José Carlos Videira
O setor de mineração respondeu por 89% do total das vendas externas paraenses, com US$ 13,1 bilhões dos US$ 14,7 bilhões exportados pelo Estado no ano passado. Segundo o Sindicato das Indústrias Minerais do Estado do Pará (Simineral), a indústria extrativa e a de transformação mineral respondem por mais de 15% do PIB do Pará. A cadeia de produção mineral gera 192 mil empregos diretos e indiretos. Até 2015, o Simineral estima que serão investidos pelo setor US$ 41 bilhões em extração e transformação mineral, infraestrutura e novos negócios.
Mas o cenário promissor na visão da indústria é visto de forma diferente pelos prefeitos dos municípios ao redor das áreas de extração. “O Pará é um estado exportador de riqueza e detentor de pobreza“, define o diretor executivo da Federação das Associações dos Municípios do Estado do Pará (Famep), Josenir Nascimento. Segundo ele, o estado não pode continuar sendo explorado da forma que está. “Temos de encontrar uma relação sustentável entre as necessidades econômicas e as da população. Caso contrário, vamos continuar sendo um estado muito rico, com a população muito pobre“, adverte.
Segundo Nascimento, a exploração mineral no Pará paga menos Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM), o royalty mineral, do que deveria. Ele argumenta que, no Brasil, os royalties da mineração são uns dos menores do mundo. Para o diretor da Famep, a mineração é muito importante para o Estado, e para o Brasil, principalmente, mas precisa resolver as suas mazelas.
Ele conta que, quando a mineração entra num município, cria um impacto não só local, mas regional. O diretor da Famep cita o exemplo de Paraopebas, onde se localiza a maior mina de ferro a céu aberto do mundo, pertencente à Vale. “Todos os municípios em volta dessa cidade foram impactados pela mineração, mas os royalties sempre foram apenas para Paraopebas.” A Famep propõe que o novo marco regulatório da mineração preveja que uma parte dos royalties seja destinada aos municípios do entorno das minas, que também sofrem o impacto da atividade de mineração.
Nascimento lembra ainda que o CFEM é único “imposto“ que se tem sobre a mineração. “Todo produto minerário do estado do Pará é exportado e, em função da Lei Kandir, não recebemos nenhum tostão dos produtos exportados”, frisa. Para ele, “essa situação é tão cruel que, toda vez que a Vale compra algum produto, recebe como crédito o ICMS que ela pagou, porque o que ela vai exportar é desonerado“, diz. Segundo Nascimento, cria-se um volume violento de créditos contra o Estado.
Verticalização baixa
Outro ponto que impacta negativamente a economia dos municípios em torno das minas do Pará, segundo a Famep, é o baixo grau de verticalização da atividade. Nascimento cita como exemplo as produtoras de ferro-gusa, praticamente todas paradas em Marabá, porque não tem matéria prima. “A Vale não vende para elas, porque toda a sua produção está comprometida com a exportação”, afirma. Ele diz que essa situação é muito ruim para os municípios. “Do minério de ferro se produz os derivados, como o gusa, o aço, matéria prima para a produção de bens de consumo, e isso sim, gera riqueza, gera emprego”, enfatiza.
O diretor da Famep lembra que havia expectativa da possibilidade de desenvolvimento industrial na região com a exploração mineral. “Mas essa era a promessa para as mineradoras investirem no Estado. Depois que entram, essa promessa some”, resume. Ele conta que o problema é que ninguém as obriga a se verticalizar.
Nascimento cita como exemplo a Aços Laminados do Pará (Alpa), megaempreendimento lançado pela Vale, em 2010 e suspenso logo em seguida. Nem mesmo a presença do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva na cerimônia de lançamento fez a obra andar. A alegação é de que é necessária a retirada de 43 km de rochas do leito do rio Tocantins para viabilizar a hidrovia Araguaia-Tocantins, para o transporte da produção. “No entanto, para exportar minério bruto a Vale duplica a Estrada de Ferro Carajás”, observa Nascimento. “Por que eles não investem na hidrovia e viabilizam a siderúrgica? Por que têm de esperar o governo resolver?”, questiona. O projeto da Alpa previa o aproveitamento do minério de Carajás e geraria 5.300 empregos diretos e outros 16 mil indiretos na aciaria e laminação.
Com esse impasse, segundo Nascimento, a população é que sofre. Contingentes de pessoas chegam às cidades atraídas pela promessa de emprego, e elas não têm condições nem estrutura de oferecer serviços públicos para dar conta da demanda. “Todo o aparelho de estado tem de ser provido pelo município que recebe um valor irrisório de CFEM para atender toda a demanda social criada pela exploração de minério”, diz.
A solução, segundo ele, é mudar a legislação brasileira e onerar as novas explorações, porque não adianta pressionar as mineradoras. “O marco regulatório, que está sendo discutido no Congresso Nacional, já tem emendas nesse sentido”, afirma.
