O que se previa está acontecendo. E seria ingênuo imaginar que o governo agiria de outra forma, quando já existem precedentes a demonstrar a falácia das promessas quanto à destinação dos recursos captados com impostos, taxas e contribuições. O exemplo do que ocorreu com a CPMF, destinada originalmente ao setor de saúde, não pode cair na vala comum do esquecimento.
Com o pomposo nome de Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), esse tributo, de alíquota variável conforme as flutuações do preço dos combustíveis, cobrado desde 2002, deveria ser aplicado em obras de infraestrutura de transportes, a fim de evitar o colapso das rodovias brasileiras. Mas acaba recolhido e utilizado para outros fins; menos para aquele originalmente defendido e anunciado. Está aí a Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados a revelar que, do total continuamente arrecadado pela Cide-Combustível, muito pouco tem sido aplicado em obras rodoviárias. Até abril último, apenas 0,45% haviam sido canalizados para investimentos canalizados destinados a rodovias federais. A maior parte do bolo é usada para pagar pessoal e assegurar o cumprimento das metas do famigerado superávit primário.
Mas, poderia ser diferente, em um país onde as promessas de hoje traem os compromissos de ontem e projetam as evasivas de amanhã? O desvirtuamento vem de longe. Veja-se o caso daquelas taxas de guias e sarjetas, tantas vezes cobradas por esses municípios afora, até de moradores em ruas onde não há guias e, muito menos, sarjetas; ou a taxa de lixo, cuja cobrança já foi denunciada em bairros por onde os garis passam ao largo, uma vez que não há condições de acesso para que o recolhimento seja feito.
E há a cobrança das taxas de energia elétrica que antes, quando se tratava de imóveis fechados, sobretudo apartamentos no litoral, incidiam sobre o consumo mínimo, ou seja, consumo zero. Inventaram que consumo mínimo, mesmo não havendo qualquer consumo, pode ser esticado até 50 KWh. E o consumidor tem de pagar pelo que não gasta.
Outro dado que ilustra bem a sanha arrecadatória atual diz respeito ao Imposto de Renda. Apesar das manifestações da sociedade sobre a necessidade da correção dos índices, tal imposto a ser cobrado tendo por base as tabelas do século passado.
Muitos outros exemplos, como os das taxas bancárias incidentes sobre serviços movimentados com o dinheiro do correntista, estão a mostrar que o consumidor brasileiro é o sujeito mais indefeso do mundo. É que, na visão geral, ele não está aqui para consumir e fazer a economia rolar; está aí para ser esbulhado mesmo.
(Ainda em complemento ao comentário anterior estou publicando este. Ele foi escrito em maio de 2004 e mostra que nada mudou substancialmente em relação ao apetite do governo em avançar no bolso do contribuinte).
Fonte: Nildo Carlos Oliveira
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