A floresta se protege com rios profundos, cobras e doenças endêmicas

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Atravessar oito municípios no estado do Amazonas, vencendo grandes trechos de mata fechada, onde é grande a incidência de chuva, o que torna o solo saturado, de difícil acesso e locomoção. Transpor ainda rios com até 60 m de profundidade e áreas onde é grande o risco de doenças endêmicas como febre amarela, malária e dengue. Mais do que as dificuldades comuns às grandes obras de engenharia, esses têm sido os maiores desafios encontrados pelos três consórcios encarregados da construção do gasoduto Urucu-Manaus, um empreendimento que integra o plano estratégico da Petrobras para os próximos 12 anos e que já é apontado como novo marco na historia da engenharia do País.

O projeto prevê a construção de 660 km de dutos, de Urucu a Manaus, e a instalação, em paralelo de uma rede de fibra ótica, que será utilizada para a transmissão dos dados para o monitoramento e controle do gasoduto à distância. O orçamento do empreendimento é de R$ 2,5 bilhões.

Dos 660 km do empreendimento, o trecho Urucu-Coari, de 280 km, já existe e está sendo usado para o transporte de GLP. Mas está sendo adaptado para a movimentação também do gás natural. Já o trecho Coari-Manaus, com 380 km, está sendo construído a partir do zero.

O projeto foi dimensionado para transportar, inicialmente, 4,7 milhões de m3/dia, e suficiente para alimentar usinas termelétricas gerando cerca de 800 megawatts. Essa energia dará para abastecer toda a cidade de Manaus além de outros sete municípios alcançados pelo traçado do gasoduto. Se houver aumento de demanda, a capacidade do gasoduto poderá chegar a 10,5 milhões de m3/dia, bastando para isso que sejam instaladas seis estações de compressão, já prevista no projeto, mas cuja execução ficou programada para uma segunda etapa do projeto.

As obras, iniciadas em julho de 2006 e com previsão de conclusão em dezembro de 2008, estão com 60% de toda a sua programação concluída, de acordo com o engenheiro Mauro Loureiro, gerente de Implantação de Empreendimentos de Engenharia da Petrobras. Em boa parte do traçado, já estão sendo realizados os testes hidrostáticos e teste eletrônico de estanqueidade.

Três consórcios executam os trabalhos, divididos em três lotes. São eles o consórcio Gasam, constituído pelas empresas OAS e Etesco, que tem sob sua responsabilidade as intervenções nos 280 km de dutos, de Urucu a Coari; o consórcio Consag, formado pela Andrade Gutierrez e Carioca Engenharia, com 196 km, entre Coari e Anamã; e o consórcio CGA, integrado pela Camargo Corrêa e a Skanska, com 220 km de extensão, no trecho Anamã-Manaus.

Atualmente, as obras se distribuem em sete grandes frentes de trabalho com um total de 6.400 homens. Os trabalhos estão concentrados na abertura de valas e colocação dos tubos e equipamentos. Foram abertas 30 clareiras para a colocação dos estoques de tubos. Este trabalho foi feito pelo Exército Brasileiro, mediante convênio com a Petrobrás, no valor de cerca de R$ 10 milhões. Além disso, foi feita a compra dos tubos, com um investimento de cerca de R$ 390 milhões. O transporte dos tubos até as clareiras custará cerca de R$ 27 milhões.

Um grande gargalo para o início do projeto do gasoduto era a licença ambiental, com a análise das alternativas de transporte via barcaças, gasoduto ou linha de transmissão. Essa etapa prévia da obra foi iniciada em 2003 e concluída em maio de 2004, com a emissão da licença de instalação pelo Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (IPAAM).

O licenciamento da obra foi feito com base em um EIA-RIMA (Estudo de Impacto Ambiental) elaborado pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM), a partir de audiências públicas em todos os municípios do traçado do gasoduto, com mais de três mil pessoas envolvidas. Esse licenciamento, coordenado pela Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SDS), se tornou referência para obras dessa categoria no Brasil. Com base no licenciamento, foram definidas várias condicionantes, incluindo a construção de ramais secundários para a entrega do gás em todos os oito municípios abrangidos pelo gasoduto.

Além disso, foi acordado ainda um inédito programa de compensações ambientais, que está melhorando a vida de 135 comunidades e dos moradores das sedes dos municípios cortados pelo projeto.

Desafiando a natureza e a cheia dos rios

As maiores dificuldades para a conclusão do projeto são impostas pela natureza da região. Mauro Loureiro conta que boa parte da região a ser cortada pelo gasoduto permanece inundada de novembro, que é quando começa a época das cheias dos rios, até maio do ano seguinte. Nesses períodos, para dar continuidade às obras, é necessário levar seções da tubulação já soldada, sobre balsas, através dos igarapés.

Além das dificuldades causadas pela água, que invade as várzeas, as florestas alagáveis e os igapós, nessa época aumenta expressivamente o risco de ataque por serpentes, que acabam migrando para perto das casas dos ribeirinhos e alojamentos dos operários.

Geralmente, 75% dos casos de picadas na região ocorrem nesse período. Crescem também os riscos de contaminação por doenças endêmicas transmitidas por mosquitos e outros insetos. Para minimizar os riscos, a Petrobras e empresas contratadas têm investido em estratégias preventivas, como vacinação em massa dos operários, borrifação de inseticidas e aplicação do ‘’fumacê’’ nas áreas dos alojamentos.

O engenheiro explica que, devido às acentuadas variações climáticas e características geológicas, diversos métodos construtivos estão sendo empregados, até mesmo para reduzir os impactos ambientais. O principal deles é o da perfuração direcional horizontal, adotado, sobretudo, para a instalação dos dutos em áreas submersas, de forma a evitar a erosão dos leitos dos rios e o entupimento de igarapés.

Esse é o método que está sendo empregado, nesse momento, para a transposição do Rio Solimões, em um trecho com 60 m de profundidade. Para evitar eventuais impactos ambientais, a tubulação está sendo passada a 10 m abaixo do leito do rio, utilizando-se a perfuração direcional horizontal.

Para vencer essa etapa, o consórcio Consag, responsável pelas obras neste trecho, investiu R$ 15 milhões na aquisição de um equipamento de perfuração direcional horizontal (HDD) de última geração, da empresa alemã Herrenknecht. Com capacidade de 250 t, essa máquina realiza furos de até 2,9 km de comprimento, com diâmetro de até 1,20 m, características que atendem às exigências dos trechos de travessias sob rios, igarapés e lagos, que têm extensão máxima de 2 km. Para a operação da máquina, a empresa conta com uma equipe de 85 funcionários, que ficam em barcos atracados na região da perfuração, no sistema 21 x 9.

Além da travessia do Solimões, no lote sob a responsabilidade do Consag, há outras cinco travessias de áreas submersas com duas perfurações: uma de 4” de fibra óptica e a outra de 20” de gás natural. Essas perfurações passam pelos lagos Anamã, Miuá e Coari, pelos rios Badajós e pelo igarapé Maçaranduba.

Quatro delas já foram finalizadas. O trecho sob o rio Solimões está em fase de conclusão de planejamento logístico e executivo e, após a obra, a equipe migrará para o igarapé Maçaranduba, que estará com nível adequado de água para execução do projeto.

Fonte: Estadão


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