Falhas de gestão impedem o País de aplicar recursos disponíveis para melhorar o saneamento básicoe o atraso da maior partedas obras se prolonga
Nara Faria
Dos recursos básicos necessários para a melhoria da qualidade de vida, o saneamento vem sendo há séculos o que menos avançou nas propostas do poder público. Ainda em 2013, apenas 46% dos brasileiros possuem acesso à rede de coleta de esgoto e somente 38% do esgoto é tratado, de acordo com dados anuais revelados pelo Instituto Trata Brasil.
Após décadas de pouco investimento, o governo federal decidiu recolocar o saneamento básico dentro da agenda política nacional em 2007, quando foi estabelecido o principal marco regulatório do setor: a publicação da lei nº 11.445. Com ela, o Ministério das Cidades instituiu o Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab), que estabelece metas para o setor ao longo dos próximos anos. O objetivo é ter, até 2030, abastecimento de água potável em 98% do território nacional, 88% dos esgotos tratados e 100% dos resíduos sólidos coletados.
Para chegar a estes objetivos, foram estimados investimentos de R$ 420 bilhões pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), sendo 60% do governo federal e 40% de estados, municípios e iniciativa privada. Contudo, o ritmo das obras não andou como previsto. Na primeira edição do programa, entre 2007 e 2010, foram previstos o total de R$ 40 bilhões e somente R$ 4,25 bilhões foram efetivamente utilizados nas obras. A segunda etapa do programa (PAC 2) foi lançada em 2010, e o Ministério das Cidades recebeu mais R$ 41,1 bilhões para aplicar em ações de saneamento de 2011 a 2014.
Já no mês de junho de 2013, foi aprovado pelo Ministério das Cidades o investimento de R$ 508,5 bilhões para abastecimento de água potável, coleta e tratamento de esgoto e lixo e ações de drenagem nos próximos anos, a partir de 2014. A previsão é investir de R$ 10 bilhões a R$ 12 bilhões por ano, até 2030.
“O problema é que o setor não tem conseguido gastar o recurso que tem hoje. IInvestimos R$ 8 bilhões ou R$ bilhões por ano, contra R$ 18 bilhões que seriam necessários. Não é uma questão de recursos, é uma questão de gestão e planejamento”, afirma o presidente executivo do Instituto Trata Brasil, Édison Carlos.
Segundo ele, no momento em que foi anunciado o programa muitos projetos foram apresentados simplesmente para garantir os recursos do PAC, mas ficaram desatualizados. “As cidades mudaram e consequentemente as primeiras medições feitas pela Caixa Econômica Federal, que é o principal agente financiador, tiveram que ser refeitas. Esse processo de revisão acarretou mais três anos de lentidão”, explica.
Atualmente, a maior parte dos projetos venceu as etapas de revisões, mas ainda esbarra no período de aprovação da licença ambiental para sair do papel. Dos projetos em andamento, 23 estão com até 90% das obras concluídas, mas aguardam pela remoção de famílias residentes nas áreas para a conclusão definitiva. A previsão é de que sejam necessários mais dois anos, em média, para que essas obras sejam definitivamente entregues.
“A preocupação é que uma obra não pode demorar sete ou oito anos para ser concluída em um País em que há uma falta de saneamento brutal”, destaca Carlos.
65% das obras paradas
De acordo com a edição mais recente do estudo anual divulgado pelo Instituto Trata Brasil, que acompanha as obras do PAC de redes coletoras e estações de tratamento de esgotos nos municípios com mais de 500 mil habitantes, após quase seis anos da assinatura dos primeiros contratos do PAC para esgotos, 90 das 138 obras não cumprem o cronograma.
No geral, em 2012, apesar dos recursos liberados terem atingido pouco mais de 50% dos valores previstos, totalizando cerca de R$ 6,1 bilhões, e da duplicação do número de obras concluídas em 2011 e 2012, de 7% para 14%, 65% das 138 obras de esgotamento sanitário distribuídas em 18 estados e em 28 das maiores cidades brasileiras, monitoradas pelo Trata Brasil no período, estavam paralisadas, atrasadas ou ainda não iniciadas.
“Dessas, 112 são as mais antigas e as mais preocupantes. Elas fazem parte do Programa de Aceleração do Crescimento assinado em 2007 e se misturam às outras 26 obras assinadas pelo PAC 2, que foram aprovadas no ano de 2011”, conta o presidente da Trata Brasil.
Das 112 obras do PAC 1, 19 estavam concluídas em dezembro de 2012. Houve significativa queda no número de obras em situação normal, de 34% para 20%, aumentou a quantidade de obras paralisadas, de 29% para 40%, enquanto 21% estavam atrasadas. Das 26 obras do PAC 2, 16 delas, que correspondem a 62%, ainda não haviam sido iniciadas. Havia uma obra concluída e seis obras com andamento normal, o que corresponde a 23%.
O estudo mostra que mesmo a região Sudeste, que tradicionalmente “puxava para cima” o índice de evolução das obras, arrefeceu o ritmo e muitas de suas obras estão paralisadas. Apesar de as obras concluídas nesta região saltarem de 14% para 24% no período, o número de obras paralisadas aumentou de 16% para 31%.
O Sul e Nordeste também sofreram aumento de obras paralisadas, passando de 5% para 35% e de 27% para 41%, respectivamente. Neste mesmo período, 15% das obras no Sul estavam concluídas e no Nordeste, 10%.
No Centro-Oeste houve significativa queda no índice de obras paralisadas, de 46% para 8%, mas muitas mudaram para a categoria de “atrasadas”, com esse número elevando de 0% para 46%. Não há obras concluídas na região. A pior situação, proporcionalmente, permanece na região Norte, onde as três obras continuam paralisadas ou atrasadas.
Fonte: Revista O Empreiteiro
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