Eldorado e Fibria terão investimentos de R$ 8 bilhões; as obras incluem emprego de métodos construtivos variados
Joás Ferreira
Dois megaprojetos do setor papeleiro vêm sendo desenvolvidos no município de Três Lagoas (MS), região Centro-Oeste do País: a implantação da Eldorado Celulose e Papel e a expansão da unidade da Fibria que, juntos, respondem pelo aporte de recursos da ordem de R$ 8 bilhões. |
As obras de engenharia em curso e, posteriormente, a operação de unidades fabris de grande porte devem contribuir para alterar o perfil econômico local, impondo a necessidade de novos equipamentos urbanos.
O projeto Eldorado, do grupo JBS-Friboi, conta com o investimento de R$ 4,8 bilhões e tem conclusão prevista para o final do segundo semestre de 2012. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) aprovou financiamento de R$ 2,7 bilhões.
A unidade terá capacidade para produzir 1,5 milhão t/ano de celulose branqueada e contará com uma planta integrada de evaporação com capacidade de processamento de 1.600 t/h de água, concentrando licor preto de 14,4% a 80% de componentes sólidos secos. A fábrica será a maior do mundo em linha única.
Polímero biodegradável
Entre as inovações tecnológicas adotadas pela Serpal Engenharia e Construtora — responsável pelas obras civis da Eldorado Papel e Celulose — em algumas instalações produtivas do projeto na cidade de Três Lagoas, destaca-se a substituição da lama bentonítica por polímero biodegradável para a estabilização das escavações das fundações com paredes-diafragma.
O emprego de polímero, segundo a empresa, é uma prática relativamente nova nos processos de fundações que vem ganhando espaço nos meios técnicos, principalmente porque o material tradicionalmente usado (lama betonítica) é de difícil descarte e pode trazer como consequência a contaminação do meio ambiente.
A participação da Serpal nesse megaempreendimento concentra-se na execução das seguintes áreas: linha de fibras (cerca de 11 mil m3 de concreto); caustificação/forno de cal (cerca de 16 mil m3 de concreto); secagem (cerca de 20 mil m3 de concreto); e caldeira de força auxiliar (cerca de 1 mil m3 de concreto). Todas essas obras foram contratadas por Engineering, Procurement and Construction (EPC), sendo que as três primeiras, da Andritz Brasil Ltda., de Curitiba (PR), e a última, da Companhia Brasileira de Caldeiras (CBC), de Jundiaí (SP).
A construtora informa que está finalizando os serviços de fundações e executando as superestruturas em concreto moldado in loco, montando pré-moldados e iniciando preparo de bases para pisos de concreto.
Hélice contínua
O método construtivo adotado inclui o emprego de fundações em hélice contínua, paredes-diafragma e estacas raiz; superestruturas em concreto pré-moldado executado em canteiro e moldado in loco; lajes pré-moldadas, alveolares de fábrica e pré-fabricadas em canteiro; coberturas em estruturas metálicas com telhas trapezoidais e telhas zipadas; e fechamentos laterais em painéis pré-moldados em concreto, alvenaria armada e estruturas metálicas.
No que diz respeito ao desenvolvimento das obras da linha de secagem, as principais dificuldades enfrentadas, de acordo com a Serpal, foram a execução de serviços de fundações diretas (sapatas e bases) na presença de lençol freático, o que implicou esgotamento manual da água, uma vez que o solo local não permitia o rebaixamento de lençol freático com ponteiras.
Outro problema, nessa mesma área, foi a execução de parede-diafragma em presença de solo muito duro, por vezes provocando a quebra dos equipamentos, demandando a mobilização de mais de um equipamento de escavação; diminuição da “ficha” de parede (trecho da parede que fica embutido no terreno após escavação); e utilização de estroncamento provisório no local de escavação contida pela paredes-diafragma, até a concretagem da laje de fundo.
A Serpal frisa que, como um complicador a mais, as instalações da área de secagem, diferentemente do que normalmente é adotado em fábricas de celulose, foram projetadas para a instalação de duas máquinas secadoras paralelas em um mesmo prédio.
Já na obra da linha de fibras, a empresa salienta que os entraves ficaram por conta da execução de muitas canaletas de piso em área com diversas bases de tanques de grandes diâmetros, criando muitas interfaces com a empresa de montagem, que só puderam ser conciliadas com planejamento detalhado de execução de panos de piso e canaletas (serviço em andamento).
