Uma maneira de praticar uma arquitetura para todos

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Vamos falar de um arquiteto que explorou, em todos os limites de suas possibilidades, a industrialização da construção. Referimo-nos a João Filgueiras Lima, o Lelé, nascido carioca em 1932, que virou cidadão do mundo e morreu aos 82 anos, no dia 21 de maio último, em Salvador (BA), onde viveu durante mais de três décadas. Profissional dedicado e meticuloso, ele assimilou a arquitetura em suas amplas lições teóricas, mas cuidou de praticá-la diretamente nos canteiros de obras, com a consciência de que ela deveria ser para todos, sobretudo para os que menos tinham condições de acessá-la.

 

O arquiteto João Filgueiras Lima, o Lelé

 

Conheci-o no Rio de Janeiro na época em que começaram a ser construídos os Centros Integrados de Educação Pública (Ciepes). Ele montou a sua "fábrica de escolas" junto às obras para acompanhar in loco a produção de cada peça de argamassa armada destinada à infraestrutura dos Ciepes, que tinham sido projetados por Oscar Niemeyer segundo plano de Darcy Ribeiro, então secretário da Educação do governo do Estado.

 

O projeto do antropólogo previa ensino público de qualidade em período integral para os alunos da rede estadual. Contudo, perdurou apenas durante os dois governos de Leonel Brizola (1983-1987 e 1991-1994). As administrações que se seguiram trataram de interrompê-lo ou modificá-lo.

 

As peças pré-fabricadas segundo a orientação de Lelé destinavam-se a canaletas pluviais, passarelas, canalização de córregos, cobertura de pontos de ônibus e a outras serventias. Ele acreditava que, sem essas condições de apoio, segurança e facilidade de acesso, os Cieps poderiam correr o risco de se transformar em pequenas ilhas dispersas em pontos urbanos isolados. Daí, a importância proporcionada à montagem de um sistema de infraestrutura no entorno deles. As administrações estaduais posteriores pouco se preocuparam com isso.

 

Mais tarde, o governo federal tentou aproveitar a experiência dos "brizolões" em um plano nacional de construção escolar, os Centros Integrados de Apoio à Criança (Ciacs), que também tiveram fôlego curto.

 

A ideia da industrialização de equipamentos urbanos não morreu. Veio a intensificar-se depois que o arquiteto inaugurou em Salvador a Fábrica de Equipamentos Comunitários (Faec). Simultaneamente, ele desenvolveu outras iniciativas, uma delas em colaboração com Lina Bo Bardi, voltada para a recuperação do centro histórico daquela capital.

 

Lelé elaborou projetos para a construção dos hospitais da rede Sara Kubitschek e ampliou o foco de utilização de componentes industrializados, aperfeiçoando o desenvolvimento da tecnologia da argamassa armada. Conquistou reconhecimento internacional quando obteve o Prêmio Bienal Ibero-Americana de Arquitetura e Urbanismo no ano 2000, além do Prêmio Latino-Americano de Arquitetura da 9ª Bienal Internacional de Arquitetura de Buenos Aires, em 2001.

 

Nunca deixou de ser um profissional com os pés no chão. Pioneiro da construção de Brasília, aonde chegou em 1957, costumava lembrar que foi ali que começou a sua longa trajetória engajada numa arquitetura para todos.  

Fonte: Revista O Empreiteiro


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