O diretor da Famep diz que o Pará é o segundo estado do País a contribuir para a balança comercial e um dos últimos a ter receita para poder gerir a sua logística e toda a sua infraestrutura. “Não temos condições de fazer o enfrentamento dos nossos problemas, porque nenhuma das empresas instaladas aqui paga ICMS, em função da Lei Kandir.” Nascimento diz que “onde as mineradoras atuam, as estradas são uma maravilha, mas onde não estão é o caos”.
Falta gestão
Para o geólogo paraense, da ARBS Consultoria e autor do livro “A Indústria Mineral do Pará”, Alberto Rogé
;rio Benedito da Silva, só se consegue reverter a situação precária dos municípios produtores de minério do Pará com planejamento estrutural da região e boa gestão dos recursos públicos. “Os malefícios provocados pela exploração mineral são reflexos da má gestão dos recursos públicos”, enfatiza. Ele também cita o exemplo de Parauapebas. “É o município que mais recebe CFEM, mas seus benefícios não chegam à população”, constata.
O consultor também observa que a Vale dispõe de uma excelente infraestrutura de transporte, com a ferrovia até o Porto de Madeira, em São Luís. “Mas outras empresas que se implantam na região não têm a mesma vantagem para escoar suas produções adequadamente, tendo de embutir esse custo no orçamento de cada novo projeto”, diz. Silva acredita que esse gargalo logístico pode ser equacionado com a hidrovia no rio Tocantins e com a Ferrovia Norte-Sul.
O geólogo ressalta a importância da indústria mineral para os municípios da região. “É um fator de desenvolvimento regional e isso pode ser bem visível no sudeste paraense”, frisa. Ele lembra que há 30 anos, quando foi iniciada a produção mineral em Carajás, a região representava cerca de 17% do PIB paraense. “Hoje esse valor duplicou”, calcula. É lá que está, segundo ele, o município com maior PIB per capita do Pará: Canaã dos Carajás.
E a perspectiva futura é bastante promissora, destaca o consultor da ARBS. “Carajás representa uma das maiores anomalias geológicas do mundo”, ressalta o geólogo. Ele calcula que ainda exista uma série considerável de depósitos de minérios, dos quais estão sendo explorados somente os mais significativos. “À medida que forem ampliando as pesquisas, outros minérios poderão ainda ser descobertos.”
Para o líder do setor de Mineração da KPMG no Brasil, Eduardo Martins, mineração é uma atividade complexa, porque não envolve apenas a extração do minério, mas o transporte até o cliente final. “Geralmente ele está longe e, algumas vezes, a oceanos de distância”, compara Martins. “O desafio no Brasil, quando se encontra uma mina, é montar toda uma infraestrutura para fazer com que esse minério chegue até o seu destino final”, diz. “Infelizmente, minério não brota em Paris, Londres ou Nova Iorque”, compara.
Martins aponta outra questão crucial do setor de mineração: oferta de mão de obra qualificada. “Mesmo que seja abundante o desafio é convencer a pessoa a trabalhar numa localidade remota”, explica.
English Version
Pará’s mining sector is supposed to invest R$ 41 billion in extraction, transformation and infrastructure
José Carlos Videira
The mining sector has accounted for 89% of Para’s total foreign sales, with US$ 13.1 billion of the US$ 14.7 billion exported by the said state last year. According to the Union of the Mineral Industries of the state of Pará (Simineral), the mineral extraction and transformation industry accounts for over 15% of Pará’s GDP. The mineral production chain generates 192 thousand direct and indirect jobs. Simineral estimates that this segment will invest US$ 41 billion in mineral extraction and transformation, infrastructure and new businesses up to 2015.
However, the promising scenario from the industry’s point of view is seen differently by the majors of the cities around the extraction areas. "Pará is a state that exports wealth and holds poverty”, says the CEO of the Para State Cities’ Associations Federation (Famep), Josenir Nascimento. According to him, the state cannot go on being exploited the way it is. “We have to find a sustainable relationship between the economic and the population’s needs. Otherwise, we will continue to be a very wealthy state with a very poor population” warns he.
According to Nascimento, the mineral exploitation in the state of Pará pays less Financial Compensation for the Exploitation of Mineral Resources (CFEM), the mineral royalty, than it should. He argues that, in Brazil, mining royalties are one of the lowest in the world. In Famep’s director’s opinion, mining is very important to the state and especially to Brazil, but it has to solve its blemishes.
He says that when mining gets to a city, it has not only a local but a regional impact as well. Famep’s director gives the example of Paraopebas, where the biggest open air iron mine in the world, owned by Vale is located. “All the surrounding cities were impacted by the mining, however the royalties went only to Paraopebas." Famep proposes that the new mining regulatory framework should contemplate that part of the royalties be destined to the cities around the mines, which also are impacted by the mining activities.
