Nildo Carlos Oliveira
Luiz Dias, considerado o mais hábil dentre aqueles profissionais, olhou o entorno, morros, mar e mata abundante e sentiu que a tarefa não seria das mais fáceis. O embrião da futura capital teria de nascer praticamente do nada, e, o que é pior, obedecendo a um cronograma de obras extremamente apertado, pois ainda em dezembro daquele ano o núcleo urbano teria de estar funcionando. Com o mestre de obras português Luís Dias, identificado na literatura especializada como o primeiro engenheiro a trabalhar no Brasil, o País deu os primeiros passos para desenhar o que, no futuro, ficou autenticado como engenharia brasileira.
Aquelas primeiras construções coloniais, com alicerces em fundação direta de alvenaria de pedra rejuntada com barro, pedriscos secos ou argamassa de cal, difundiram-se e aperfeiçoaram-se, com as espessuras variando segundo o destino da obra: fortalezas, residências ou igrejas. Essa engenharia, que recebeu influências pontuais de holandeses e franceses, adquiriu feição própria, consolidada nos casarios de Ouro Preto, em Minas Gerais, nas frontarias azulejadas de São Luís do Maranhão, nos traços dos bairros antigos de Olinda e Recife, em Pernambuco, na cidade de Marechal Deodoro, em Alagoas, no Brasil inteiro, enfim.
Projetada séculos afora, ela alcançaria o limiar de 1900 preservando uma característica de origem: um sentido de desbravamento, de pioneirismo. Era que, passado tanto tempo, o Brasil ainda estava para ser construído. Havia, entretanto, dados novos nesse horizonte: a possibilidade da incorporação das técnicas construtivas oferecidas pela arquitetura e engenharia de outras nações, em especial França e Inglaterra. Sob as sombras de um passado cada vez mais remoto ficavam obras como o conjunto formado pela igreja e colégio dos jesuítas, no Terreiro de Jesus, em Salvador, construído sob a responsabilidade do sargento-mor, engenheiro José Antonio de Caldas; a Calçada de Lorena, em São Paulo, construída em fins de 1700 pelo engenheiro e brigadeiro João da Costa Ferreira; a ponte que os holandeses fizeram de 1639 a 1641 na confluência dos rios Capibaribe e Beberibe, no Recife; as pontes de pedra lavrada erguidas em São João del-Rei (MG); a igreja Santa Cruz dos Militares (Rio de Janeiro) e o mosteiro de São Bento (São Paulo), projetados e construídos por José Custódio de Sá e Faria, além de diversas outras obras de maior ou menor expressão.
Posteriormente ganhariam importância histórica edificações realizadas sob o salto qualitativo proporcionado pelo uso do tijolo. Os exemplos de construções com esse material se difundem amplamente, sobretudo em São Paulo, onde instalações fabris e estações ferroviárias passam a incorporar, nas últimas décadas de 1800, esse tipo de alvenaria. Presentes, então, em numerosas construções da época, a influência de italianos e ingleses, de que são exemplos a Vila de Paranapiacaba, conjunto de construções em estilo vitoriano, e o Museu Paulista, no bairro do Ipiranga, concebido pelo arquiteto italiano Tommaso Bezzi.
O País vive no começo do século outro momento histórico, com as cidades em processo de crescimento, as populações, em especial as elites, reivindicando luz, água e esgoto, mais conforto para as moradias e casas senhoriais, espaço para as atividades de lazer e cultura e com os barões do café, depois os industriais, exigindo melhor infraestrutura urbana e transporte rodoviário e ferroviário para escoar produtos até os armazéns portuários. Esses fatos teriam que impulsionar o desenvolvimento da engenharia para atender a essas necessidades.
É a partir daí que essa história — a história da engenharia brasileira — ganha ímpeto. E não seria para menos. Desde meados do século anterior, na vigência do Império, o Brasil buscava construir uma cultura técnica mais consistente, formando profissionais na Escola Central, mais tarde Escola Politécnica do Rio de Janeiro; na Escola de Minas de Ouro Preto e, depois, já na fase da República, na Escola Politécnica de São Paulo, fundada por Antonio Francisco de Paula Souza, cujo gabinete da resistência dos materiais deu a partida para o desenvolvimento das pesquisas tecnológicas no Brasil, nessa área. Inegável, nessa trajetória, a valiosa contribuição dos engenheiros militares no fortalecimento da engenharia no País.
Fonte: Revista O Empreiteiro