Na maior bacia de água doce do mundo, a população de Manaus convive com baixos indicadores de saneamento básico, mesmo depois da privatização da prestação do serviço em 2000. Outras grandes cidades do Norte brasileiro vivem situação alarmante.
*Foto: Manoel Façanha
Embora tenha a menor densidade populacional do País, a região Norte apresentou o maior crescimento populacional entre as cinco macrorregiões brasileiras nos últimos dez anos. Segundo o Censo 2010, o Norte do Brasil atingiu a marca de 15 milhões de habitantes – um crescimento que se deu principalmente em áreas densamente urbanizadas, como Manaus e Belém.
No entanto, os índices sociais de qualidade de vida não acompanharam o crescimento da população. Apenas 3,5% dos municípios da região contam com esgotamento sanitário. Em relação à distribuição de água, os dados mostram a população nortista como sendo a que recebe mais água sem tratamento – mais de 25% da água destinada para consumo humano nessa região não é tratada. Somente 45,3% dos domicílios são abastecidos de água por rede geral.
Há casos intrigantes, como o de Manaus, que se situa na confluência dos rios Negro e Solimões, a maior bacia hidrográfica do planeta. Com uma população em torno de 1,8 milhão de habitantes, a segunda maior cidade do Norte foi a primeira capital no País a privatizar o seu serviço de saneamento.
Em meio a protesto de alguns setores da sociedade amazonense, a Manaus Saneamento, então subsidiária da Companhia de Saneamento do Amazonas (Cosama), foi arrematada por R$ 193 milhões, com ágio de 5% sobre o preço mínimo – embora a empresa fosse inicialmente cotada em R$ 480 milhões –, pela francesa Suez Lyonnaise des Eaux, uma das maiores corporações de serviços de água e esgoto do mundo.
A companhia deixou de se chamar Manaus Saneamento e foi rebatizada para Águas do Amazonas. Em 2007, a Suez Lyonnaise des Eaux desistiu da empreitada e Águas do Amazonas foi incorporada ao grupo brasileiro Soluções para a Vida (Solvi).
Até a privatização do setor, havia apenas 3% de cobertura da rede de esgoto e 76% da rede de água em Manaus. O último levantamento do Instituto Trata Brasil, com as 81 maiores cidades brasileiras (com mais de 300 mil habitantes), aponta que somente 37% do esgoto da população de Manaus é tratado, e outros 23% são coletados.
São indicadores que diferem dos apresentados pelo site oficial da companhia de abastecimento privada, que alegam que 100% do esgoto coletado recebe tratamento, enquanto que o sistema de abastecimento de água atende a mais de 95% da população amazonense.
Neste ano, por recomendação da Agência Reguladora dos Serviços Públicos Concedidos do Estado do Amazonas (Arsam), a Procuradoria Geral de Manaus determinou que a concessionária fosse multada em cerca de R$ 2,3 milhões por descumprimento contratual. Desde 2009, a Arsan fez 50 notificações, 30 advertências e aplicou multas que somam R$ 5 milhões, mas as multas entregues à prefeitura não tinham sido cobradas até então. Agora, o próprio prefeito da cidade, que foi quem autorizou a privatização da ex-subsidiária da Cosema quando governador, disse que romperá o contrato com a empresa.
“Caos”
Além de Manaus, a situação beira a precariedade em outras cidades da região com mais de 300 mil habitantes, como Belém e Ananindeua, no Pará, e as capitais Macapá (AP) e Porto Velho (RO). A capital paraense exibe irrisórios 6% de atendimento com serviço de esgoto.
Já o esgoto dos 379 mil habitantes de Porto Velho não recebe nenhum tratamento. Pelo PAC 1, eram previstos projetos de saneamento básico para a cidade rondoniense. Orçadas em R$ 400 milhões, as obras tiveram início em 2008, mas foram paralisadas após indícios de irregularidades apontados pelo Tribunal de Contas da União (TCU).
“O Norte do País vive um caos em saneamento básico. Não há evolução. As taxas de internação por diarreia na região são 50% maiores do que as apresentadas no Sudeste”, revela Édison Carlos, presidente executivo do Trata Brasil.
Fonte: Padrão