Debate sobre o gerenciamento e a fiscalizaçãodo tráfego rodoviário se destaca em encontro do setor
Carlos Brazil
As novas tecnologias incorporadas aos sistemas de controles das rodovias vêm contribuindo para a modernização da malha viária nacional. No entanto, questões legais e regulatórias, falta de recursos para investimentos e deficiências na participação de autoridades públicas para garantir os controles necessários à segurança e à boa gestão das rodovias têm impedido que órgãos gestores e concessionárias utilizem algumas das mais recentes, eficientes e avançadas ferramentas de controles já disponíveis no mercado.
Essa é uma das principais conclusões a que chegaram empresários, autoridades, gestores, técnicos e estudiosos do tráfego rodoviário que participaram do 8º CBR&C – Congresso Brasileiro de Rodovias & Concessões e da 8ª Brasvias – Exposição Internacional de Produtos para Rodovias, realizados pela Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR) em agosto, em Santos (SP).
Pedro Luiz Donda, presidente da STP, que administra o sistema de cobrança de pedágio em movimento Sem Parar, afirmou durante o evento que o grande desafio para concessionárias e empresas que atuam no segmento é virtualizar as praças de pedágio, com a eliminação das barreiras físicas, para garantir o pagamento de pedágio sem afetar a fluidez do tráfego.
“Mas como lidar com a liberdade proporcionada pela eliminação das praças de pedágio, já que a tendência é haver mais fraudes?”, questiona o executivo. “É necessário contar com uma fiscalização eficiente para coibir a evasão e as fraudes, valorizando a contribuição dos que pagam pedágio para utilizar nossas rodovias”, afirma.
Segundo Donda, para fazer valer o direito de todos, é preciso reforçar a legislação, com dispositivos legais e regulamentares específicos para a cobrança de pedágio, adotar sistemas eficazes de fiscalização e punição de infratores com a devida presença ostensiva da autoridade pública para autuar e coibir faltas, garantir a regularização da frota nacional, além de investir em educação e formação cidadã.
Apesar de considerar essencial o reforço na fiscalização com a garantia da presença mais constante da autoridade pública para inibir e punir infratores das regras de tráfego, o presidente da ABCR, Moacyr Duarte, considera que o Brasil tem boas experiências. Ele cita o caso da Agência de Transporte do Estado de São Paulo (Artesp), que coloca em prática um projeto piloto de cobrança de pedágio por trecho percorrido, com o uso de equipamentos eletrônicos de identificação veicular (tags). Outro exemplo é o Sistema Nacional de Identificação Automática de Veículos (Siniav), do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), que prevê o emplacamento eletrônico de toda a frota nacional até junho de 2015, o que permitirá o uso do sistema para cobrança de pedágio em fluxo livre (oufree flow, em inglês).
“A experiência de São Paulo vale mais como teste de tecnologia, e está sendo realmente positiva. Mas ainda temos muito a percorrer”, afirma Moacyr Duarte.
Siniav
Roberto Craveiro Rodrigues, coordenador-geral de Informatização e Estatística do Denatran, falou sobre a implantação do Siniav e deu detalhes de como empresas podem vir a utilizar o sistema para gerir a cobrança de pedágio.
De acordo com o técnico, as concessionárias ou empresas interessadas em receber informações do sistema sobre a passagem de veículos para a gestão de cobrança de pedágio deverão firmar acordos com o Denatran e terão acesso a dados básicos sobre o veículo que cruzar pórticos de identificação, desde que o proprietário do mesmo permita expressamente essa condição.
O Siniav prevê, em uma primeira fase, a implantação das placas eletrônicas de identificação (tags) em toda a frota do País, pelos Detrans (Departamentos de Trânsito) estaduais e do Distrito Federal, até junho de 2015. Em um segundo momento, serão instaladas as antenas (ou pórticos) de controle, conforme sejam firmados convênios com governos locais, órgãos, entidades e empresas interessadas em utilizar o sistema.
“O sistema permite a identificação de veículos irregulares, roubados, sem licenciamento ou com restrição de circulação, por exemplo”, indica Roberto Rodrigues. Além disso, o Siniav vai gerar dados estatísticos completos, que ajudarão no planejamento e gerenciamento do tráfego urbano e rodoviário.
