Washington, capital norte-americana, já tem prazo para se livrar das enchentes de verão que ocorrem há décadas. O ambicioso
programa de obras é fruto de mobilização popular e ações legais impetradas na Justiça.
Mesmo nos Estados Unidos, o fato de que existe uma lei federal, como a Clean Water Act — Lei de Água Limpa —, não foi suficiente para que obras fossem feitas para acabar com as históricas enchentes de verão em Washington D.C. Em 2005, finalmente, a agência ambiental federal (EPA) baixou decreto estabelecendo as medidas que o organismo local, DC Water, teria que tomar (incluindo obras) para se adequar aos padrões mandatórios de qualidade da água, dentro de um cronograma de 25 anos e ao custo de US$ 2,6 bilhões.
A região tem 158 km² que costumam alagar, entre os rios Potomac e Anacostia, recebendo 11 bilhões de l d’água que extravasam da rede de esgotos numa estação chuvosa. Essa mesma rede capta as águas pluviais. Esse fenômeno se repete numa média de 180 vezes ao ano.
O decreto é resultado de ações civis impetradas por grupos ambientais, entre eles o conhecido Sierra Club, comunidades da região e cidadãos comuns que queriam se livrar das inundações — e estavam fartos da inação governamental. Depois de anos de litigação, um primeiro acordo foi alcançado entre as partes em 2003, que resultou no decreto federal dois anos depois.
O programa de obras ao longo de 25 anos prevê a escavação de vários túneis para acumular 730 milhões de l de água de chuva; um reservatório de clarificação avançada na ETE Blue Plains e melhorias das estações de bombeamento. O primeiro túnel, Blue Plains, de 8 km e 8,5 m de diâmetro, já foi concluído. O distrito de Columbia tem 640 mil habitantes, que se soma aos 1,6 milhão de pessoas das cidades vizinhas.
Antes de iniciar as obras, a agência DC Water contratou as empresas de consultoria Greeley & Hansen para estudos hidráulicos e a McMillen & Jacobs para os túneis, buscando ao mesmo tempo processos mais eficientes de contratação para esse conjunto complexo de obras. Essas duas consultorias se associaram para formar a gerenciadora do projeto chamada DC Water Clean Rivers, que definiram os elementos-chave para a construção do empreendimento: controles de orçamento e custos, datas imperativas em metas a serem cumpridas no cronograma, segurança técnica na execução da obra, impactos sobre comunidade, estimulo à concorrência entre as construtoras interessadas para gerar propostas competitivas e seguro garantia para conclusão das obras.
O envolvimento o quanto antes das construtoras a serem contratadas era vital, e isso foi feito através de um workshop de imersão de dois dias. A DC Water optou pela modalidade projeto + construção para executar os túneis. Cada pacote foi oferecido para três consórcios previamente qualificados para propostas técnicas e de preço, com peso de 65% para preço e 35% para técnica. Cada consórcio perdedor recebia cerca de US$ 475 mil em compensação financeira pela proposta apresentada, que passava a ser propriedade da agência. Para liderar o projeto, DC Water contratou um experiente engenheiro, Carlton Ray, como diretor, com poderes para gerenciar conflitos e prevenir embates legais, e que atuou num projeto de magnitude e engenharia similar em tempos recentes.
A gerenciadora realizou uma intensa mobilização prévia nos meios de engenharia durante seis meses, incentivando discussões técnicas sobre as etapas essenciais das obras – como os poços verticais, antes de se iniciar o processo de pré-qualificação das construtoras para licitação. Houve retorno palpável como a proposta do consórcio Traylor Skanska Jay Dee, que em conjunto com a projetista CH2M, sugeriu posicionar os poços de drenagem e peneiramento na forma de 8.
Essa solução só foi possível porque construtoras e projetista trabalharam numa só equipe. Por causa das condições de solo,diâmetro dos poços e as paredes escavadas, os trabalhos seriam executados no limite dos equipamentos e tecnologia disponíveis no mercado — o principal deles é uma TBM projetada sob medida de 133 m de comprimento, para escavar os túneis.
Os poços medem 55 m de profundidade, com paredes diafragma compostas, e lajes de fundo tipo domo invertido de até 8 m de espessura e impermeabilizadas. Ao posicionar dois poços como o número 8 tornou desnecessário o túnel de conexão na base deles, que era considerada escavação de alto risco. A TBM operou no subsolo sem incidentes significativos e a obra toda acumulou 1,6 milhões homens-hora sem acidentes com afastamento.
À execução do túnel Blue Plains seguiu-se a escavação do túnel Anacostia, pelo consórcio Impregilo Parsons, e do túnel First Street, pelo consórcio Skanska Jay Dee. Os túneis Northern Boundary e Potomac River estão na etapa final das obras. A agência federal EPA autorizou que o túnel de conexão entre os dois poços fosse substituído por ampla infraestrutura verde na superfície, como pistas e faixas de estacionamento permeáveis nas vias públicas, além de floreiras e áreas verdes que se destinam a reter a água das chuvas.