Dois vãos de 25 m em três dias

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Trinta anos depois, ainda permanece de pé o recorde mundial de velocidade de execução de vão de pontes e viadutos. E que é sustentado orgulhosamente pela equipe que esteve à frente da obra do Ramal do Minério (Complexo Ferroviário) de Águas Claras, em Belo Horizonte

 

Corria o ano de 1972 e a Cetenco executava simultaneamente um conjunto de cinco viadutos para Rede Ferroviária Federal (RFFSA). Havia ainda um túnel de 76 m de extensão e um pátio de manobras. Numerados sequencialmente, os viadutos tinham 455 m e 25,35 m de extensão, respectivamente, os dois primeiros, ambos com vão de 25 m e encontros de 30 m. O terceiro viaduto, em curva, possui 175 m de comprimento, vãos de 25 m e encontros de 30 m.
O engenheiro da obra Luiz Roberto Fortes Furtado relembra que o recorde mundial era de sete dias por vão e ao completar um ciclo de cinco dias na execução simultânea de dois vãos de 25 m, já houve muita comemoração, como a do engenheiro Tom Oxman, equipe de fiscalização da empresa norte-americana Bechtel, que se referiu ao fato como “maravilhosa realização”. Quando o ciclo baixou para três dias para dois vãos – conforme atestado técnico da RFFSA – , o fato entrou para a história da engenharia mundial e foi noticiado pela revista O Empreiteiro.
Nessa obra foram introduzidas diversas novas técnicas que contribuíram diretamente para a rapidez de construção do complexo de viadutos, como o uso de armaduras pré-fabricadas para vãos de a10 t; treliças-fôrmas autolançantes, tipo “jumbo” para a execução industrializada dos tabuleiros; fôrmas calantes movimentadas por macacos de passo, para desformas rápidas; e peças pré-moldadas de arrimos executadas com concretos leves de agregados de madeira mineralizada. Além disso, nos dias de chuva foram adotadas coberturas portáteis que permitiram prosseguir as concretagens dos vãos mesmo com mau tempo.
Mas foi a técnica da cura eletrotérmica do concreto realizada com fios imersos (filnoiée) – por meio de duas alternativas: a francesa (trazida pelos técnicos da Enterprise Industrielle, responsável pelo projeto construtivo industrializado da obra, um conceito pioneiro no Brasil), e a brasileira (desenvolvida durante a obra) – que marcou de modo ímpar a construção dos viadutos e garantiu a obtenção da marca recordista. Fortes Furtado recorda a sequencia dos trabalhos na hora da concretagem da fôrmas: “O concreto era descarregado com esteiras rolantes. As concretagens partiam da extremidade avançada da frente em direção a junta, com a parte de trás do tabuleiro já concretada, com o que puderam ser evitadas as juntas frias. Terminando o acabamento da face superior e quando começava o endurecimento do concreto, tinha início a aplicação da cura eletrotérmica acelerada”
Para isso foram usados fios calefatores ligado em curto a transformadores em seco, com tensão máxima industrial (42 V), levando o concreto a temperaturas entre 50 °C a 60 °C controladas termostaticamente. O ciclo de cura acelerada era de 15 horas com equipamento ligado e de 20 horas no total e, imediatamente a seguir, passava-se à desforma e reiniciava-se o ciclo.
Como só havia um kit de aquecimento proveniente da França, Fortes Furtado, professor titular de Eletrotécnica e assistente da cadeira de Resistência dos Materiais na Faculdade de Engenharia da Universidade de Uberaba, idealizou a solução brasileira, calculando a modificação de um transformador em banho de óleo para os taps de uma cura eletrotérmica, com o dobro de fios aquecedores, de forma a poder atender mais uma equipe de cura na obra. Segundo ele, há ainda outro segredo, pois se trabalhou baixos níveis de patamares exotérmicos (temperaturas máximas constantes), usando o conceito de Cura de Pico, de origem mexicana, o que permitiu que a concretagem dos tabuleiros evoluísse muito, com a redução drástica de prazos e custos sem sacrifício da qualidade.
Graças às tecnologias adotadas e ao ritmo veloz imposto aos trabalhos executivos, a obra – que tinha um prazo contratual de dois anos para ser realizada – foi entregue concluída uma semana antes do primeiro ano.

 

 

Avanços informatizados

Embora o início da década de 70 fosse a época dos computadores de grande porte (main-frame) e dos Centros de Processamentos de Dados e a determinação topográfica dos traçados de pontes e viadutos fosse feita com uso de aparelhos ópticos, a obra do Ramal de Águas Claras contou com infraestrutura cartográfica informatizada e, na época de sua finalização, já se viam níveis a laser da Accu-Beam. A informática também permitiu usar-se pela primeira vez uma logística de implantação de obra integrada à logística do próprio empreendimento, desenvolvida pela Bechtel nos Estados Unidos.
Do ponto de vista de projeto, o ramal ferroviário caracterizou-se pelos avanços introduzidos, como a especificação de rampas de 6% de inclinação e raio mínimo de 400 m, com diretriz de alta velocidade, o que permitiu desenvolver conhecimento que revolucionaram os projetos rodoferroviários a partir daí. Por iniciativa da COnsultrix, pôde ser consolidada a metodologia de liberação de fundações.
“Os pilares retangulares, ocos, de seção variável, calculados por meio de computadores main-frame pela Noronha, com até 80 m de altura, tiveram cálculos tão avançados e esbeltez tão revolucionária que foi solicitado um recálculo – tamanha a economia obtida e foram construídos com fôrmas deslizantes”, explica Fortes Furtado.

 

 

Ficha técnica

Construtora – Cetenco
Cálculo da estrutura convencional
    – Escritório Técnico Noronha
Projeto construtivo da obra industrializada
    – Enterprise Industrielle
Fundações – Consultrix
Fiscalização – Bechtel
 

Fonte: Padrão


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