Há alguns dias noticiou-se que empreendimentos do governo são responsáveis pelo desmatamento de áreas que somariam 730 km². Para ter-se uma ideia do que essa metragem representa, o exemplo mais concreto é o seguinte: ela corresponderia à metade da área do município de São Paulo, conforme salientou a notícia.
Mas o que provocou natural preocupação não foi apenas aquele número, que até pode ser maior ou menor, mas a constatação de que o desmatamento ocorreu dentro da legalidade. Ele resultou de 155 autorizações expedidas para aquele fim, em um período de três anos.
Foram liberações para desmatar áreas na Amazônia e nas regiões do cerrado e da caatinga. No rastro das árvores abatidas começariam a ser construídas usinas hidrelétricas, abertas rodovias e previstos traçados ferroviários. Seria o progresso comandando o sacrifício, como tem acontecido desde que o mundo é mundo, só que em escala avassaladora.
Mas há alguns argumentos para reflexão nessa história. Teoricamente, dentro da legalidade, o desmatamento impõe uma contrapartida: o plantio de uma área equivalente à sacrificada. Só que o governo que sacrifica, não fiscaliza se estaria ocorrendo a contrapartida.
Então vem a indagação: Se, para o desmatamento legal, não há fiscalização suficiente, como fica, então, o desmatamento ilegal?
Conforme diz J. M. Coetzee, em seu Terras de sombra: "Não vivemos mais lavrando a terra, mas devorando-a".
Fonte: Estadão