A economia pernambucana cresceu, está mais moderna e diversificada, mas, nas próximas décadas precisará reduzir a desigualdade social
Marisa Marega
O Estado de Pernambuco, que está com altas taxas de investimento, de crescimento econômico e de emprego formal, reduziu o nível de pobreza absoluta. No entanto, os analistas acreditam que o desnível em relação à parte desenvolvida do País precisa diminuir.
A professora da Universidade Federal de Pernambuco, ex-secretária do Planejamento do Estado e do município do Recife, Tânia Bacelar, espera tempos melhores: "O Nordeste, nos últimos 50 anos, não foi bem. Não recebeu investimentos na maior parte do período e ficou para trás. Embora represente 27% da população do País, participa com apenas 13% do PIB nacional. Qualquer indicador social mostra uma grande diferença em relação ao Sul e Sudeste do Brasil.
Sobre os próximos 50 anos, ela diz: " O nosso maior desafio é que o Estado consiga se posicionar melhor no cenário econômico e, com isso, reduza seu hiato social. No começo deste século, os anos iniciais foram favoráveis. A política e economia nacionais ajudaram na mudança do perfil da elite política também. O discurso das elites mudou. Prevalece agora uma mensagem mais verdadeira. A região é portadora de grande potencial. O que falta é apostar nele. Nossa infraestrutura de acessibilidade ainda é muito falha. É preciso cuidar das estradas, ferrovias. Estamos engatinhando porque as grandes obras demoraram a chegar. As ferrovias são estratégicas no Nordeste. Elas precisam fazer toda a ligação com o potencial graneleiro da região central do Brasil".
Especialista com 20 anos de experiência vividos na extinta Sudene, Tânia direciona o raciocínio para um foco. "Espero que o Brasil veja o Nordeste de forma diferente. Não queremos ser uma região problema, visão construída pela antiga elite que usava a imagem do "problema" para se beneficiar. É importante na próxima década que haja uma revisitação do Nordeste. Não somos região problema, temos grandes potencialidades. Fará bem ao País essa releitura das potencialidades da região".
A primeira aposta em mudar a imagem veio do poder público. Nos últimos quatro anos, os investimentos do Estado cresceram 2,5 vezes. Entre 2003 e 2006, o governo local investiu, em média, R$ 680 milhões em obras de infraestrutura. No período de 2007 a 2010, ele conseguiu elevar esses aportes à média de R$ 1,7 bilhão de investimentos ao ano. Só no ano passado, foram autorizados gastos de R$ 2,7 bilhões.
A economia pernambucana recebeu uma injeção de R$ 46 bilhões em investimentos públicos e privados a serem aplicados até 2014. O Produto Interno Bruto (PIB) do Estado cresceu 16% em 2010, quase o dobro da média de outros estados. Hoje, a receita total de Pernambuco é de R$ 14 bilhões, impulsionada pela arrecadação de ICMS que cresceu 18,2% ano passado.
Déficit em infraestrutura
Tânia Bacelar, especialista em desenvolvimento econômico, analisa: "Do ponto de vista da indústria, o Nordeste vem ganhando espaço, principalmente, no litoral de Bahia, Sergipe, e aqui em Pernambuco, que é onde se concentram as novas indústrias. Há uma melhoria lenta, mas consistente na base industrial, inclusive por conta da boa localização estratégica face aos mercados da América do Norte e Europa, o que tem impulsionado a melhoria da infraestrutura portuária de Itaqui, Pecém, Suape, Aratu, etc ".
No entanto, ela alerta para as dificuldades que o Nordeste terá pela frente. " Estamos investindo nos déficits de infraestrutura. Antes, por muitas décadas, a convergência em infraestrutura era voltada para o Sudeste que concentrava o crescimento econômico. Por essa razão, a infraestrutura, como a de transporte, ainda é frágil em regiões que têm grande potencial. São porções do Nordeste pouco ocupadas demográfica e economicamente, como o cerrado do Oeste do Maranhão, o Sul do Piauí e Oeste da Bahia.
Outro problema é a água. No Nordeste oriental há um déficit hídrico que será parcialmente coberto com as obras em andamento. Essa desvantagem então, será amenizada. A transposição do São Francisco vai perenizar rios que eram intermitentes. A partir daí, com o solo fértil, poderá surgir uma nova fase produtiva na região. Petrolina, no Vale do São Francisco, é um exemplo de como o solo irrigado produz mais até que outras regiões do País. No Piauí, o sul tem uma das maiores ofertas de água do Brasil. A área tem grande potencial, terra boa, mas, falta ainda o investimento principalmente em infraestrutura".
Incentivo à produção do saber
Tânia Bacelar destaca que: O século 21 será o século do conhecimento, quando a produção de saber fará parte da economia criativa. Ela lembra que o segmento cultural nordestino tem uma riqueza diversificada que ainda não foi valorizada. " Precisamos de infraestrutura aí também. Apoio aos produtores culturais de bens imateriais. Na área de turismo, por exemplo, o modelo só valoriza as praias, e ao longo do tempo desprezou a produção cultural, o patrimônio do saber popular. Se o modelo não muda, haverá apenas valorização da natureza em detrimento do vasto patrimônio cultural que a sociedade produziu. Então, é preciso mudar ".
Mobilidade urbana e meio ambiente
Outras áreas levantam outras questões ligadas ao crescimento acelerado no Estado. " A mobilidade urbana é o aspecto mais visível dos problemas ligados à infraestrutura de Pernambuco diante da ocorrência de enormes engarrafamentos nas maiores cidades do Estado. Já estão sendo empregados investimentos para resolver o transtorno", aponta o professor Luís Henrique Campos, coordenador de estudos econômicos da Fundação Joaquim Nabuco.
Ele destaca a falta de discussão sobre o descompasso entre a localização da população sem emprego e a dos novos polos produtivos, o que gera pressão por fluxos migratórios definitivos ou pendulares. Essa realidade acaba por asfixiar a infraestrutura de áreas como saúde, educação e saneamento que não podem ser enfrentados apenas pelo poder local.
"No tocante à educação", afirma ele, " o poder público está fazendo grande esforço para aumentar a oferta de educação técnica e superior no interior do estado, bem como na qualificação profissional. Nesse ponto, os desafios estão em fazer com que os conteúdos dos cursos foquem necessidades locais, mas, mais ainda, em fixar o corpo docente e gerar pesquisa aplicada que possa ser rapidamente transferida ao setor privado".
Um segundo ponto que o professor Luís Campos aborda é a questão ambiental que, segundo
ele, não está sendo levada em conta como deveria. "Foram reduzidas áreas de preservação e realizados investimentos que estão longe de ter consenso entre os cientistas. Com isso, estamos repetindo os erros cometidos no passado, de buscar o crescimento a qualquer custo. Os bons números da economia devem gerar otimismo, mas não desviar a atenção das contradições inerentes ao crescimento. Somente debatendo e criando saídas para essas contradições é que se conseguirá o desenvolvimento, ou, quem sabe, com grandes mudanças nas políticas públicas, um desenvolvimento sustentável."
Fonte: Estadão