Embrapa à frente para conservar a variedade de espécies

Compartilhe esse conteúdo

A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) vem estudando o manejo e conservação dos recursos genéticos em várias regiões do País, onde mantém bancos de plantas ativos de germoplasma. No Amazonas, a Embrapa Amazônia Ocidental mantém dez Bancos Ativos de Germoplasma onde estão caracterizadas amostras de vegetais importantes para a região visando preservar a ampla variedade genética desses materiais para estudos.
Os Bancos Ativos de Germoplasma (BAG) tem o objetivo de manter amostras de diferentes espécies acessíveis à pesquisa. Além disso, eles possibilitam investigações para a melhoria das variedades de plantas, tanto no aumento de produtividade como na resistência às doenças e benefícios alimentares.
O chefe de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Amazônia Ocidental, Celso Azevedo, explica: “Um BAG é constituído em longo prazo, portanto, é uma infraestrutura permanente, um patrimônio, que promove inovação, agregação de valor que disponibiliza germoplasma para programas de melhoramento genético, fitotecnias, biotecnologia e inclusão socioeconômica”.
O pesquisador detalha a iniciativa: “Entre os BAGs, existem acervos exclusivos de plantas de extrema importância para a biodiversidade. O banco de germoplasma do guaraná (Paulínia cupana var.sorbilis), por exemplo, é o único do mundo e está no Amazonas. É um importante patrimônio uma vez que não há registros da ocorrência de populações naturais de guaranazeiro em outras regiões do País. Já os bancos de dendê (Elaeis guineensis) e de caiaué (Elaeis oleifera) da Embrapa Amazônia Ocidental são os mais completos mantidos no continente americano. A diversidade dessas palmeiras de óleo já permitiu o desenvolvimento de cultivares altamente produtivos e com padrão de qualidade reconhecido internacionalmente”.
Na região, a Embrapa também mantém bancos genéticos com variedades de cupuaçu (Theobroma grandiflorum), de mandioca (Manihot esculenta), de plantas medicinais, aromáticas e condimentares, de fruteiras tropicais, que incluem espécies exóticas e nativas da Amazônia, coleção de espécies florestais, de pupunha (Bactris gasipaes) e de Croton sp. e Arrabidaea sp. O BAG de cupuaçu reúne variedades desse fruto coletadas e mantidas em todos os estados da região amazônica. Esses materiais são utilizados no programa de melhoria genética do cupuaçuzeiro e permitem o desenvolvimento de clones com alta produtividade, além de produtos regionais que movimentam a economia.                                                                                                                           
Edson Barcelos, engenheiro agrônomo que coordena o Programa Nacional de Pesquisa de Dendê e de Projetos de Pesquisas com Melhoramento Genético e bancos de germoplasma afirma que todas as pesquisas estão centradas nos recursos naturais renováveis visando sustentabilidade. “Na natureza, você retira e espera que ela reponha o quanto você retirou, para poder retirar de novo. Todo o segredo da sustentabilidade consiste em manter o equilíbrio e só extrair da melhor forma, sem perdas, aquela quantidade que a natureza, o sistema consegue repor ou consegue recuperar”, expõe. Para manter esse equilíbrio na natureza são necessárias pesquisas já que tradicionalmente na Amazônia o homem vem retirando mais do que repondo.
Ele lembra que os bancos ativos de germoplasma são locais onde se reúnem diferentes tipos e formas de uma espécie de potencial e/ou de valor econômico, sobre as quais se conduzem pesquisas de melhoria genética, buscando desenvolver materiais genéticos (variedades, híbridos, clones, linhagens etc.) melhores adaptados às diferentes condições de seu cultivo, apresentando características de interesse comercial e de diferentes usos. “Não existindo pesquisas, não tendo um programa de melhoramento genético, o Banco de Germoplasma não tem função. Tecnicamente o termo Banco de Germoplasma não se aplica ou se destina à conservação ou preservação da biodiversidade e sim à conservação e ao uso da variabilidade genética para fins comerciais, de uma dada espécie de valor comercial e espécies afins ou aparentadas”, explica.
  
MANEJO SUSTENTÁVEL
COM BENEFÍCIOS AMBIENTAIS

   Em outra vertente de pesquisa, o cientista Leandro Ferreira, especialista em Manejo Florestal do Museu Emílio Goeldi, indica ainda outros ganhos na exploração dos recursos da Amazônia, com conquistas ambientais e sustentabilidade. Ele cita: “A exploração da madeira de baixo impacto com plano de manejo permite a extração de madeiras comerciais preservando grande parte da estrutura da vegetação, pois essa exploração é feita com modernas técnicas de manejo, como o corte de cipós que impede a queda de várias árvores, a escolha de somente poucas espécies por hectare e o arraste de troncos em locais pré-definidos. Essas técnicas permitem que o manejo florestal seja uma atividade econômica e ambientalmente sustentável”.
  
