Conservar para longo viver

Planta de beneficiamento da Vale em Nova Lima (MG), uma das grandes obras executadas pela mais longeva construtora mineira

 

Mascarenhas Barbosa Roscoe chega aos 80 anos fiel à filosofia empresarial de seus pioneiros

 

Guilherme Azevedo

 

Nas Gerais, seguro morreu de velho, sô, e canja de galinha cai sempre muito bem à noitinha, na mesa da TFM, a Tradicional Família Mineira, essa instituição tão vigilante da moral e dos bons costumes. Foi o conservadorismo que construiu a riqueza de muito homem mineiro, evitou prodigalidades, desatinos, fez multiplicar o pão, acreditam por lá. O filho pródigo, da Bíblia, não era mineiro, não. E a mais antiga construtora do estado, a Mascarenhas Barbosa Roscoe, é, claro, o baluarte do preceito de apego à tradição, daquilo que só se faz com tudo bem medido, certeiro, sem aventuras, na prudência. Conservadores, graças a Deus.
 

Pois ela chegou agora aos 80 anos, pelas mãos dos sucessores e continuadores da pedra inicial, lançada pela primeira vez em 9 de abril de 1934, em Belo Horizonte, pelos engenheiros mineiros Antônio Mascarenhas Barbosa e João Roscoe. Era a pedra que formava o caminho, que viria a ser longo, não era um estorvo, como no poema de outro famoso mineiro.

 

“Eu sigo os princípios básicos dos fundadores: foco nos clientes e garantia de entrega dos compromissos que assumimos. Tudo com moderação, de ter precaução. Somos conservadores”, posiciona o engenheiro civil Luiz Fernando Pires, o presidente da construtora.

 

A Mascarenhas Barbosa Roscoe hoje soma entre 60 e 70 engenheiros em seu quadro pessoal e entre 3 mil e 4 mil profissionais de mão de obra direta, como carpinteiros e armadores. A direção é compartilhada por Luiz Fernando Pires, que ingressou na empresa em 1994, e o filho Luiz Eduardo Monteiro Pires, também engenheiro civil. Ao pai vinculam-se a controladoria, o departamento jurídico e a ação social; o filho, que é o diretor executivo, responde por toda a parte operacional, que inclui o controle sobre as superintendências de administração, de comércio, de engenharia e de obras.

 

 

O teleférico construído para a Companhia Siderúrgica Belgo-Mineira e fase de execução dele, em João Monlevade (MG)

 

Luiz Fernando Pires, que também preside o Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de Minas Gerais (Sinduscon-MG), se diz homem avesso a complexidades. “A vida é simples, desde que a gente faça da forma simples.” A simplicidade, no dia a dia do comando de uma grande construtora, se materializa na concentração de esforços num segmento específico de atuação, com capacidade de executar com elevada qualidade. A Mascarenhas Barbosa Roscoe se tornou reconhecida no mercado por obras civis industriais, sejam empreendimentos singulares, sejam de grandes complexos.

 

Do ponto de vista do filho Luiz Eduardo, o conservadorismo tão valorizado serve como medida justa na hora de bem escolher os projetos que vai assumir. “Precisamos estar muito tranquilos com nossa capacidade. A grande preocupação é estar sempre avaliando os projetos conforme o nosso tamanho”, explica. “Crescer, sim, mas dentro da capacidade que a empresa permite.” Sapato com número maior ou menor que o pé pode machucar o dono.

 

Dois dos grandes projetos que recebem hoje cuidados das equipes técnicas da Mascarenhas são o de edificação de conjuntos industriais para manuseio de minério de ferro em Itabirito (MG), para a Vale; e a construção de um novo laminador para a ArcelorMittal, em João Monlevade (MG). Em cada um dos projetos estão envolvidos cerca de mil trabalhadores. Os trabalhos para a Vale tiveram início há dois anos e devem terminar até o fim do ano. Na planta siderúrgica da ArcelorMittal, as obras recomeçaram no ano passado, depois de serem interrompidas devido à instabilidade econômica internacional e à redução das encomendas, e devem se encerrar até agosto deste ano.

