Nildo Carlos Oliveira – Berazategui (Argentina)
*Planta da estação de pré-tratamento às margens do Rio da Prata
O conjunto das obras do Sistema Berazategui, situado a cerca de 30 km da capital do país, inclui a construção da planta de pré-tratamento e a sua interligação com o emissário existente, de 3,5 km de extensão. Contudo, está prevista, para uma segunda etapa, a construção de um novo emissário, que lançará esgoto pré-tratado a uma distância de 7,5 km sob as águas do estuário do Rio da Prata.
Este segundo emissário, que não faz parte do primeiro contrato, é objeto, hoje, de gestões da construtora brasileira para executá-lo. A justificativa das gestões é pertinente: a Camargo Corrêa tem canteiro ali instalado, dispõe de máquinas, equipamentos e equipe pronta para fazer a obra e detém tecnologia construtiva além do conhecimento teórico e prático das condições em terra e no rio para enfrentar as complexidades dos trabalhos de engenharia.
O contrato que a construtora assinou com a Aysa, no valor de US$ 146 milhões, tem financiamento parcial do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e previa, além da construção das obras mencionadas, o fornecimento dos materiais, equipamentos e mão de obra.
No pico das obras civis operava no canteiro um contingente da ordem de 400 trabalhadores.
A nova estação de pré-tratamento, cujos trabalhos vão se concentrar, daqui para a frente, nas montagens eletromecânicas, tem capacidade hidráulica de 33,5 m³/s para extrair e desassorear os materiais flutuantes. Quando ela estiver em funcionamento pleno, e conectada ao futuro emissário, poderá atender até cerca de 60% da população da Grande Buenos Aires, hoje da ordem de 11 milhões de habitantes.
O engenheiro argentino Sérgio Gabriel Chividini, gerente de projetos da Camargo Corrêa nesse país, estima que os serviços, iniciados em janeiro de 2009, devam estar concluídos até março do ano que vem. Ele diz que mais de 85% das obras estão prontas e que elas poderiam estar ainda mais avançadas, não fossem alguns problemas surgidos na fase inicial, quando houve a necessidade da elaboração de ajustes e até de redesenho nos projetos, o que foi realizado com a colaboração da empresa Degrémont. Cálculos foram redimensionados tendo-se em conta índices de vazão e tratamento, até se chegar àquela capacidade hidráulica.
Na primeira etapa houve muita movimentação de terra, escavações e aterro. Foi removida a capa de solo, grande parte do qual teve de ser substituído, até se chegar à camada de terreno mais consistente, favorável ao processo de fundação. A rigor, houve 174.600 m³ de escavação mecanizada; 170.300 m³ de aterro e compactação; 14.100 m³ de obras de proteção de taludes com rochas; emprego de 7.300 m² de solo-cimento e 47.100 m³ de concreto.
Planejamento e interfaces complexas
O planejamento das obras considerou as diversas interfaces do andamento dos trabalhos: a etapa inicial, que incluiu a preparação do terreno; a construção das estruturas fixas, nas quais houve a utilização, também, de peças pré-fabricadas; a instalação das câmaras de chegada de materiais, bombas elevatórias tipo “parafuso de Arquimedes”, sistema de gradeamento e peneiras para separação de elementos sólidos; unidades para filtragem de areia e separação de flutuantes; condutos de ligação com as câmaras de chegada; a estação de bombeamento; a instalação para descarte dos materiais sólidos removidos e de pontes rolantes, além da colocação de outros equipamentos.
*As bombas helicoidais, que foram fabricadas mediante desenho específico
Durante as obras civis foram surgindo problemas, que requeriam, do gerente de projetos, soluções às vezes de emergência.
A exemplo do que acontece, hoje, no Brasil, onde há grande demanda de serviços de engenharia, naquela etapa inicial dos trabalhos o consórcio teve dificuldade para a contratação de mão de obra. Esta vinha sendo absorvida pelo volume de obras públicas e, sobretudo, pela construção de edificações em Buenos Aires e em outras cidades argentinas.
Simultaneamente a essas dificuldades, o consórcio encontrou obstáculos para adquirir equipamentos. Eles são muito específicos e tiveram de ser adquiridos em várias praças. Havia fornecedores na Argentina, Chile, Brasil e em outros países. O fluxo para a entrega dos equipamentos exigia controle de qualidade dos fornecedores, desde a fase da fabricação.
Caso exemplar foi o das bombas helicoidais, ou bombas de água de parafuso sem fim, que operam segundo o princípio de Arquimedes, especificadas, para aquela estação de pré-tratamento, com tecnologia italiana. Eles tiveram de ser fabricados no Brasil, conforme desenho próprio, pela empresa WAM. O princípio de Arquimedes especifica que todo corpo submerso em um fluido é submetido a um empuxo vertical e para cima igual ao peso de fluido deslocado.
O gerente de projetos disse também que houve necessidade de rigor no planejamento da logística para o transporte dos equipamentos, que chegavam por rodovias e pelo mar.
