Belo Monte, usina de R$ 26 bilhões, com potência instalada de 11.233 MW, deverá produzir apenas 4.500 MW, em média, por ano, por causa de restrições ambientais. Contudo, um reservatório de acumulação a montante, no rio Iriri, lhe permitiria manter o patamar de fornecimento de energia, nas estiagens, em benefício dos consumidores
Nildo Carlos Oliveira e Augusto Diniz – Altamira (PA)
A concessionária Norte Energia, que conduziu este ano, à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), um pedido de adiamento das obras, argumentando que elas atrasaram por causa de uma conjunção de fatores, dentre eles a perda da janela hidrológica no período de estiagem de 2011 e 2012, no rio Xingu, possivelmente esteja estudando diversas possibilidades para que Belo Monte possa gerar o volume de energia projetado. Ninguém duvida que a engenharia possa realizar esse exercício de criatividade, analisando em profundidade as diversas interfaces sociais e ambientais que o tema sugere.nquanto prosseguem os trabalhos para a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, no município de Vitória do Xingu, no Pará, constata-se que ainda não se esgotou a polêmica que considera a necessidade da execução de reservatórios de acumulação, compatíveis com a dimensão de obras daquele tipo. A controvérsia foi deflagrada a partir de uma carta que entidades da engenharia encaminharam no ano passado à Presidência da República, sugerindo que projetos hidrelétricos devem agregar reservatórios de usos múltiplos. A carta ainda não teve resposta, mas aguarda-se que, já no começo de sua segunda administração, a presidente Dilma Rousseff possa examinar o assunto.
O consórcio construtor, liderado pela Andrade Gutierrez e integrado pela Camargo Corrêa, Norberto Odebrecht, OAS, Queiroz Galvão, Contern, Galvão Engenharia, Serveng-Civilsan, Cetenco e JMalucelli, conta que enfrentou 444 dias de atraso nas obras.
Houve ali bloqueios nos canteiros, promovidos por ONGs e grupos indígenas de etnias diversas e a própria burocracia do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), colaborou com os atrasos, demorando em fornecer a licença para início da obra. Entre outras idas e vindas, houve a necessidade de novos estudos que levaram a alterações na fase do pré-projeto, mudanças nas especificações, ocorrência de demandas judiciais e outros óbices.
Atualmente, porém, a maior parte daqueles problemas está resolvida e o consenso é de que a irreversibilidade de Belo Monte deverá ajudar – e até apressar – outros projetos de empreendimentos hidrelétricos na Amazônia, em especial aqueles do Complexo Tapajós, sendo o primeiro na região de Itaiatuba (PA), a quase 500 km da usina de Belo Monte, percorrendo a Rodovia Transamazônica.
Contudo, a indagação que não quer calar continua a ser: como evitar que empreendimento de custo tão elevado produza energia em patamares absolutamente inferiores àqueles originalmente previstos?
A responsabilidade da engenharia
Ao longo do tempo a engenharia tem resolvido problemas, alguns da maior complexidade técnica, para executar e implementar projetos nas suas mais diferentes modalidades, em especial na implantação de usinas hidrelétricas. Depois da UHE de Balbina, perto de Manaus (AM), no rio Uatumã, houve um processo de amadurecimento em relação à consciência ambiental, a fim de que desastres ecológicos semelhantes àquele não venham a se repetir jamais no País. E, em vários casos, houve aprimoramentos de métodos executivos, com a racionalização de canteiros e melhor especificação de máquinas e equipamentos.
No caso de Belo Monte, uma das soluções aventadas é a construção de uma barragem de acumulação a montante, no rio Iriri, que nasce na Serra do Cachimbo e deságua na margem esquerda do rio Xingu, a cerca de 100 km de Altamira, principal polo econômico da região e cidade mais afetada pelo reservatório da hidrelétrica. Tal solução ensejaria maior segurança à navegabilidade nesse rio na época das estiagens e permitiria a manutenção da geração de energia da usina, nos níveis previstos com o redimensionamento do projeto executivo. Ressalta-se, porém, que a bacia do rio Iriri é também permeada por terras indígenas.
Os dados da carta para reflexão
A carta que se encontra na Presidência da República, encaminhada com o aval da Academia Nacional de Engenharia (ANE), Associação Brasileira de Geologia de Engenharia e Ambiental (ABGE), Associação Brasileira de Mecânica dos Solos e Engenharia Geotécnica (ABMS), Clube de Engenharia, Comitê Brasileiro de Barragens (CBDB), Instituto Brasileiro do Concreto (Ibracon) e Instituto de Engenharia de São Paulo (IE), cita o exemplo das usinas hidrelétricas com reservatórios, construídas no século passado e que, em funcionamento até hoje, continuam a ter papel fundamental “na segurança e na estabilidade do sistema elétrico nacional”.
Ela ressalta que o potencial hidrelétrico do País corresponde apenas a 1/3 de um total estimado em 246 GW. Os 2/3 restantes se encontram, em sua maior parte, “localizados na região amazônica, onde se encontra também a parcela preponderante das áreas mais protegidas do Brasil”.
O documento considera que, ao lado das exigências ambientais legais, a construção de hidrelétricas enfrenta sistemática oposição por parte de grupos organizados nacionais e estrangeiros. Estes alegam, “com base em argumentos discutíveis”, que tais empreendimentos hidrelétricos causam impactos socioambientais que se contrapõem aos benefícios que “podem propiciar”.
Reconhece, porém, que o elevado índice de nacionalização alcançado pela cadeia produtiva de insumos empregados no setor elétrico, associada à experiência brasileira acumulada em projetos, construção, operação e manutenção de tais empreendimentos, poderá assegurar-lhes “uma implantação realizada de modo social e ambientalmente correta”.
Fonte: Revista O Empreiteiro
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