 

E qual o segredo do sucesso?, perguntamos ao presidente. Luiz Fernando responde com uma citação de Abraham Lincoln (1809-1865), o presidente dos Estados Unidos que marcou a história como exemplo de liberdade e democracia: “Não sei qual o segredo do sucesso, mas o do fracasso é tentar agradar a todos”. O mundo dos negócios é, sim, também feito de escolhas, de decisões.

 

Outro componente que o dirigente da Mascarenhas considera fundamental para a boa saúde da corporação é o de ficar sempre atento às tendências de crescimento do mercado, àquilo que às vezes se mostra muito sutilmente. E, para poder identificar esse movimento, segundo ele, “tem que levantar e ir à luta, ouvir, conversar”. Informação de gabinete não basta.

 

Formar e fidelizar mão de obra

Se a fala do pai tem o ritmo pausado, de rio de planície, a do filho é rápida, de palavras aceleradas, como rio de cordilheira; deve ser coisa da idade, do tempo rápido, da vida ágil e elétrica, dos tempos novos. No caso de Luiz Eduardo Monteiro Pires, envolvido diretamente com a operação diária do negócio, as questões são concretas e urgentes: por exemplo, formar e reter gente. “Recrutar mão de obra hoje é muito mais difícil do que há dez anos”, admite. Isso, identifica, porque a concorrência com outros segmentos da infraestrutura no País tornou-se muito maior. A construtora tem enfrentado a questão por meio de parcerias, entre elas, com o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), e de uma política de benefícios que julga consistente, que inclui participação nos lucros “transparente e justa” e “ambiente de trabalho adequado”.

 

O diretor executivo cita também o constante treinamento da equipe, via workshops e cursos, com temas como negociação e planejamento de obras, em parte das vezes dados pelos próprios profissionais mais experientes da casa, para a transmissão de conhecimentos. “Leva grande tempo para formar mão de obra e não podemos perdê-la”, preocupa-se. “A disponibilidade de mão de obra define a capacidade de crescimento da própria construtora.”

 

Um dos centros de distribuição construídos pela Mascarenhas em Cajamar (SP). Diversificação de negócios

 

O dia a dia de Luiz Eduardo é andar por este País, como na canção de seu xará, Luiz Gonzaga. É preciso acompanhar as minúcias de cada projeto, checar custos e prazos e ajustar processos, conforme o caso. Tudo para que, como diz Luiz Fernando Pires, o pai, os contratos sejam cumpridos pelo preço e prazo que os clientes contrataram, segundo o que foi especificado e ainda com segurança. Como explícito na fala tanto de um quanto na do outro, importa manter relacionamento de longo prazo com os clientes, atendendo-os várias vezes ao longo dos anos. E é bem neste ponto que uma equipe qualificada e motivada faz a diferença, pontua Luiz Eduardo, pois cliente bem atendido retorna. Ele aponta também duas características que favorecem todo o processo interno, com reflexo, claro, no resultado geral dos projetos: a informação fluida, que circula direta e livremente, e a hierarquia pouco rígida.

 

Luiz Eduardo Monteiro Pires, o diretor executivo

 

Hoje o faturamento anual da construtora é da ordem de R$ 500 milhões e os negócios encontram-se divididos basicamente entre os segmentos de mineração e siderurgia. O primeiro responde por cerca de 60% do faturamento e o segundo, por 10% a 15%. Recentemente, conforme a filosofia de observar o movimento do mercado, a construtora diversificou atividades e ingressou no segmento de logística, com a construção de centros de distribuição em Cajamar (SP). O município é estratégico por causa da proximidade com a capital paulista e com importantes ligações rodoviárias, como o sistema Anhanguera-Bandeirantes. Obras públicas são as menos numerosas no portfólio atual da empresa, com 10% a 15% de participação. Entre os grandes e antigos clientes, estão a Vale e a Anglo American (mineração) e a ArcelorMittal (que adquiriu, tempos atrás, um dos mais tradicionais clientes da construtora, a Belgo-Mineira).

 

Futuro

E o futuro a quem pertence? Claro que Deus, na Tradicional Família Mineira, está no comando de tudo. Mas o homem tem de fazer a sua parte, o projeto executivo é nosso. Luiz Fernando Pires se diz otimista com o futuro do Brasil, mas identifica problema grave de gestão. Isso precisa ser melhorado, cobra ele. As oportunidades, observa o executivo, são numerosas, uma vez que temos ainda um outro País a ser construído, com todas as suas demandas de boa infraestrutura, de logística, de energia, de tudo, para nos colocarmos em pé de igualdade em todos os setores, incluindo o humano. “O Brasil precisa de oportunidades, porque tem ainda um grande desequilíbrio social”, defende. “Maior inserção social reforma o contexto político. O crescimento tem de gerar riqueza, uma vez que ninguém mora em favela porque gosta.”

