Os estudos de demanda, elementos principais para avaliar a receita, priorizam o uso de modelos matemáticos, mas simplificam as premissas e os dados de entrada. Partem da comparação a partir das estações de passageiros e não da origem inicial e do destino final (ambas expressões tautológicas, mas necessárias) dos usuários do transporte aéreo. Como tal serão questionados e irão atrasar o processo.
Será natural que os concorrentes queiram garantias de caráter institucional, por exemplo a restrição aos ônibus fretados (aliás, como pretende a Prefeitura de São Paulo), ou a eliminação da ponte aérea entre Rio e São Paulo. São compromissos que podem ser estabelecidos, mas sem garantia de manutenção. Uma nova administração municipal pode mudar as regras, assim como a ANAC pode permitir o restabelecimento da ponte aérea.
Quem mora em Campinas e São José dos Campos e trabalha em São Paulo poderia optar pelo ônibus fretado.
E a redução nos tempos de espera ou de embarque, nos aeroportos de Congonhas e Santos Dumont poderá reduzir o tempo da viagem aérea, eliminando uma suposta vantagem do TAV.
Assim, os concorrentes poderão pedir e prever no contrato as compensações por quebra no equilibrio econômico-financeiro do contrato. O Governo pode assumir esse compromisso? Com tantas questões, ainda em aberto, o TAV não ficará pronto para a Copa 2014.
Divulgado o estudo dos consultores sobre a viabilidade do trem de alta velocidade, mais conhecido como “trem-bala” fica a dúvida sobre a quem esse trem vai atender.
Existem três grandes públicos para o trem de alta velocidade, que justificam a sua implantação:
o que precisa se movimentar de um aeroporto internacional a outro, em função da distribuição da malha aérea e dos voos;
o que usa o trem para viagens de negócios, de uma região metropolitana a outra;
o que usa o trem como principal meio de transporte entre a residência e o trabalho.
A proposta do estudo privilegia o primeiro público: o TAV é uma ligação entre Viracopos, Guarulhos e Galeão, passando por São Paulo. Com isso atenderia, prioritariamente, os viajantes de voos internacionais para conexões internacionais ou nacionais.
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Esses não teriam a opção do modo aéreo, pois as ligações terrestres decorreriam da saturação de capacidade dos respectivos aeroportos. A opção no caso está nos investimentos: ampliar os aeroportos ou implantar um trem de alta velocidade?
O TAV não é viável apenas com a movimentação de conexão e de redistribuição de passageiros de voos. O segundo principal público seria o dos que moram nas bordas das respectivas regiões metropolitanas e trabalham nessas. Moram em Campinas e trabalham em São Paulo e vice-versa. Moram em São José dos Campos e trabalham em São Paulo e vice-versa. Moram no Vale do Paraíba e trabalham no Rio de Janeiro e vice-versa.
O TAV, como proposto, não tem diferenciais competitivos relevantes para atrair o público dos “fretados”, mesmo com as restrições que o Municipio de São Paulo pretende estabelecer a esses. Além de ter um custo maior. Para captar esse público o TAV precisaria chegar o mais próximo dos principais polos de trabalho ou de moradia de médio e alto padrão.
Essa aproximação, no caso da cidade de São Paulo, está prevista no Campo de Marte, o que poderia ser uma conexão por helicópteros, mas pouco adequada, pela via terrestre.
O terceiro público é o das viagens de negócios entre os três polos: São Paulo e Rio de Janeiro, e vice-versa; Campinas e Rio de Janeiro e vice-versa. Para as viagens de negócios entre São Paulo e Campinas o TAV teria a concorrência do automóvel e dos “fretados”. Dada a distância relativamente curta, boas condições rodoviárias e dos serviços de ônibus. Considerando os tempos prévios de embarque o tempo total da viagem aérea pode ficar maior.
Na comparação entre a opção aérea ou terrestre (de alta velocidade) há preliminarmente uma condição emocional. Há pessoas que tem idiossincrasia com o transporte aéreo e tendo uma opção terrestre com tempos próximos só usarão esse último. Independente de outros fatores. Para uma comparação racional, tempo e custo deveriam ser os fatores principais. Na questão do tempo, o estudo faz as comparações a partir da estação de passageiros, não tendo ampliado os estudos de demanda para a origem e destino. Dados os congestionamentos de trânsito, o tempo de viagem deve considerar o tempo de acesso da residência à estação de passageiros. E também da estação de passageiros e o destino.
Tanto São Paulo como o Rio de Janeiro contam com aeroportos para voos domésticos, muito próximos dos principais polos de moradia de classe média e superior e de escritórios. Tanto em um (Alphaville) como em outro (Barra da Tijuca) há uma descentralização, mas não na direção dos aeroportos internacionais onde haverá a ligação do TAV. Considerando os tempos de acesso à estação de passageiros no Campo de Marte, se for em função do tempo de viagem muitos permanecerão no modo aéreo, não se transferindo para o ferroviário. Ademais é preciso considerar o cenário do restabelecimento da ponte aérea.
As Cias aéreas não querem a ponte aérea. Mas, diante de uma ameaça real, com uma redução de demanda, com o efetivo funcionamento do TAV, voltarão a estabelecer a ponte aérea, acompanhada de mecanismos que facilitem a compra do bilhete com tempo mínimo entre a chegada à estação de passageiros e o embarque.
No caso de São Paulo, não pode se desconsiderar que quando o TAV começar a funcionar, o trecho sul do Rodoanel já estará em plena operação, com a liberação da Avenida dos Bandeirantes e também da Avenida Roberto Marinho, enquanto a Marginal do Tietê continuará sendo a principal rota dos caminhões de carga, dificultando o acesso ao Campo de Marte.
Com tantas dúvidas em relação às projeções de demanda, para um empreendimento de bilhões de dólares, o processo ainda precisará ser muito discutido e amadurecido, para que os concorrentes privados se arrisquem, efetivamente, a investir. O TAV ainda é uma bala perdida. Sem rumo claro. Não atenderá ao público da Copa de 2014.
Fonte: Estadão