Estouro de orçamento nos complexos esportivos, questionamento sobre o uso posterior das instalações pela comunidade e pressões políticas. Parece uma reedição dos Jogos Panamericanos no Rio de Janeiro, em 2007, mas estamos na Inglaterra
Joseph Young
A aura do planejamento britânico já sofreu um arranhão. O orçamento inicial de 3,4 bilhões de libras esterlinas, equivalente a US$ 6,6 bilhões, foi elevado para 9,3 bilhões de libras, mais do que o dobro. As empresas de engenharia contratadas encontraram sérias dificuldades para levantar financiamento no mercado para as obras, a exemplo da Vila Olímpica, sob responsabilidade da Lend Lease, da Austrália, projetada para alojar 17 mil atletas e que dará lugar a 3.500 novas moradias após os jogos. O socorro deverá vir do fundo de contingências de 2,7 bilhões de libras, que faz parte do orçamento atualizado.
Curiosamente, a falta de concorrência no mercado inflou os custos das obras. Auditores do governo constataram que quase 25% dos contratos de maior valor assinados pela ODAOlympic Delivery Authority no começo de 2008 atraíram não mais que duas propostas nas licitações realizadas. O estádio de atletismo principal e o centro de esportes aquáticos receberam apenas uma única proposta e seus custos já estouraram os orçamentos de longe.
Há outras implicações. A região leste de Londres foi escolhida para o complexo olímpico porque é a parte mais atrasada e pobre da região metropolitana e as obras e os jogos de trariam a tão esperada revitalização. Mas a venda das terras e de edifícios após a Olimpíada pode não gerar a receita almejada. A estimativa inicial era de que a prefeitura de Londres obtivesse 838 milhões de libras da sua parte do Parque Olímpico, com as vendas efetuadas após os jogos, o que alguns analistas hoje duvidam.
As esperanças estão no projeto master detalhado de como o parque será aproveitado após os jogos, que está na alçada da prefeitura londrina, e o plano de segurança do governo britânico para a Olimpíada. Caso esses dois aspectos e seus múltiplos detalhes possam ser incorporados nas obras no estagio mais inicial possível, melhor será o aproveitamento posterior das instalações e menos obras de adaptação sofrerão para esse fim.
O governo estabeleceu o teto de 9,3 bilhões de libras para os custos das obras gastando todo o fundo de contingências de 2,7 bilhões de libras. O que os londrinos temem é que a gordura esteja sendo cortada dos benefícios permanentes às comunidades do East London, preservando-se os investimentos dos jogos e subvertendo a idéia inicial de que a Olimpíada traria a revitalização dessa região decadente. A agência britânica de auditoria, uma espécie de TCU, apontou em relatório recente, que os custos dos eventos ligados à Olimpíada têm registrado aumentos; já os custos das obras de infraestrutura têm sofrido redução.
Para um projeto que já está 170% acima do seu orçamento inicial, certos acréscimos de custos parecem absurdos como, por exemplo, o aumento de 6 milhões de libras para atender a maiores exigências de cargas no estádio principal, gerado pelo espetáculo de inauguração da Olimpíada. Há obras significativas a serem executadas após os jogos, como a adequação do Parque Olímpico e demais instalações para o uso cotidiano da população, orçado em 350 milhões de libras. A prefeitura prometeu alocar 10 milhões de libras anuais para manutenção.
Existe uma preocupação do público de que na medida em que se aproxima a inauguração dos jogos, maior será a pressão política pelo aumento das despesas da festa, incluindo aí o inevitável show pirotécnico de fogos de artifício, em detrimento dos investimentos nas instalações permanentes que serão usadas depois pela população.
Fonte: Estadão