André Dabus, diretor de infraestrutura da consultoria de risco Marsh Brasil
Uma das questões mais importantes em discussão no país é o modelo de desenvolvimento da nossa infraestrutura. Várias são as formas em que a União, os estados e municípios podem agir para oferecer à população uma infraestrutura urbana e social de qualidade. A legislação brasileira permite que o governante se utilize da estrutura do próprio Estado, contratando obras e serviços públicos, ou pode optar em fazê-lo, celebrando contratos de concessão de médio ou longo prazo.
Quando o Estado decide transferir os investimentos para o ente privado, assume o papel de gestor e regulador dos contratos, ao invés de empreendedor, quando assume a responsabilidade por todo ciclo deste processo, até a entrega final do equipamento público à população.
Considerando a crise fiscal que assola o país, União, estados e municípios não têm recursos suficientes para desenvolver, implantar e operar a maioria dos projetos e obras de infraestrutura. Neste contexto, mecanismos de privatização e/ou desestatização surgem como alternativa para amenizar o déficit de infraestrutura no país. Privatizar significa vender ativos do Estado que não se enquadram na função social definida na Constituição Federal. Já na desestatização, o Estado concede ao privado a exploração do bem público por período de prazo determinado. São chamados de Concessões e Parcerias Público Privadas (PPPs).
A criação do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) foi a forma encontrada pelo Governo Federal para planejar e priorizar as ações de desestatização e privatização necessárias para o desenvolvimento da infraestrutura que o Brasil precisa para crescer e funcionar melhor.
Em 2019, foram investidos R$ 9,4 bilhões pela iniciativa privada em concessões de 27 ativos. Para 2020 e próximos anos há previsão de investimentos privados equivalentes a R$ 215,9 bilhões em concessões de aeroportos, terminais portuários, ferrovias e rodovias, sem considerar os investimentos em saneamento básico, necessários para melhoria das condições de saúde da população.
Os contratos de concessão celebrados na década de 1990 foram concebidos dentro do princípio de transferência integral dos riscos ao ente privado e, desta forma, os custos e a rentabilidade dos projetos, por consequência, também foram adequados àquela realidade de mercado. Desde o início dos anos 2000, e diante da modernização da legislação, criou-se o conceito de compartilhamento de riscos entre os parceiros público e privado, permitindo que novos investidores se interessassem pelo modelo de concessão, principalmente de rodovias e aeroportos. Naquela época, o ambiente legal e de compartilhamento de riscos permitiu a entrada de novos atores neste ambiente de negócios, como operadores internacionais de infraestrutura e fundos de investimento, além das empresas de engenharia com expertise no setor.
Um dos aspectos relevantes para atração do capital nacional e internacional refere-se à estrutura de alocação e mitigação de riscos dos contratos de concessão. Estes riscos podem ser classificados como gerenciáveis (seguráveis ou não) e não gerenciáveis, que não encontram amparo no mercado segurador nacional e internacional, na maioria dos casos.
Como exemplo de riscos gerenciáveis, podemos citar os de construção, operação, responsabilidades, que podem ser segurados por apólices de seguros tradicionais. Já os riscos não gerenciáveis, como demanda, tributário, de crédito, variação cambial, não são cobertos por seguradores privados devido à dificuldade do mercado em dimensioná-los e precificá-los.
Os riscos não gerenciáveis podem ter seus efeitos amenizados através de cláusulas de reequilíbrio econômico financeiro previstas nos contratos de concessão. Por princípio, devem ficar a cargo do parceiro público que tem melhores condições para assumi-los, do contrário, voltaríamos à década de 1990, quando a integralidade dos riscos era transferida ao ente privado.
Eventos de caso fortuito e força maior sempre que não forem passíveis de cobertura nos contratos de seguros, também são considerados não gerenciáveis e podem ser objeto de reequilíbrio econômico financeiro dos contratos.
A indústria de seguros no Brasil, ao longo dos últimos 25 anos, vem aprimorando os programas de seguros e garantias para concessões de serviços públicos, protegendo o poder concedente, concessionária, regulador, financiador e usuários, inclusive, servindo como exemplo para outros países que também optaram pelo modelo de desestatização. Entretanto, ainda temos muito a fazer, principalmente, estar atentos às mudanças na legislação de licitações e concessões em discussão no Congresso Nacional, além de propor melhorias nos clausulados das apólices de seguros e garantias que deverão ser adaptados a este novo ambiente legal que, em breve, deverá ser implementado no Brasil.
diretor de infraestrutura da consultoria de risco Marsh Brasil
Compartilhar
Compartilhar essa página com seus contatos!