A Hulha Branca é nossa !

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Não é preciso ser brasileiro de cultura superior para se sentir indignado com o tratamento dados pelos governantes à nossa “hulha branca”, lançada no “index” dos energéticos nacionais condenada a “viver deitada eternamente em berço esplêndido”. Logo ela, energia limpa, renovável e abundante no país é preterida por outras fontes agressivas ao meio ambiente. Afinal, qual a razão desta postura governamental?

Também não é preciso ser um expert das engrenagens políticas para arriscar uma interpretação, mera resposta que pode não ser a verdade, mas certamente tem componentes preciosos. A má vontade oficial não é contra a energia da água, a hidroeletricidade. É algo mais amplo e complexo. É contra o setor elétrico. Justamente ele, o mais abrangente e eficiente no setor de infra-estrutura do país. Mais de 96% dos domicílios brasileiros têm energia elétrica de boa qualidade, equivalente à de países de primeiro mundo. Que dizer do seu programa de melhoria contínua de qualidade do qual participam todas as concessionárias, sejam estatais ou privadas, com índices sempre crescentes? E o resultado do seu programa de conservação de energia, o PROCEL? Que dizer das suas obras de engenharia e a conservação dos seus ativos físicos ao longo da história ? Faça-se uma comparação do seu desempenho com a de outros serviços públicos.

UHEs projetadas para uma vida útil de 30 anos já operam há mais de 50 com fôlego para outro tanto! Ponto forte também do setor é a sua Agência Reguladora. A Aneel está sempre atenta às reclamações dos consumidores, que têm obrigatoriamente o serviço telefônico 0800 à disposição, além de agências virtuais na internet e de todos os serviços público nacionais, o que tem o maior número de agências de atendimento direto ao cliente. A agencia também avalia periodicamente o desempenho das concessionárias de energia elétrica, através de pesquisa de opinião com os próprios consumidores, cujos resultados influenciam o reajuste da tarifa de energia elétrica da distribuidora. Que outro setor de serviço público tem esta estrutura e competência de ação e fiscalização? As autoridades talvez ainda não tenham percebido de que esse é o modelo de serviço público para o país.

Por outro lado há que se considerar o lamentável êrro estratégico na concepção da “filha” ilustre do setor elétrico, a Eletrobrás. Faltou o charme nacionalista que envolveu o lançamento da sua prima do setor petrolífero, a Petrobrás. Faltou o grito envolvente, libertador: A HULHA BRANCA É NOSSA ! que certamente teria blindado a empresa, transformado-a num símbolo nacional, filha de todos os brasileiros, com reflexos em todo o setor elétrico. Contudo, nem o mais distraído dos brasileiros deixa escapar essa constatação: a falta de prestígio do setor elétrico pode ser sentida em várias fases e episódios da nossa história, embora certamente a mais gritante se deu na recente operação de compra de energia para o mercado futuro.

O desfecho é de conhecimento de todos, e culminou com o último leilão de energia nova, no qual só compareceram usinas térmicas a óleo combustível, comentado com profundo sentido de dor e perda pelo presidente da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Jerson Kelman. “O resultado é negativo ao meio ambiente e reflete o que o país plantou ao não trabalhar para que as hidrelétricas saíssem mais rapidamente”.

Esse mesmo executivo federal apresentou uma proposta ao governo para vencer a resistência da área ambiental nos projetos das hidrelétricas do Rio Madeira. Que se criasse uma comissão de alto nível, indicada pelo Presidente da República, para decidir em favor do interesse nacional supremo. Nem o meio ambiente, nem os desenvolvimentistas, deveriam ter isoladamente a autoridade para decidir, cada um fizesse os seus estudos e os encaminhasse à Presidência da República. Sugestão inteligente, salomônica, de um alto executivo federal que lamentavelmente não recebeu apoio dos seus superiores, que preferiam apoiar, ou como tem sido habitual, resolveram deixar como está para ver como fica. E o que ficou está expresso na manifestação de outro executivo federal, Maurício Tolmasquim, presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE). “O leilão foi um sucesso absoluto, pois contratou 101,8% do previsto pelas distribuidoras!”. O resultado, saudado efusivamente pela EPE, não leva em conta os prejuízos causados ao meio ambiente, que, segundo a Aneel, vão corresponder à emissão de 8,975 milhões de toneladas de gás carbônico no ar. E o presidente da EPE considera o resultado um sucesso!

