A contagem regressiva para a Copa do Mundo de 2014, com os dias pingando do calendário, mostrando que a cada 24 horas o prazo fica mais curto para a conclusão das obras em andamento e a elaboração de projetos de outras que sequer foram iniciadas, expõe uma realidade que começa a provocar profundas preocupações pelo País afora, e em alguns estados, em particular.
Necessário reconhecer que algumas obras, sobretudo aquelas das arenas esportivas, estão avançando. Outras marcam passo, como se o prazo não devesse ser encarado com o rigor imposto pela Federação Internacional de Futebol (Fifa). Em alguns estados, amplia-se a distância entre as obras efetivamente em andamento nas arenas, e aquelas necessárias para a mobilidade urbana.
É como se uma coisa nada tivesse a ver com a outra e os acessos de repente pudessem ser resolvidos num passe de mágica, sem a intervenção das empresas de consultoria de projeto e o trabalho das construtoras. Em alguns casos, dos quais esta revista tem sido testemunha, técnicos com maior senso de responsabilidade chegam a indagar: “E os projetos? Onde estão os projetos?”
Com os sobressaltos ocasionados pelo prazo em algumas obras, de um lado, e, de outro, com a tranquilidade inconsequente dos que acham que as coisas se ajeitarão espontaneamente no momento oportuno, o fato é que os problemas da infraestrutura necessária para garantir o êxito da Copa e, depois, da Olimpíada de 2016, no Rio de Janeiro, prosseguem os mesmos.
Os aeroportos continuam precários, com banheiros acanhados nas alas nacionais ou internacionais; áreas de check-in superlotadas, com usuários atônitos; e os setores para desembaraçar bagagens, assoberbados, provocando traumas e perda de tempo, configurando, na prática, aquilo que o arquiteto Leon Myssior, do Sinaenco-MG, chamou apropriadamente de “rodoviária de avião”.
As dificuldades se acumulam nos acessos, tanto a aeroportos, portos e a estádios, com obras que ainda não começaram por conta de pendências com desapropriações, ajustes técnicos nas especificações para elaboração de editais para a construção de viadutos e mudanças de traçado para ampliação de pistas e conexões. Enquanto isso, empreendimentos prioritários, a exemplo da extensão de linhas de metrôs para aeroportos, são negligenciados em favor de obras megalomaníacas, sem amparo na realidade econômica atual do País.
É inaceitável que metrópoles como São Paulo, Rio, Belo Horizonte, Salvador e outras mais não contem com serviços de metrô em seus aeroportos, disponibilizando apenas volume insatisfatório de táxis e ônibus para o transporte de passageiros no dia a dia, o que pressupõe a previsão de uma situação conflituosamente insustentável nos períodos de grande demanda, que se aproximam.
Mas há um fato inconteste: os investimentos inicialmente previstos para os gastos oficiais com a Copa, calculados em R$ 33 bilhões, já aumentaram exponencialmente, antes mesmo das obras necessárias serem entregues ou iniciadas.
Além deste, há outro pormenor que tem chamado a atenção de técnicos em geral e de moradores das metrópoles citadas: o descalabro e a absoluta negligência às operações de manutenção aos equipamentos de transporte disponíveis. Queremos nos referir, especificamente, ao caso do histórico bondinho de Santa Teresa, no Rio de Janeiro, que por falta de uma simples manutenção de rotina, ganhou velocidade na descida do bairro, descarrilou, provocou seis óbitos e deixou 56 passageiros feridos. A culpa, como invariavelmente acontece nessas situações, jamais é atribuída à autoridade maior, mas ao motorneiro de plantão.
A observação que a população tem feito, ao analisar com muita simplicidade os aspectos aqui exposto, pode ser resumida na seguinte frase: “Quem não sabe cuidar de um bondinho, como é que pretende construir e cuidar de um TAV?”
Fonte: Estadão