De repente, e sem que nos apercebêssemos disso, estávamos dia 20 deste mês (outubro), na diretoria da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Mackenzie, participando de uma mesa-redonda que discutiu sustentabilidade.
Ali ocorreria, momentos depois, a premiação dos projetos vencedores do concurso para "novas tipologias de moradias populares sustentáveis", uma iniciativa da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo e do departamento paulista do Instituto de Arquitetos do Brasil. Uma nova geração de jovens arquitetos estava a demonstrar que o futuro definitivamente lhes pertence.
Walter Caldana, diretor da faculdade, reuniu, para um minuto de prosa, em sua sala, este jornalista, o eficiente e experiente secretário estadual da Habitação, Lair Krähenbühl, o diretor técnico da CDHU, João Abukater Neto, João Razaboni, diretor da PRI Engenharia e a professora Eunice Abascal, coordenadora de pesquisa daquela faculdade. O tema aflorou a partir de uma provocação: Até quando a questão da sustentabilidade continuará a ser um artifício do marketing, essa lógica do mercado com a qual são criadas e, depois, difundidas, até à exaustão, necessidades antes absolutamente dispensáveis?
O conceito de sustentabilidade não nasceu por acaso. Ganhou forma e força em Estocolmo, no começo dos anos 1970, na Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano. Dali, o tema se irradiou. Esteve presente na Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Comissão Brundtland), em 1987; foi amplamente discutido na Eco-92, no Rio de Janeiro, e tem ocupado, fragmentariamente, espaços nos projetos de arquitetura e nas obras de engenharia. Sem aquela tomada de posição, o Green Building Council Brasil (GBC) não existiria e as exigências para a certificação de Liderança em Projetos Ambientais e Energéticos (Leed) seriam letra morta.
Não fosse a difusão desse conceito e a consciência de que estávamos caminhando para o pior dos mundos, os canteiros de obras não estariam sendo redimensionados; não estaria havendo análise mais rigorosa no aproveitamento e uso dos materiais; a questão do clima, da proteção dos mananciais e dos aquíferos não estaria sendo considerada e as cidades talvez não estivessem se dando conta de que adotam um modelo de expansão que leva à degradação e à catástrofe. As políticas públicas, nesse campo, não estariam sequer engatinhando.
Walter Caldana bateu na tecla de que, mais importante do que construir ruas, é construir cidades e que, mais difícil do que construir casa, é construir cidadania. Ele citou, como exemplo de um trabalho em favor da cidadania, um engenhoso sistema de transporte vertical para moradores de conjuntos construídos em áreas de encostas, concebido pelo arquiteto João Filgueiras Lima, o Lelé. De imediato, Abukater disse que gostaria de estabelecer contato com Lelé para ver a possibiliade de aproveitamento desse tipo de transporte, em conjuntos da CDHU.
Lair enfatizou a prioridade da sustentabilidade. Inconcebível, segundo ele, pensar em construir, sem trazer a questão para dentro dos projetos. Sobretudo, "trazer as casas para dentro das cidades" e não construí-las a 30 ou mais quilômetros das áreas centrais, o que só onera o bolso de quem já vive no limite das necessidades mínimas da sobrevivência.
Lembrei, na mesa, que dias antes, o empresário Hugo Marques da Rosa, presidente da Método, me dissera: "De nada adiante construir um edifício sustentável num bairro insustentável. Ele seria apenas um elemento isolado, conquanto sustentável, numa paisagem degradada. Temos de pensar em bairros sustentáveis". Lair avançou na idéia: acha que os planos diretores precisam incorporar a questão das cidades sustentáveis. Este será o preço a ser pago para a garantia da sobrevivência.
No fundo, a mesa-redonda improvisada, na FAU/Mackenzie, foi uma demonstração de que o tema pegou e começa a ganhar feição de consciência coletiva.
Fonte: Estadão