Nascimento further reminds that the CFEM is the only existing “tax” on mining. “All mining products of the state of Pará are exported and, due to the Kandir Act, we do not receive a single penny regarding such exported products” emphasizes he. According to him, “this situation is so cruel that whenever Vale buys any product, it receives the ICMS (State Tax on Goods and Services) it has paid, for what it is going to export is unencumbered”, says he. According to Nascimento, a violent volume of credits is created against the State.
Low verticalization
Another issue that has a negative impact on the economy of cities surrounding the Pará mines, according to Famep, is the activity’s low level of verticalization. Nascimento gives the example of the pig iron producers, almost all of them not working in Marabá because they lack raw material. “Vale does not sell to them because all its production is committed to exporting”, claims he. He says that this situation is very bad for the cities. “From the iron one produces byproducts such as the pig iron, steel, the raw material to produce consumption goods, and that is what generates wealth and jobs”, emphasizes he.
Famep’s director reminds that there was expectation of a possibility of industrial development in the area with mineral exploitation. “But that was the promise for the mining companies to invest in the State. After they come in, this promises vanishes”, summarizes he.
Nascimento gives the example of Aços Laminados do Pará (Alpa), a mega undertaking launched by Vale in 2010 and cancelled shortly after. Not even the presence of the president of Brazil at the time, Luiz Inácio Lula da Silva, in the launching ceremony managed to make the undertaking go ahead. It was alleged that it is necessary to remove 43 km of rocks from the bed of river Tocantins to make the Araguaia-Tocantins waterway feasible to carry the production. “How
ever, to export raw ore, Vale duplicated the Carajás railroad", says Nascimento. “Why don’t they invest in the waterway and make the steel company feasible? Why do they have to wait for the government to decide?”, asks he. Alpa’s Project contemplated using the ore from Carajás and would generate 5,300 direct jobs and 16 thousand indirect jobs in steelworks and lamination.
According to Nascimento, the population is the one that suffers with this impasse.
Many people go to these cities lured by the promise of a job and they do not have either conditions or the structure to offer public services to meet the demand. “The whole state machine must be provided by the city, which receives a derisive amount as CFEM to meet the whole social demand created by the ore exploitation”, says he.
The solution, according to him, is to change the Brazilian legislation and encumber new exploitations, because it is no use pressing mining companies. “The regulatory framework, which is being discussed in the Brazilian Congress, has already amendments in this sense”, says he.
Famep’s director says that Pará is the second Brazilian state to contribute to the trade balance and one of the last ones to have income to be able to administrate its logistics and entire infrastructure. “We are not able to face our problems because none of the companies installed here pay ICMS due to the Kandir Act. Nascimento says that in the locations where the mining companies work the roads are wonderful, but in the locations where they are not installed is chaos”.
There is lack of management
According to the geologist from Pará, who works for ARBS Consultoria and is the author of "A Indústria Mineral do Pará", Alberto Rogério Benedito da Silva, one will only be able to reverse the precarious situation of Pará’s ore producing cities with a structural planning of the area and good management of public funds. “The harm caused by mineral exploitation are a reflection of the mismanagement of public funds”, emphasizes he. He also gives the example of Parauapebas. “It is the city that receives the highest CFEM, but its benefits do not reach the population”, says he.
The consultant also points out that Vale has an excellent transportation infrastructure, with the railroad going up to Porto de Madeira, in the city of São Luís. “However the other companies that establish themselves in the area do not have the same advantage to outflow their production properly, therefore they have to include this cost in the estimate of each new project”, says he. Silva believes that this logistic bottleneck may be equated with the waterway in river Tocantins and the North-South Railroad.
The geologist highlights the importance of the mineral industry to the cities in the area. “It is a regional development factor that is very visible in the southeastern part of the state of Pará”, stresses he. He reminds that 30 years ago, when mineral production was started in Carajás, this region accounted for 17% of Pará’s GDP. “Nowadays this number has doubled”, estimates he. According to him that is where city with the highest GDP per capita in Pará is located: Canaã dos Carajás.
And the future Outlook is a very promising one, points out the ARBS consultant. "Carajás is one of the world’s biggest geological anomalies”, says the geologist. He estimates that there is still a considerable number of ore deposits, of which only the most significant ones are being exploited. “Other ores may still be found as studies are expanded”.
According to KPMG’s Mining sector leader in Brazil, Eduardo Martins, mining is a complex activity because it does not involve only extracting the ore, but the transportation up to the end client as well. “It is generally far away and, sometimes, oceans apart” compares Martins. "The challenge in Brazil, when a mine is found, is to assemble the whole infrastructure to make the said ore get to its final destination", says he. “Unfortunately ore does not find ore in Paris, London or New York”, compares he.
Martins point out another crucial issue in the mining sector: the supply of skilled labor. “Even though it is abundant, the challenge is to convince the person to work in a distant location”, explains he.
Fonte: Revista O Empreiteiro