E lá vem um contêinere, depois mais um e mais outro, desembarcados no porto de Suape, todos entupidos de lixo hospitalar. Causa surpresa saber que esse lixo chega importado dos Estados Unidos por loja de tecidos do interior pernambucano, que recebe lençóis sujos de sangue e outras peças, misturadas com seringas, máscaras, luvas cirúrgicas, cateteres e gaze.
Feita a triagem e posteriormente submetida a algum tipo de limpeza, a roupa é depois comercializada, mas conservando graves riscos de contaminação. Pode provocar doenças de pele e outros males transmissíveis pelo sangue. A hepatite, por exemplo. É a morte chegando em contêineres.
Mexe no fundo da consciência saber que tanto lá, nos Estados Unidos, quanto cá, no Brasil, se permite crime dessa dimensão e natureza. E que ele continuaria a ser cometido, não fosse a ação da Receita Federal, que agora, a partir de laudo a ser fornecido pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), poderá cuidar das medidas judiciais cabíveis.
Mas, convenhamos: o que se pode esperar, do ponto de vista de consciência, quando outro tipo de crime, como as mortes programadas, cronometradas, medidas e pesadas sob a égide dos aperfeiçoamentos tecnológicos, é deflagrado de lá para outros países?
O Brasil já tem o seu próprio lixo, que não é pouco. Em muitos casos, não sabe o que fazer com ele. A rigor, deixa-o à solta, nos rios e lagoas. Às vezes em campo aberto, à margem de estradas, nas periferias das cidades, debaixo de shopping centers ou sob conjuntos residenciais.
Lixo hospitalar tem sido encontrado nas ruas e em cursos d´água. Que o diga, com sua voz forte, aos que têm capacidade de ouvi-lo, o velho Chico. Sim, o rio São Francisco, que vai tangenciando as cidades que se nutrem de suas riquezas e que, no entanto, despejam dentro dele, em contrapartida, toda sorte de podridão, incluindo lixo hospitalar. O Brasil está mal no mapa do saneamento. E, possivelmente por isso, achem que ele possa receber assim, passivamente, o esgoto criminoso que vem de fora.
Fonte: Estadão