Proposta de geólogo associado ao Comitê Brasileiro de Túneis (CBT) está na mesa e pode ser colocada em prática. O que Luiz Ferreira Vaz propõe é a construção de um túnel de 37,5 km ligando o Tietê, na região do Ceagesp, a outro trecho no rio, na região de Araçariguama

Nildo Carlos Oliveira

Aideia central é a seguinte: a urgência para a solução do problema das enchentes na cidade de São Paulo impõe a construção de estruturas subterrâneas. Na superfície, eventuais obras de engenharia enfrentariam uma série de dificuldades, a maior delas, a própria ocupação anárquica do solo urbano. Elas afetariam o sistema viário disponível, com consequências desastrosas para o funcionamento de todas as atividades metropolitanas.

Hugo Cássio Rocha, presidente do CBT, acha que as soluções devem ser associadas

A simples operação de limpeza de bocas de lobo e o desassoreamento de córregos e rios já se provaram insuficientes para ao menos reduzir o impacto do problema. A cidade é muito grande. Cresceu mais do que a sua dimensão geográfica, 1.530 km², poderia permitir. E tem sido sobre essa superfície que tem aumentado a infraestrutura de oferta de serviços para atendimento das necessidades de uma população da ordem de 11 milhões de pessoas. Contudo, essa oferta de serviços continua muito aquém das urgências da população.

A cidade submersa: o jeito seria construir estruturas subterrâneas, interligando os rios e córregos, para apressar o escoamento das águas

Obviamente a solução das enchentes na metrópole não requer apenas providências pontuais. Ela pressupõe medidas múltiplas, dentro de um planejamento integrado que some ações simultâneas em todos os bairros, em todas as regiões. E isso, historicamente, tem sido um sonho impossível.

Diante dessa realidade, o geólogo Luiz Ferreira Vaz, associado e apoiado pelo CBT, vem defendendo uma medida mais ousada, capaz de ser adotada também em cidades como o Rio de Janeiro, Petrópolis e Niterói (RJ), Uberaba (MG) e Vale do Itajaí (SC) e por aí em diante. No caso de São Paulo, algumas das medidas que ele preconiza seriam a construção de um túnel ligando trechos do Tietê; de túneis subterrâneos interligando os piscinões já construídos e aqueles que venham a ser construídos, e outras obras estruturantes.

O túnel e 37,5 km

O geólogo Luiz Vaz, embora reconhecendo que a solução requer planejamento unificado e de médio e longo prazo, que considere o diagnóstico amplo das condições metropolitanas, de seus rios e córregos, muitos deles já canalizados e até imperceptíveis no tecido urbano, acha que uma solução eficiente seria a construção de um túnel de 37,5 km de extensão, ligando dois trechos do rio Tietê. Ele ligaria o rio, na região do Ceagesp, ao trecho da região de Araçariguama.

Em linhas gerais, o túnel teria uma declividade da ordem de 100 m ao longo daquele percurso, no sentido Araçariguama. Não seria diferente de outros túneis hidráulicos. Ele permitirá que o rio, a partir da região do Ceagesp, chegue a Araçariguama com baixa velocidade. É que, fluindo por gravidade, parte de sua energia se diluirá ao longo do percurso.

“O túnel”, especifica o geólogo, “terá 8 m de diâmetro e poderá ser aberto com máquinas ou explosivos. Será construído a cerca de 100 m de profundidade e funcionará como um by pass. A capacidade de vazão, na altura da região do conjunto viário conhecido como Cebolão, poderá ser da ordem de 1.057 m³/s. Isto porque a obra estará acrescentando mais 350 m³/s à capacidade de vazão ali existente.

Pelos estudos que o geólogo está fazendo, o melhor sítio para a execução do emboque do túnel será na foz do rio Tietê.

Na região da Pompeia

A ideia da construção de estruturas subterrâneas parece que vem sendo assimilada pela administração municipal. É que a realidade, enfim, se impõe. E a prefeitura inclina-se à necessidade de construir pelo menos 7 km de túneis no subsolo para procurar reduzir o problema das enchentes na região da Pompeia. Elas farão parte de um conjunto de obras, incluindo cinco piscinões, também subterrâneos.

As obras no subsolo deverão tangenciar o estádio do Palmeiras e o Shopping Bourbon, onde a ocorrência de enchentes é frequente, e prosseguir sob a avenida Nicolas Boer, até desaguar no rio Tietê. O trecho inicial terá 3,7 km e seguirá da esquina da rua Apiacás com a avenida Sumaré, até a ponte Julio de Mesquita. A segunda galeria terá 3,3 km e começará na rua Professor Rocca Dorsal, desaguando naquele mesmo local.

Os piscinões subterrâneos estarão interligados por galerias. No fundo, são obras que deveriam ter sido construídas acompanhando o crescimento da cidade, mas que ficaram para trás agora terão de ser feitas com atraso de décadas. E sem prejuízo para o funcionamento regular da cidade. As obras na região da Pompeia, que estarão sob a responsabilidade da Secretaria de Infraestrutura Urbana e Obras (Siurb), estão orçadas em R$ 143 milhões.

A manifestação do CBT

O engenheiro Hugo Cássio Rocha, presidente do Comitê Brasileiro de Túneis, considera, a exemplo de outros profissionais que trabalham nessa área, que as soluções para o problema das enchentes devem ser associadas. Não existe, segundo ele, solução única. Todas se entrelaçam.

Sobretudo em cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e outras, que já não dispõem de áreas livres a céu aberto para amplas obras de drenagem e construção de galerias a céu aberto para, depois, serem enterradas, a solução passa, necessariamente, pela execução de estruturas subterrâneas. Além do que, os piscinões, que hoje são construídos em São Paulo, ocupam áreas já valorizadas. Daqui a algum tempo, não haverá mais espaço na superfície para a disseminação dessas obras. A saída, portanto, serão túneis e piscinões subterrâneos.

Os exemplos em outros pa
íses

Hugo Cássio Rocha informa que os países, nos quais as soluções subterrâneas foram aplicadas, apresentam resultados positivos no esforço para reduzir os prejuízos com a ocorrência de enchentes.

Na cidade de Hong Kong, China, por exemplo, foram construídos mais de 12 km de túneis, quase 8 km de galerias e 35 poços para controle de inundações. Em Tóquio, Japão, foram escavados 64 km de túneis. O principal deles tem mais de 10 m de diâmetro e vazão de 200 m³/s. Além disso, cinco poços com 32 m de diâmetro completam o conjunto dessas obras.

Em Kuala Lumpur, Malásia, foi construído o Stormwater Management and Road Tunnel (Túnel Smart). Ali, a via serve para o transporte convencional na época da seca e o túnel é utilizado para permitir o controle de enchentes. Em caso de chuvas torrenciais e ininterruptas, o túnel é fechado ao tráfego e fica completamente inundado.

Em Bancoc, Tailândia, está em curso um projeto que prevê a construção de um túnel igualmente com dupla função: permite o tráfego e a drenagem de água das enchentes. Adicionalmente, ele utiliza a água pluvial ali recolhida para gerar energia. É a engenharia recorrendo sabiamente a todos os meios disponíveis da tecnologia e da natureza, para agregar soluções em favor da condição humana nas metrópoles.

Fonte: Revista O Empreiteiro