no total, considerando-se os dois sentidos da rodovia). É onde a capacidade dos engenheiros e técnicos na escavação de túneis será testada como nunca, na história do Rodoanel. Basta lembrar que, no trecho Oeste, foram três túneis construídos (470 m, 650 m e 1,73 km); no trecho Sul, não há nenhum; e, no trecho Leste, haverá apenas um, com 1,08 km.
O lote 3 (com 3,62 km) do Rodoanel Norte, que está nas mãos da construtora OAS, é o que reúne o maior número de túneis (dois, o mesmo número do lote 2) e o mais extenso (com 1,72 km; o outro túnel se prolonga por 1,12 km). Isso, exatamente para mitigar a travessia da Serra da Cantareira, fragmento da Mata Atlântica nativa, onde, em tempos antigos, tropeiros faziam sua parada para abastecer os cântaros (jarros para armazenar água) nos numerosos nascentes e córregos que medram na região, e daí veio seu nome.

Portanto, uma atenção redobrada com a qualidade de execução dos túneis do trecho Norte precisa se fazer presente. “Espera-se o uso dos equipamentos e técnicas dos mais modernos”, pede o presidente do Comitê Brasileiro de Túneis (CBT), engenheiro Hugo Cássio da Rocha.

À esq., detalhe do túnel TI-2 do trecho Oeste, com o acabamento de concreto projetado. À dir., vazamento no interior desse túnel

A declaração de Hugo, óbvia em sua aparência, deve ser entendida como um alerta. Como ele mesmo exemplifica, os três túneis do trecho Oeste, primeira parte do Rodoanel, obra entregue em 2002, ficaram com aquele aspecto fuliginoso e rústico para economizar custos. Embora o aspecto estético desfavorável, diga-se, não signifique necessariamente um túnel malfeito, que apresente riscos à segurança do motorista, como observa (e garante) Pedro da Silva, diretor de engenharia da Desenvolvimento Rodoviário S/A (Dersa). Engenheiro civil por formação, Pedro está na Dersa desde 1997 e participa das obras do Rodoanel desde que o primeiro operário pisou num canteiro do empreendimento, lá em 1998.

Segundo ele, devido a uma questão financeira, uma vez que o orçamento do trecho Oeste já havia estourado (nas contas do próprio engenheiro, os aditivos ao contrato original chegaram a 80% do valor inicial), optou-se por não revestir os túneis com concreto moldado, que dá o aspecto estético de obra bem-acabada, substituindo-o por concreto projetado com fibra de aço. “Mas, antes desse revestimento, tem todo um tratamento de drenagem, senão, aquilo mina água. Vê se pinga água em algum túnel do Rodoanel. Não pinga.”

Emboque do segundo túnel do trecho Oeste do Rodoanel. Revestido com concreto projetado

Conforme a reportagem de O Empreiteiro verificou em visita aos túneis no dia 11 de fevereiro, está minando água no km 11 da pista interna do túnel TI-2, com gotejamento contínuo na pista de rolamento. Há também pontos de umidade ao longo da pista externa do mesmo túnel, que não interferem no tráfego. Portanto, passados quase 11 anos do início das operações, faz-se necessária a manutenção dos equipamentos, que estão sob a gestão da concessionária CCR RodoAnel. Nos outros dois túneis do trecho Oeste, não se observaram nem vazamentos nem pontos úmidos.

No trecho Norte, a fase de drenagem dos túneis é ainda mais decisiva e precisa ser executada à perfeição, uma vez que atravessam área de serra, logo, uma região muito úmida e chuvosa. “Se esses túneis não forem devidamente tratados, pode chover o dia inteiro dentro deles”, avisa o presidente do CBT.

Segundo Hugo Cássio da Rocha, o tratamento pode incluir, dependendo da classe da rocha e do solo, trabalhos de estabilização primária. Com pré-injeção de microcimento por furos radiais nas rochas ou execução de tirantes de 4 m a 6 m nos blocos de rochas instáveis, além da drenagem.

Desmonte com explosivos

O método para a escavação dos túneis do trecho Norte será o convencional, denominado NATM (New Austrian Tunneling Method), com uso de explosivos. Segundo Hugo, é o método mais adequado à obra, dadas as suas condições geológicas e de tamanho. Com ele, é possível realizar, em tese, até três detonações por dia, com avanço médio de 2 m em cada uma.

No quesito detonação, o presidente do CBT cita a importância da precisão na hora de realizar o plano de fogo. “Quanto mais paralelos e mais precisos forem os furos, mais preciso será o desmonte.” Para tanto, empregam-se jumbos de perfuração computadorizados (com até quatro braços, com perfuratrizes), que executam o plano de fogo pré-traçado praticamente sem intervenção do operador do equipamento. (GA)

Fonte: Padrão