O distanciamento de grandes centros e as grandes dimensões de muitas peças, nas áreas de responsabilidade da Serpal, exigiu que a fabricação de pré-moldados fosse executada no próprio canteiro de obras. Para isso, em função do volume de concreto e frentes de trabalho da Serpal, foram implantadas três usinas de concreto dentro da obra: Engemix, MCC e Concrelongo.
Além disso, a construtora lembra que, no escopo de serviços do projeto Eldorado, foram contempladas especificações para atendimento à seguradora FM Global — a empresa determinou o emprego de reforços em estruturas metálicas de cobertura para enfrentar condições meteorológicas extremas.
Área industrial
A área industrial total da Eldorado ocupará 350 mil m², sendo composta por pátio de madeira, processo de cozimento, processos de lavagem e deslignificação, branqueamento, extração de celulose, recuperação química (caldeiras, forno de cal e calcificação), planta de evaporação, utilidades (Estações de Tratamento de Água, de Efluentes e de Água de Caldeira) e energia (dois turbo-geradores, cada um com 110 MW). Há ainda áreas complementares, como torres de resfriamento, compressores e chillers.
Anexa à planta de celulose há uma planta de dióxido de cloro (a partir de cloreto de sódio), fornecida pela Eka, e uma planta de oxigênio, fornecida pela White Martins.
Atualmente, estão sendo concluídas as obras de infraestrutura: arruamentos em asfalto, concreto e piso intertravado na área da fábrica e nos acessos para os setores administrativo e de abastecimento de insumos básicos e madeira.
As peças menores das estruturas das edificações, executadas em pré-moldados de
concreto, estão sendo fabricadas na cidade de Panorama, que fica próxima. As peças grandes estão sendo executadas no canteiro, por questão logística. A estrutura do prédio das caldeiras será construída com estrutura metálica galvanizada.
O fechamento dos prédios será com estruturas metálicas trapezoidais zipadas, pós-pintadas. As coberturas serão executadas com telhas zipadas com a mesma composição. As bases principais são as dos turbo-geradores. Elas serão executadas com concreto in loco, com mistura de gelo para evitar trincas e fissuras.
Mão de obra
A mão de obra empregada teve de ser recrutada em diversas regiões do Nordeste do País, pois no local em que o empreendimento está sendo construído não tinha quantidade suficiente de trabalhadores qualificados para a demanda necessária.
Para abrigar parte considerável do total de operários exigidos, para tocar a obra, foram implantados três alojamentos na região, com capacidade total para cerca de 4 mil vagas. O projeto Eldorado deverá ter para a execução das obras até 8 mil trabalhadores, considerando-se os serviços de obra civil e montagem eletromecânica.
Florestas plantadas
A celulose em Eldorado será produzida com matéria prima obtida de florestas plantadas de eucalipto (fonte 100% renovável) e se destinará principalmente ao mercado de exportação, para produtores de papel localizados na América do Norte, Europa e Ásia. A nova fábrica será responsável por 20% do total das exportações brasileiras de celulose.
Para viabilizar o escoamento de parte da produção, a Eldorado Brasil fechou acordo com a América Latina Logística (ALL), que tem prazo de 15 anos, e prevê investimentos de R$ 300 milhões, englobando melhorias nas estradas, material e construção de terminais de transbordo em Aparecida do Taboado (MS) e Santos (SP). Com essa parceria, a ALL se compromete a transportar, aproximadamente, 800 mil t/ano, que representa mais da metade da capacidade de produção da nova planta. O sistema de transporte para o restante (700 mil t/ano) ainda está em estudos, sendo que todos os modais disponíveis estão em avaliação.
O transporte será feito através de estrada entre Três Lagoas, cidade onde esta localizada a fábrica, até a cidade de Aparecida do Taboado (MS), num percurso de 90 km. Lá ocorre o transbordo, no terminal que será construído, e então segue através de ferrovia por mais 900 km até o porto de Santos (SP).
Com o conceito Best Available Technology (BAT), baseado na utilização dos mais avançados sistemas e soluções disponíveis, a nova fábrica terá como objetivo adotar um processo de produção acima dos padrões de exigências do mercado mundial.
Outro diferencial, segundo a empresa, está na planta industrial que foi projetada para aperfeiçoar sua matriz energética. A fábrica será autossuficiente em energia elétrica produzida a partir de biomassa. Isso ajudará a melhorar o custo de produção, que promete ser um dos mais competitivos do mercado.