Ponto a Ponto
A Artesp está implementando, desde 2011, o Ponto a Ponto, sistema de cobrança de pedágio adotado para proporcionar justiça tarifária em São Paulo. O assessor de Tecnologia da Informação da Artesp, Giovanni Pengue Filho, explica que o Ponto a Ponto funciona com base no sistema fluxo livre (free flow), e seus principais objetivos são: trazer mais eficiência ao sistema eletrônico de cobrança de pedágio; ampliar o número de usuários pela cobrança mais justa; e promover a justiça arrecadatória com tarifas aplicadas conforme o uso efetivo.
Ele explica que o Ponto a Ponto está sendo testado em trechos de três rodovias: em Itatiba, na SP-360 – Rodovia Engenheiro Constâncio Cintra; em Indaiatuba, na SP-75 – Rodovia Santos Dumont; e em Jaguariúna, na SP-340 – Rodovia Adhemar Pereira de Barros.
Pengue Filho afirma ainda que, apesar de a praça de pedágio continuar a existir para evitar evasão, esse modelo permite racionalizar o uso da rodovia. “Apuramos que, em Itatiba, usuários que evitavam a rodovia para não pagar pedágio aderiram ao sistema de pagamento por trecho percorrido”, lembra.
Excesso de peso
Outra importante discussão que centralizou as atenções dos participantes do CBR&C 2013 foi a relacionada à necessidade de reforçar os controles sobre o excesso de carga carregado por caminhões e carretas pelas estradas brasileiras.
De acordo com estudo do professor João Fortini Albano, da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), se toda a rede pavimentada brasileira (que soma quase 220 mil km de extensão) estivesse protegida por sistemas de pesagem de veículos de carga, as diferentes esferas de governo deixariam de gastar mais de R$ 2 bilhões por ano para sanar problemas ocasionados por excesso de carga.
Durante a CBR&C, especialistas de vários países falaram sobre as experiências para implementar sistemas eficientes de controle de peso. É o caso de Bernard Jacob, vice-diretor do Departamento Científico do instituto IFSTTAR, da França, que tratou da experiência de seu país no controle da sobrecarga na pesagem em movimento.
O especialista destaca que o sistema utilizado em rodovias francesas tem gerado resultados com ótima precisão. Ele funciona pela utilização de uma rede de pórticos eletrônicos que apuram o peso dos veículos por eixo em plena rodovia. Caso haja sobrecarga, os pórticos registram a placa do veículo, que é encaminhado por autoridade rodoviária à pesagem estática para apuração do eventual problema. O sistema evita a necessidade de pesagem de todos os veículos de carga e propicia que a quase totalidade dos veículos parados acabe sendo flagrada com carga acima do permitido.
De acordo com Nicholas Wilks, diretor da norte-americana Kistler, o sistema eletrônico de pesagem em movimento que usa a tecnologia Quartz Lineas tem eficácia comprovada de mais de 95% das pesagens realizadas em alta velocidade. O sistema permite, inclusive, cobrança de pedágio por peso carregado pelos veículos, o que é considerado outro fator de justiça tarifária.
Na Austrália, a experiência em adoção é o controle de peso embarcado nos próprios veículos, de acordo com Chris Koniditsiotis, CEO da Transport Certification Australia.
O problema é que, no Brasil, pelo menos entre as rodovias federais vinculadas ao Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), a realidade da pesagem em movimento ainda é distante. Segundo Romeu Scheibe Neto, coordenador-geral de Operações Rodoviárias do órgão, a futura rodada de licitações para a instalação de praças de pesagem do atual Plano Diretor Nacional Estratégico de Pesagem prevê apenas o uso de sistema de aferição de peso por balanças tradicionais, que exigem a passagem dos veículos por uma área ao largo das pistas de rodagem.
“Esse é um problema sério”, afirma o presidente da ABCR sobre a questão do excesso de peso dos veículos de carga. “Você tem de fiscalizar com eficiência para garantir que o caminhão entre na praça de pesagem, precisa contar com um policial rodoviário a postos para induzir o caminhão a entrar… Precisaríamos que o serviço de pesagem funcionasse 24 horas por dia. Afinal, quem pode aplicar multas por evasão é o poder público. A concessionária pode apenas disponibilizar os equipamentos de controle”, diz.