 

Ao segmento de construção como um todo, ele faz um apelo: “Em nossa área, todos temos de fazer a nossa parte. É a nossa obrigação para que o Brasil melhore”.

 

Sim, a nossa geração tem o dever de entregar o País para a próxima melhor do que o recebeu. E a Mascarenhas Barbosa Roscoe do futuro precisa ser ainda mais eficiente do que a de hoje. Longevidade só há com melhoria constante.

 

O percurso da Mascarenhas, através dos anos

9 de abril de 1934

É fundada, em Belo Horizonte, a Mascarenhas Barbosa & Roscoe, pelas mãos de Antônio Mascarenhas Barbosa e João Roscoe.

Janeiro de 1966

Morre Antônio Mascarenhas Barbosa.

1986

Construtora se reorganiza e se converte em sociedade por ações de capital fechado, com a razão social Mascarenhas Barbosa Roscoe S/A Construções.

Anos 1990

João Roscoe deixa a sociedade. Lucas Gonzaga Viana, sobrinho de Antônio Mascarenhas Barbosa, assume a gestão da construtora.

Julho de 1994

O engenheiro e investidor Luiz Gonzaga Quirino Tannus adquire o controle da construtora e nomeia o engenheiro Luiz Fernando Pires para a direção executiva.

Setembro de 1999

O engenheiro Tannus transfere o controle da Mascarenhas para Luiz Fernando Pires.

2011

O engenheiro Luiz Eduardo Monteiro Pires, filho de Luiz Fernando Pires, ingressa na direção executiva e assume o trabalho operacional da construtora. O pai segue como presidente.

2014

Em 9 de abril, a construtora mais longeva de Minas Gerais chega aos 80 anos.

 

Fonte: Livro Mascarenhas Barbosa Roscoe – 80 anos: Estamos em obra sempre

 

Oito décadas de grandes obras

 

Hospital Colônia São Francisco de Assis Bambuí (MG), 1936

Primeiro contrato com o governo estadual. Projeto incluiu a execução do hospital e dos anexos dele, como residências, farmácia e escola.

 

Sistema de águas pluviais da Belgo-Mineira João Monlevade (MG), 1941

Foi a primeira obra industrial executada pela Mascarenhas. Construído com concreto armado, sistema coletou e canalizou águas pluviais da usina da Belgo-Mineira.

 

Teleférico para transporte de carvão da Belgo-Mineira João Monlevade (MG), 1958

Com 52 km de extensão, teleférico linear conduzia carvão para a usina no município. Execução do projeto durou dois anos e se encerrou em 1960.

 

Criação da infraestrutura de Brasília (DF) a partir de 1965

A infraestrutura para a nova capital federal, inaugurada em 1960, teve a participação da Mascarenhas nos anos 60 e 70, a partir da execução de estação de tratamento de água.

 

Unidade pelotizadora da Samarco Anchieta (ES), 1973

No complexo para processar minério de ferro de Mariana (MG), a Mascarenhas executou pelotizadora para 5 milhões de t. Foram consumidos 47 mil m3 de concreto.

 

Galpões industriais para Albras Barcarena (PA), 1988

A Mascarenhas construiu galpões e edifícios industriais das instalações da Alumínio Brasileiro S/A. A dificuldade maior foi a de logística, dado o isolamento do sítio.

 

Instalações do Carrefour em BH Belo Horizonte (MG), 1997

Execução da maior loja do Carrefour na América Latina, na capital mineira. As instalações, com 65 mil m2 de área construída, foram entre
gues em seis meses.

 

Planta de beneficiamento da Vale Nova Lima (MG), 2011

Nova planta possibilitou o exercício da inovação em engenharia, com a Mascarenhas executando estruturas pré-moldadas com o auxílio de formas deslizantes.

 

Fonte: Livro Mascarenhas Barbosa Roscoe – 80 anos: Estamos em obra sempre

Fonte: Revista O Empreiteiro

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