A grande novidade da usina é a utilização de dessulfurizadores,
tecnologia que reduz os impactos ambientais da termelétrica
Nádia Fischer
AUsina Termelétrica Candiota III (Fase C), que entrou em funcionamento no início do ano, no interior do Rio Grande do Sul, vai queimar menos carvão para produzir energia elétrica do que as demais térmicas no Brasil. Esta é a expectativa da Companhia de Geração Térmica de Energia Elétrica (CGTEE), empresa operadora da usina. Outra vantagem é que ela possui agora um sistema de tratamento das cinzas e do enxofre liberados na queima do carvão, processo menos poluente e que torna mais eficiente a geração. |
Dados da CGTEE mostram tratar-se da mais moderna termoelétrica movida a carvão. Isso se deve aos dessulfurizadores instalados, ou seja, câmaras que, a partir de um reagente, retém o enxofre liberado na queima do carvão. Um sistema de filtros de alta performance captura as cinzas produzidas. Para se ter ideia, os modelos anteriores eram capazes de reter até 99,4%. Já em Candiota III, é possível captar até 99,9%. Com a tecnologia das cinzas aplicada na usina, a quantidade de enxofre liberado, por exemplo, é quase 80% menor que a das demais usinas brasileiras a carvão.
De acordo com a companhia, a usina termelétrica (UTE) gaúcha utiliza também um processo de queima mais eficiente do carvão. Para a produção de 1 MW/h, são queimados cerca de 900 kg de carvão. As duas plantas mais antigas precisam de 1,15 mil kg para gerar a mesma energia.
Segundo o presidente da CGTEE, Sereno Chaise, que foi prefeito de Porto Alegre e acabou cassado pelo golpe de 1964, a emissão de enxofre na atmosfera – extremamente prejudicial à saúde da população, bem como toda à fauna e flora – está sendo acompanhada pelas quatro estações de monitoramento de partículas inaláveis nas vilas do entorno da Usina de Candiota. “Os equipamentos estão em funcionamento desde abril deste ano, e as medições são divulgadas sistematicamente”, afirma. Ele afirma que em nenhum momento detectou-se índice de emissão fora dos padrões estabelecidos pela legislação.
Também foi criado o Programa de Saúde Vigiar, uma parceria entre a prefeitura de Candiota e a secretaria estadual de Saúde. A partir do programa é possível coletar, analisar e acompanhar a saúde de crianças de zero a cinco anos. O presidente da companhia conta que em análise recente, por exemplo, constatou-se que os problemas respiratórios desta população estão diretamente relacionados às variações climáticas e não a qualidade do ar, pois a região é uma das mais frias do Rio Grande do Sul.
Outras medidas
Em maio, a CGTTE instalou uma estação móvel de monitoramento da qualidade do ar, conforme os parâmetros previstos na resolução n°03/90 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama). “Em operação na Vila Residencial, tem por objetivo avaliar a qualidade do ar no entorno da Usina de Candiota, até a entrada em operação da nova Rede de Monitoramento da Qualidade do Ar, ampliada e modernizada”, acrescenta Sereno Chaise.
Outra medida que também foi colocada em prática, em junho, é o Sistema de Recirculação de Efluentes Líquidos, capaz de reduzir consideravelmente a captação de água junto ao Arroio Candiota. Ao entrar em operação automática de forma definitiva, sem qualquer pendência técnica, é possível recircular mais de 400 m³/h durante 24 horas, em processo automatizado. A redução na vazão de efluente líquido da usina, que retorna ao Arroio, deverá ser tão expressiva, que, segundo a empresa, em alguns momentos será possível até mesmo zerar esta vazão, com o reaproveitamento total do efluente recirculado para a usina.
Em abril deste ano, a CGTEE assinou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), onde assumiu o compromisso de construir um mecanismo de adequação ambiental das atividades do Complexo Termelétrico Candiota. O termo inclui o Projeto de Implantação do Sistema de Abatimento de Material Particulado e SO² da Fase B, chamado de dessulfurizador, até 31 de outubro de 2013, na primeira unidade antiga da termoelétrica, e em 31 de agosto de 2014, na segunda unidade.
Muito além da usina
Candiota III tem capacidade instalada de 350 MW. Destes, são comercializados 292 MW. “A energia é suficiente para atender uma população com cerca de 1 milhão de habitantes com o perfil do consumidor gaúcho”, relata o prefeito do município de Candiota, Luiz Carlos Folador.
Candiota III é a primeira grande transação comercial entre os governos do Brasil e da China. Avaliada em R$ 1,3 bilhão, uma das maiores obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo federal foi construída pela CGTEE com 75% do investimento financiado pelo banco chinês de fomento, o China Development Bank (CDB). Todos os equipamentos usados na usina também são chineses. A previsão de pagamento do investimento é de 10 anos, praticamente o mesmo prazo das demais usinas termelétricas a carvão do país.
Durante o processo construtivo da usina foram contratados cerca de 4.600 operários. Para a operação e manutenção da usina III ainda foi necessária a contratação, por meio de concurso público realizado pela Eletrobrás e CGTEE, de 176 funcionários diretos. Adicionalmente, foram necessários mais 74 postos de trabalho terceirizados (vigilância, limpeza, montagem e desmontagem de andaimes, isolamento térmico etc.), totalizando 250 vagas de emprego.
Para o prefeito Luiz Carlos Folador, hoje, sem dúvida, a usina III de Candiota representa a base da economia da região e um acréscimo em torno de 30% na arrecadação de impostos. “Esta nova fase que está em funcionamento simboliza a retomada do crescimento e desenvolvimento tanto da região quanto de todo o estado gaúcho, cuja economia, por muito tempo, manteve-se estagnada”, diz.
Projeto teve início na década de 80
O projeto de ampliação da capacidade de geração, denominado Candiota III (Fase C), com 350 MW, teve origem em um projeto concebido pelo governo do estado do Rio Grande do Sul no inicio da década de 80, fruto de acordo entre os Governos do Brasil e da França, para incrementar a produção brasileira de energia el&ea
cute;trica a partir do carvão. O projeto original previa a construção de seis unidades geradoras de 335 MW cada.
Em 1981, foram adquiridas partes importantes da primeira unidade, cujos equipamentos e materiais ficaram estocados em depósitos na França por alguns anos. O projeto foi paralisado pelo governo estadual em 1985.
Mais tarde, estudos técnicos desenvolvidos pela CGTEE e Eletrobrás, sob a orientação do Ministério de Minas e Energia (MME), mostraram que a viabilidade da implantação da unidade Candiota III se daria somente num outro formato, como uma unidade única e autônoma, e construída em área contígua ao complexo Candiota (Fases A e B), e ainda, utilizando os equipamentos e materiais já adquiridos.
Mas foi somente em 2006 que o projeto de construção de Candiota III começou a sair do papel. A construção do empreendimento significou a retomada da utilização do carvão na produção de energia elétrica para atendimento do mercado brasileiro, duplicando o consumo deste combustível no estado do Rio Grande do Sul, além de proporcionar um aumento significativo na geração de emprego e renda na metade Sul do Estado. Para a CGTEE, significou também a ampliação de sua capacidade produtiva em cerca de 100%.
Esse vai e vem revela, por outro lado, como a geração termelétrica a carvão não é levado a sério no planejamento energético do País — além de demonstrar a falta de força política dos governos de Santa Catarina e Rio Grande do Sul, os estados produtores deste combustível fóssil.
Fonte: Estadão