Relatório especial da revista britânica The Economist sobre a economia mundial, publicado na edição de 11 de outubro último, traz o sugestivo título “When fortune frowned” – algo como “quando a sorte virou…” Nesse trabalho, o editor Zanny Minton Beddoes afirma que a pior crise financeira desde a Depressão de 1929 está redefinindo os limites entre governo e mercados e coloca algumas questões instigantes:
-Até onde o mercado financeiro deve ser re-regulamentado?
-As lições a serem aprendidas com a volatilidade dos preços dos commodities;
-Os bancos centrais contribuíram para a crise global atual. Eles terão competência para limpar a sujeira?
-As economias emergentes vão mudar a configuração da finança global?
-As ameaças contra o livre comércio, após a rodada Doha
-Em lugar de um novo modelo de capitalismo, o que o mundo precisa é de uma nova Multilateralidade
Paul Vocker, que foi presidente do FED americano (Federal Reserve System), disse recentemente: “Por todos os seus talentosos participantes, sempre recompensados regiamente, o novo e exuberante sistema financeiro fracassou no teste real de mercado”. Outra crítica da revista: as novas finanças são altamente alavancadas, superficialmente regulamentadas, e criaram um sistema de alocação de capital baseado no mercado e dominado por Wall Street. Almejava substituir o banco tradicional, que só emprestava dinheiro a clientes de confiança e escriturava a dívida nos seus livros – ao invés de passar adiante como os atuais bancos de investimento. Deu no que deu.
A nova finança evoluiu ao longo de três décadas e teve um crescimento explosivo nos anos recentes devido a três fatores simultâneos, mas distintos: a desregulamentação do mercado financeiro, inovações tecnológicas (comunicações e programas de computador) e a crescente mobilidade global do capital. Financistas criativos usaram esses programas para gerar os instrumentos conhecidos por derivativos, permitindo a tomadores e investidores retalhar e negociar todos os tipos de riscos financeiros.
Não culpem só os especuladores
The Economist alerta para que não se culpem apenas os especuladores pela montanha russa dos preços dos commodities, incluindo petróleo. Há fundamentos mais importantes. Nos últimos 50, estes preços em termos reais têm recuado com relação a outros bens e serviços, por excesso de oferta dos produtores. Mas essa curva em baixa teve momentos de volatilidade e diversos choques por cortes na oferta, como ocorreu na década de 70, quando houve uma alta generalizada durante alguns anos – o embargo árabe de petróleo em 1973, colheitas medíocres em 72 e 74 e a revolução no Irã em 79.
A alta de preços dessa década foi provocada por demanda em expansão. A economia mundial cresceu à média de 4,5% entre 2003 e 2007, puxada pelos países emergentes, com taxas médias de 7,5% ao ano, sobressaindo-se a China com 10,6% na média anual.
Na medida em que se expandia, a demanda desses países por commodities industriais elevou-se a taxas maiores ainda.
Os governos também têm responsabilidade na alta de preços, como os preços de diesel subsidiados nos países produtores e grandes importadores como China e Índia, estimulando o desperdício. Os biocombustíveis criaram outra distorção nos países ricos, onde induziram demanda explosiva por milho e óleos vegetais, por causa de subsídios. Calcula-se que esse procedimento é responsável por cerca de 50% da alta de preços desses alimentos. Os países ricos, entretanto, preferem ignorar suas próprias políticas agrícolas e de energia e culpam a demanda crescente dos emergentes.
Mas a alta de preços dos commodities já produziu reações como a queda do consumo do petróleo nos EUA. E a recente crise financeira global lançou a economia mundial em retração, cuja severidade é difícil de prever. Os preços dos metais já caíram cerca de 30% pelo próprio índice da revista The Economist, nas doze meses até outubro 2008. Para entender esse cenário e os possíveis desdobramentos futuros, a leitura desse suplemento em inglês é obrigatório.
Fonte: Estadão