Obra indispensável para escoar com rapidez, eficiência e custos reduzidos a produção de grãos, biocombustíveis e, principalmente, minérios produzidos na Bahia, além de uma nova alternativa ao escoamento da produção agroindustrial do Centro-Oeste brasileiro, o trecho da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol), que corta o território baiano, não será mais entregue ao final de 2012, como previsto. Com parte da obra ainda embargada, a previsão estendeu-se para 2015 – isso se não houver novas paralisações.
No final da década de 1950, Vasco Azevedo Neto idealizou o traçado da Ferrovia Oeste-Leste. O engenheiro faleceu em 2 de outubro de 2010, aos 94 anos, data exata em que era divulgado o resultado final da licitação da via férrea, um dos carros-chefe do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), do governo federal.
A partir dali, a expectativa era de que as obras iniciadas em 2011 avançassem, a ponto de que os primeiros trens começassem a rodar nos trilhos da Estrada de Ferro 334 – agora mais conhecida como Fiol – até dezembro de 2012. No ano passado, chegou-se a anunciar trabalhos de supraestrutura (montagem de dormentes, assentamento de trilhos e fixações metálicas) para meados do primeiro semestre do ano.
Mas essa perspectiva tornou-se irreal, a partir do momento em que foram identificadas suspeitas de superfaturamento nos processos de licitação e falhas nos estudos de impacto ambiental nos trechos já licitados.
O governo federal pressiona para que o primeiro trecho da obra (536 km entre Ilhéus e Caetité) esteja concluído até 2014 e que outros 485 km entre Caetité e Barreiras sejam entregues no ano seguinte.
Os dois trechos contemplam sete lotes que representam mais de 2/3 dos 1.527 km do traçado da Fiol, previsto para chegar até sul do Tocantins, onde se conectaria com a ferrovia Norte-Sul em Figueirópolis (TO). Os 505 km de extensão entre São Desidério (BA) e Figueirópolis nem sequer foram licitados – o trecho não foi incluído como prioritário no PAC. Ao todo, a obra está orçada em R$ 7,43 bilhões.
A própria Valec, estatal ligada ao Ministério dos Transportes e responsável pela obra, admitiu à revista O Empreiteiro que as obras no primeiro trecho caminham em ritmo lento. Somente 5% dos trabalhos de infraestrutura (desmatamento, terraplenagem) foram concluídos até maio de 2012.
*Local provável do futuro Porto Sul, em Ilhéus
Em maio, o Tribunal de Contas da União (TCU) determinou a suspensão das obras do trecho 1, pois o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) apontava várias inconsistências nos estudos de impacto ambiental do Porto Sul, em Ilhéus, empreendimento portuário tido como destino final da ferrovia.
Obras no Porto Sul passam por problemas desde 2011, quando o Ibama alegou descumprimento das condicionantes ambientais estabelecidas na licença de instalação no projeto original do porto, previsto para ser construído na Ponta da Tulha. Embora o governo baiano tenha alterado o local para Aritaguá, a 5 km de distância do anterior, o Ibama ainda não concedeu a licença ambiental – e não deverá fazê-la antes de outubro deste ano.
Paralisações e críticas
Embora já esteja licitado, o trecho 2 da Fiol, entre Caetité e Barreiras, não teve os trabalhos iniciados. O Tribunal de Contas da União (TCU) suspeitou de novas irregularidades nos projetos. A obra está embargada por sugestão do Ibama, novamente por descumprimento das condições socioambientais previstas na licença de instalação necessária para que as construtoras iniciem a montagem de seus canteiros de obras.
O trecho de 485 km, que contempla os lotes 5, 6 e 7 da obra, possui diversas pendências, especialmente nos dois últimos, entre os municípios de Barreiras, São Félix do Coribe, Santa Maria da Vitória e São Desidério. O Ibama exigia uma mudança em parte do traçado, sob alegação de que a ferrovia passaria por cavernas e áreas habitadas por diversas espécies de morcegos e macacos de papo amarelo.
A atuação do Ibama tem irritado setores do governo estadual e do governo federal, que têm pressionado o instituto para que acelere as concessões ambientais. Para esses grupos, a Oeste-Leste fomentará o desenvolvimento agrícola do oeste da Bahia, gerando novos polos agroindustriais e de exploração de minérios, que iriam dinamizar as economias locais, com ampliação de empregos e, consequentemente, da arrecadação de impostos.
No entanto, entidades como a Comissão Pastoral da Terra (CPT) alegam que a população em geral não se beneficiará diretamente da ferrovia, exceto por alguns empregos gerados durante sua construção e posterior operação. “É uma obra que será construída com recursos públicos para servir totalmente à iniciativa privada, sobretudo ao setor da mineração e agronegócio”, acusa Diacisio Ribeiro Leite, da CPT-BA.
De fato, entre as grandes beneficiadas pela estrada de ferro está a mineradora Bahia Mineração (Bamin), do grupo cazaque Eurasian Natural Resources Corporation (ENRC). A Bamin, que já detém 25% da capacidade de transporte da Oeste-Leste, considera a ferrovia estratégica para o seu ambicioso Projeto Pedra de Ferro, que projeta produzir em Caetité, a partir de 2014, cerca de 20 milhões de toneladas de minério de ferro por ano.
A Valec e o Ministério dos Transportes estimam que possam passar pela ferrovia, a partir de 2018, 45 milhões de t de minério de ferro e ou 7,1 milhões de t de outros produtos, como soja e álcool.
Para a CPT baiana, o projeto da Fiol desconsiderou o impacto que a ferrovia terá sobre a vida das pessoas que vivem em seu entorno. A pastoral diz que as comunidades quilombolas e de pequenos agricultores locais não foram ouvidas durante as audiências públicas para se discutir as obras. A entidade estima que 1.629 famílias serão afetadas pelas obras da Ferrovia Oeste-Leste em terras baianas.
“Estas comunidades existem há centenas de anos, em função dos rios. Porém, com a passagem da ferrovia, perderão suas áreas de produção e muitas deixarão de existir”, d
enuncia o dirigente.
Segundo ele, “vale ressaltar que o significado de terra para estas populações vai além de um espaço físico. É um meio de assegurar a produção, seus modos de vida, sua cultura e sua identidade. Portanto, é seu território que está sendo invadido, expropriado, e não há como compensar estes impactos”.
Obras da Ferrovia Oeste-Leste
Lote |
Extensão (em km) |
Canteiro central do lote |
Canteiro central do lote |
1 |
124,99 |
Ilhéus |
SPA/Delta/Convap |
2 |
117,90 |
Jequié |
Galvão/OAS |
3 |
115,36 |
Tanhaçu |
Torc/Ivaí/Cavan |
4 |
178,28 |
Brumado |
Andrade Gutierrez/Barbosa Mello/Serveng |
5 |
162,04* |
Guanambi |
Mendes Júnior/Sanches Tripoloni/Fidens |
6 |
159,31 |
Santa Maria da Vitória |
Constran/Egesa/Pedrasul/Estacon/CMT |
7 |
161,12 |
Barreiras |
Tiisa/Cowan/lmeida Costa/Trier/Pelicano |
8 |
124,50 |
São Desidério |
não licitado |
9 |
123,20 |
Combinado |
não licitado |
10 |
109,30 |
Paraná |
não licitado |
11 |
146,10** |
Figueirópolis |
não licitado |
* Mais 2,9 km para uma ponte sobre o rio São Francisco, que será construída pelo consórcio formado por LOCTEC / SANCHES TRIPOLONI / SOBRENCO
**Mais 1,9 km para uma ponte sobre o rio Tocantins
Fonte: Padrão