Sucesso para quem? Só pode ser para os fabricantes estrangeiros dos equipamentos, pela geração de empregos e riqueza em seus países de origem, já que não são fabricados no Brasil, e para produtores de óleo combustível, que vão vender sua produção excedente a um preço maior do que praticam hoje com exportação!

Nenhuma vantagem para o nosso meio ambiente nem para o Brasil, que se vê privado de produzir os equipamentos de pleno domínio de suas indústrias e de aproveitar o seu rico potencial hidrelétrico, do qual só 30% são atualmente explorados, quando países de primeiro mundo que ditam normas ambientais já exploraram todo ou quase todo o seu potencial hidrelétrico, como é o caso da França e da Alemanha, com 100% e 80%, respectivamente.

Onde está a lógica dos ambientalistas? Das autoridades responsáveis pelo desenvolvimento sustentável do país? Com a palavra, o embaixador Sérgio Serra e o físico Luiz Pinguelli Rosa, respectivamente autoridade máxima do governo federal para as mudanças climáticas, e Presidente do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas.

Onde está o Ministério Público, tão presente na defesa do meio ambiente, que não entra com uma ação para anular esse leilão? E a EPE, que deveria ser um contraponto do setor produtivo na análise dos projetos energéticos do país, se deixa dominar pelos ambientalistas e se submete à sua orientação, aceita analisar só os impactos negativos dos barramentos hidrelétricos, como vimos nos recentes seminários organizados por ela, para avaliar os impactos cumulativos e sinérgicos da Avaliação Ambiental Integral (AAI) das bacias dos Rios Doce e Paraíba do Sul.

Análise ambiental já não basta, o mote agora é a AAI, onde todos os impactos e reflexos negativos de um barramento são dissecados; impactos cumulativos e sinérgicos onde só contam os resultados negativos e se omitem os positivos, à exceç&atil

de;o da compensação financeira paga pelas UHE. Como se fosse o único e exclusivo. A riqueza gerada na região, a regularização das vazões, o uso múltiplo das represas, o benefício para o lazer e o turismo, o apoio e os investimentos feitos pelo investidor na região em benefício das políticas públicas de saúde, educação, segurança e infra-estrutura, nada contam. E as PCHs, que não pagam compensação financeira, essas não trazem nenhum benefício? Uma rápida visita à região da Zona da Mata de Minas, onde nos últimos anos foram construídas cinco novas PCHs, vai mostrar uma realidade bem diferente.

A EPE aceita tudo passivamente. Não defende o interesse das empresas do seu setor, que têm tudo documentado e dimensionado para enriquecer os estudos da AAI. O resultado do leilão de energia nova não poderia ser outro. É nesse contexto que saúdo a decisão inteligente do governador Aécio Neves, ao lançar o Programa de Geração Hidrelétrica (PGHMG) 2007-2027, a ser definido pela Avaliação Ambiental Estratégica (AAE), que vai apontar as alternativas prioritárias dos arranjos dos empreendimentos, maximizando os benefícios e minimizando os efeitos adversos das 45 UHE e 335 PCH no contexto de política energética do estado.

As diretrizes do programa estão definidas, oferta de energia com taxa de elasticidade de 40% em relação ao PIB estadual. Isto é, se o PIB crescer 4%, a oferta de energia do Estado tem que crescer 5,6%, sempre 40% acima do PIB. O potencial de eletricidade do Estado é extraordinário e deve ser explorado ao máximo.

E se a AA de uma usina hidrelétrica se mostrar desfavorável, terá que ser confrontada com os efeitos negativos da fonte de energia alternativa que eventualmente venha a ser proposta para substituir o empreendimento condenado. Com isso, o governo de Minas vai evitar o fiasco do último leilão de energia nova do governo federal. Decisão inteligente, pró-ativa, própria dos grandes administradores. É tudo o que pediu o Doutor Jerson Kelman, é tudo o que faria o visionário, grande estadista, médico tocador de obras, promotor do desenvolvimento, o barrageiro JK.

(*) Engenheiro aposentado, com 40 anos de setor elétrico (Cemig, Copel e CFLCL), atualmente presidente do COMPÉ _ CBH dos rios Pomba e Muriaé

Fonte: Estadão


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