Os equipamentos e a operação
Os engenheiros Sérgio Chividini e Eneas Luiz da Silveira, gerente de produção, informam que o significativo, numa estação de pré-tratamento, como a que se encontra em fase de montagem eletromecânica em Berazategui, é a garantia de uma operação eficiente, em todas as suas fases.
As águas de esgoto, jogadas in natura no Rio da Prata, serão levadas até a estação de tratamento preliminar através da câmara by-pass, que funciona conectada ao canal e ao emissário existente, de 3,5 km de extensão. O tratamento preliminar prevê a remoção de materiais grosseiros e finos, sejam areias ou materiais flutuantes.
Os resíduos sólidos retirados durante cada etapa do processo de tratamento serão separados, compactados e transportados. Depois receberão disposição final de modo a permitir que o efluente seja mais homog&eci
rc;neo, evitando acumulação de materiais no interior e na saída do emissário. Serão evitados, assim, os impactos ambientais.
O efluente, ao entrar na planta pela câmara by-pass, é conduzido pelo canal de entrada até a estação elevatória e passa pelo gradeamento grosseiro (serão oito grades paralelas) para a remoção. Dali, depois de removidos os materiais considerados grosseiros, o efluente é elevado, por intermédio das oito bombas helicoidais tipo parafuso sem fim de Arquimedes, até o gradeamento fino formado por oito equipamentos de grades finas para separação dos materiais “finos”. Estes seguem para os equipamentos de lavagem e compactação. Os resíduos compactados são distribuídos em esteiras transportadoras, que os descarregam em quatro caçambas.
Posteriormente estas caçambas serão levadas por caminhões até o sítio da disposição final.
*Câmara by-pass que operaligada ao emissário existente
Concluída essa etapa, o efluente é levado por dois canais de alimentação para o conjunto de 32 desarenadores, após o que o efluente líquido segue para o canal de água tratada, onde há a conexão com o canal de saída e com o emissário. A areia retirada pelos desarenadores é transportada em tubulações metálicas para as ilhas de tratamento e, depois, removida por caminhões dos silos onde fica acondicionada, até a disposição final. O material drenado nesse processo segue também para o canal de água tratada.
A planta conta com um sistema de água de limpeza e água de serviço, que ajuda no processo operacional da estação de pré-tratamento.
Mas por que no rio?
Uma pergunta que não quer calar, e que foi colocada para o engenheiro Sérgio Chividini, diz respeito ao lançamento dos resíduos, embora pré-tratados, no leito do estuário do Rio da Prata. Por que, em vez do lançamento dos resíduos rio adentro, embora em condições pré-tratadas, não se partiu para a solução do tratamento primário e, eventualmente, secundário e terciário?
No tratamento primário, a matéria poluente é separada da água por sedimentação; no tratamento secundário, o processo resulta na obtenção do lodo ativado ou no filtro biológico, em que a matéria poluente é consumida por microrganismos. E pode-se partir também para o tratamento terciário, quando as águas residuais são submetidas à desinfecção.
O engenheiro explicou que estudos científicos prévios à elaboração do projeto do sistema consideraram que o rio, naquela região, possui uma capacidade depuradora própria. Ao longo pelo menos dos próximos 15 anos os resíduos ali despejados, via emissário, não deverão, segundo os estudos, provocar prejuízos ambientais. O engenheiro ressalta, no entanto, que as instalações a ser concluídas até março do ano que vem estarão aptas a receber o processo de ampliação que complementará, por inteiro, o ciclo do tratamento, caso a Aysa assim venha a decidir.
“No fundo”, disse ele, “a obra e os demais serviços resultantes e complementares sedimentam uma experiência importante da Camargo Corrêa na Argentina e do mercado de obras argentino, junto à construtora.”
Ficha técnica
• Obra: Sistema Berazategui – Planta de tratamento de esgoto preliminar
na Grande Buenos Aires
• Valor do contrato: US$ 146 milhões
• Localização: Cidade de Berazategui, às margens do Rio da Prata
• Concepção e projeto: Degrémont
• Construção: Consórcio UTE – Construções e Comércio Camargo Corrêa (brasileira) e Esuco S. A. (argentina)
• Principais estruturas: Câmara de ingresso, canais de entrada e saída, estação elevatória e desarenadores
• Principais equipamentos utilizados nas obras e fornecedores:
– 32 pontes rolantes para a remoção de areia e material flotante: Degrémont
– 8 bombas helicoidais tipo sem fim de Arquimedes: WAM
– 4 comportas by-pass com acionamento hidráulico: Hydrostec
– 8 peneiras para retirada de sólidos finos: Nahuelco
– 8 grades para retirada de sólidos grosseiros: Mateyka
– 8 lavadores e compactadores de resíduos sólidos: Huber
– Painéis elétricos de média e baixa tensão: Schneider
– 16 lavadores e classificadores de areia: Huber
– 4 transformadores: WEG
– 1 grupo gerador: Caterpillar
– Sistema automatizado para operação com fibra óptica e painéis PL: Schneider