Apagão, enchentes e viga despedaçam a infraestrutura

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São fatos que o governo considera isolados e, eventualmente, quase pontuais. No fundo, entretanto, o apagão que deixou 18 estados brasileiros às escuras, as inundações recentes no Estado do Rio de Janeiro e uma viga que despencou de um pilar do Rodoanel, em São Paulo, ocasionando a queda de outras – eventos que provocaram graves prejuízos materiais, destruição e riscos de morte -expõem a realidade da infraestrutura do País e de uma engenharia que precisa e deve ser repensada.
Quando, na noite do dia 10 deste mês, e na madrugada do dia seguinte, o País se tornou vítima do blecaute que paralisou a maior parte de suas atividades, ficando praticamente na mais absoluta escuridão, interrompendo o abastecimento de água para quase 7 milhões de pessoas só na Grande São Paulo, insistiu-se em tapar o sol com a peneira.
A luz dos esclarecimentos não teria chegado à população, ao menos na celeridade necessária, não fosse o trabalho ágil da imprensa, mostrando as contradições manifestadas no centro do poder. As primeiras informações eram de que uma descarga elétrica ocasionara o blecaute. E poucos, a exemplo do presidente da Eletrobrás, José Antônio Muniz, cuidaram de explicar que fora uma falha técnica a causa da propagação da ocorrência. As preocupações primeiras das autoridades da República concentraram-se no trabalho de bastidores para evitar explorações e, depois, desgastes políticos.
Nada impediu, entretanto, que viesse à tona a fragilidade de um sistema que peca exatamente pela sua centralização excessiva. A tal ponto, que um evento ocorrido lá adiante, na distante Itaipu, cria um efeito dominó, sem que nada possa bloqueá-lo e neutralizá-lo.
Depois, vêm as enchentes no Estado do Rio, que deixou ao desabrigo e no desespero, só na região de Campos, mais de 10 mil pessoas. Ali, o rio Ururaí transbordou e a ponte na BR-101 Norte teve de ser interditada. O fato despertou a atenção de urbanistas e estudiosos do fenômeno das enchentes. E se chegou a uma conclusão meridiana: um Estado rico como o Rio de Janeiro, favorecido pelo recebimento dos royalties do petróleo, não contou, nos últimos dois anos, com recursos da ordem de R$ 100 milhões previstos no Orçamento da União para obras de drenagem e de prevenção de desastres do gênero. O fato se configura como um escândalo e um acinte.
As autoridades, no entanto, atribuem as inundações apenas "às leis da natureza". E, conforme têm ocorrido em tantas outras vezes, em quase todas as regiões brasileiras, o exemplo de Santa Catarina ilustra bem essa afirmação: depois do desastre, vem a promessa. No caso das enchentes na cidade do Rio de Janeiro, a prefeitura local anunciou um plano de contingência informando que vai contratar empresas especializadas para a execução de obras de drenagem. Trata-se, na prática, de um comportamento escapista, pois todos sabem: passadas as enchentes, as promessas não se concretizam e a população volta a ser esquecida, pelo menos até as próximas eleições.
E, por último, incluímos, nessas reflexões, o caso da viga que se desprendeu dos pilares do trecho sul do Rodoanel, ocasionando a queda de outras duas, despedaçando veículos e quase matando três pessoas na Régis Bittencourt. Sejam quais forem as causas que vierem a ser apuradas, o que se constata é que essa obra deveria no mínimo ser bem monitorada e fiscalizada, em especial por atravessar uma das rodovias mais movimentadas do País. Afinal, o governo gasta mais de R$ 25 milhões para empresas contratadas cuidarem da fiscalização. E a própria Dersa, estatal responsável pela obra, diz que disponibiliza 400 funcionários para ajudarem nesse serviço. É gente demais, para uma fiscalização de menos, ou fiscalização de menos, para uma obra que teria tudo para ser um modelo de qualidade do ponto de vista da construção. A engenharia, nesse caso, e no conjunto das ocorrências que mostra a vulnerabilidade da infraestrutura brasileira, precisa ser repensada.

Fonte: Estadão


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