VONTADE POLÍTICA PARA PROTEGER O PATRIMÔNIO DA AMAZÔNIA
Os cientistas que estudam a Amazônia alertam que há outros pontos ainda a se levar em conta. O físico Ennio Candotti, que foi duas vezes presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e hoje é diretor do Museu da Amazônia, lamenta a falta de decisão política para atuar na região. “Deve-se tomar a decisão política se há interessa em conhecer o patrimônio de biodiversidade que se encontra na região. Em caso positivo, devem ser criadas instituições e formados quadros capazes de transformar o conhecimento difuso em conhecimento sistemático, por vezes útil para desenvolver produtos em outras áreas, propiciar novos conhecimentos. A soberania sobre o patrimônio genético  que as convenções internacionais atribuem ao Brasil e à Amazônia somente pode ser exercida se conhecermos de que se trata este
patrimônio, objetos, plantas, processos, microorganismos, conhecimentos tradicionais, recursos minerais, águas, florestas etc. A Embrapa, por exemplo, dedica à região menos de 10% de seu orçamento”, relata.
E continua Ennio Candotti: “Hoje, pouco ainda se fez e os institutos in
stalados cobrem menos de um centésimo do que seria necessário para dizer quais as dimensões deste patrimônio. Para dar uma ideia, 70% dos artigos científicos e patentes sobre produtos e processos da região são realizados por instituições estrangeiras. O Centro de Biotecnologia da Amazônia (CBA) aguarda das autoridades federais e do Estado há mais de 10 anos uma definição formal para existir e funcionar. Um escândalo pouco divulgado.”

O Centro de Biotecnologia da Amazônia (CBA) aguarda das autoridades federais e do Estado há mais de 10 anos uma definição formal para existir e funcionar. Um escândalo pouco divulgado.

CONSTRUIR INFRAESTRUTURA SEM
DILAPIDAR O PATRIMÔNIO FÍSICO

Para o cientista Candotti, é necessária uma solução inovadora na construção de infraestrutura. “A engenharia pensada e desenvolvida no centro-sul do País não serve para a região amazônica. É uma engenharia do asfalto ou do cimento. É preciso implantar uma engenharia nova aqui, que estude os sistemas de transporte fluvial, as comunicações em atmosfera úmida, a mecânica de fluidos, a construção flutuante, as fontes de energias alternativas: solar ou que explorem a correnteza do rio. Não adianta trazer soluções que precisam de ar condicionado para funcionar. Até a agricultura é diferente, mas… quantos centros da Embrapa existem por aqui?  Existe o centro do feijão? Não  existe o do Açaí… Isso está sendo feito, mas muito lentamente, em ritmos que exigem 50 anos para amadurecer. Dilapidar o patrimônio será predominante enquanto a Amazônia for pensada como fonte de energia hidroelétrica barata, corredor para o Pacífico, província mineral”, discorre.
O pesquisador Leandro Ferreira, do museu Emilio Goeldi, acredita que é necessário estudar bem a região para implantar a infraestrutura e manter o patrimônio. “A implantação de infraestrutura gera impactos ambientais, econômicos e sociais em qualquer lugar do mundo, e na Amazônia não é diferente. O que ocorre aqui é que a implantação dessa infraestrutura normalmente é feita sem que os estudos de impactos ambientais sejam adequadamente realizados. A construção de estradas nas décadas de 60 a 80 permitiu a comunicação via terrestre da Amazônia com outras regiões do Brasil. Contudo, o custo social e ambiental foi muito maior do que os benefícios dessa comunicação”, lembra.

A construção de estradas nas décadas de 60 a 80 permitiu a comunicação via terrestre da Amazônia com outras regiões do Brasil. Contudo, o custo social e ambiental foi muito maior do que os benefícios dessa comunicação.

Estudos científicos têm demonstrado que mais de 80% do desmatamento na Amazônia estão concentrados nas margens das principais rodovias e estradas vicinais associadas a estas. “Grande parte dessas rodovias foram planejadas para permitir a colonização rápida da Amazônia, possibilitando que migrantes de outras regiões pudessem chegar na região. Atualmente, as melhorias de infraestrutura de estradas estão associadas à necessidade de escoamento da produção de commodities agrícolas e minerais, e não estão ligadas a uma política de melhorar essa infraestrutura para que os colonos vindos de outras regiões, e os que aqui sempre viveram, possam escoar a produção da agricultura familiar para os centros comerciais das cidades. Essa é a questão principal que deve ser estudada: a implantação de  infraestrutura na Amazônia não tem sido para o desenvolvimento da mesma, mas sim para permitir uma exploração mais rápida e eficiente dos recursos naturais desse território”, finaliza.

 

Fonte: Padrão


Compartilhe esse conteúdo

Deixe um comentário