Exigência de cumprimento de prazo
e diversidade de métodos construtivos
Rodrigo Werneck, engenheiro da Ottimiza Engenharia, responsável pela obra executada para o projeto Eldorado Celulose e Papel, descreve alguns aspectos importantes do trabalho.
Qual é a participação da Ottimiza Engenharia?
Nós elaboramos o projeto básico civil e estamos desenvolvendo o projeto executivo para as áreas da preparação de pasta e da preparação de licor branco, incluindo as unidades do cozimento, deslignificação, lavagem, depuração, branqueamento, caustificação e forno de cal.
Quais foram as características especiais desenvolvidas?
O trabalho, realizado para a Andritz Brasil Ltda., detentora de tecnologia de celulose e papel e integrante do contrato de EPC, foi iniciado meses antes da entrega da proposta para a Eldorado. Durante este período a Ottimiza prestou serviços de consultoria visando aperfeiçoamentos do layout das unidades industriais e elaboração do projeto básico civil e do orçamento de construção civil. Atualmente, após o sucesso comercial obtido com a entrega das propostas, a nossa empresa está desenvolvendo o projeto executivo civil das unidades.
O que cada uma das áreas tem de especial, sob o ponto de vista de projeto e execução?
Tanto do ponto de vista de projeto quanto do ponto de vista de execução, nas áreas pertencentes às unidades de preparação de licor e de pasta, o prazo de conclusão tornou-se um grande desafio, ganhando especial importância e destacada visibilidade, muito mais do que o normal, em virtude de elevado nível de maturidade na elaboração de projetos. Ao contrário do que ocorre em outros segmentos industriais, tradicionalmente os empreendimentos nesse segmento de construção são efetivamente entregues ao cliente final nas datas previstas.
Para cumprimento dos prazos estabelecidos, as áreas de engenharia e de construção civil atuaram de forma integrada, a partir da fase de proposta do empreendimento, definindo em conjunto e com antecedência a logística e as diferentes metodologias construtivas a serem utilizadas em cada local da obra, visando possibilitar que a sequência construtiva adotada garantisse o progresso demandado pelo empreendimento.
Em função disso, foram empregadas técnicas tais como escavação em taludes especiais com proteção de solo, permitindo assim execução de obras adjacentes à escavação; utilização em grande escala de estruturas pré-moldadas, inclusive de lajes maciças pré-moldadas ou de lajes alveolares protendidas, que permitiram a não utilização de cimbramento em algumas edificações, viabilizando a execução simultânea de obras no pavimento térreo e em pavimentos elevados; e utilização de estruturas pré-moldadas complementadas por estruturas metálicas, sempre com o objetivo de liberar frentes de trabalho na obra buscando as opções construtivas mais racionais.
Qual o prazo de execução e quais foram as dificuldades técnicas?
O prazo previsto para a execução de todas as áreas industriais foi de 22 meses.
A principal dificuldade técnica das construções pode ser resumida na multiplicidade de metodologias constru
tivas utilizadas para evitar possíveis interferências entre diversas obras adjacentes, assim como inconvenientes causados pelas interfaces entre construção civil e montagem, que foram previstas e solucionadas em conjunto desde o início, para reduzir o risco de atrasos no cronograma.
Números da obra
– Movimentação de terra: 9 milhões m³
– Pré-moldados em concreto: 300 mil m³
– Aço: 35 mil t
– Estrutura metálica: 30 mil t
– Áreas de pavimentação: 180 mil m²
– Trabalhadores no pico: 8 mil
– Pipe Rack: 21 268 m²
– Área de turbogeradores: 4.250 m²
– Planta de oxigênio: 3.337 m²
– Planta de dióxido de cloro/químicos: 4.309 m²
– ETA/captação: 11.670 m²
– ETE/emissário: 139.400 m²
– Utilidades ETAC: 2.635 m²
– Área total construída: 349.537 m²
Projetistas e construtoras
– Fornecedoras de tecnologia: Hochtief/Andritz e Metso
– Sub-contratadas da Hochtief/Andritz: Serpal (civil) e Montecalm (eletromecânica)
– Sub-contratadas da Metso: Forces (civil) e Irmãos Passaura (eletromecânica)
– Contratadas da Eldorado: Paranasa, Mutual, Engepar, Conterm e Azevedo Travassos
– Projeto de engenharia: Ottimiza e Andritz Brasil (detalhamento civil das áreas do cozimento, branqueamento, caustificação e forno de cal)
Fonte: Estadão