Parêntesis contra os donos da informação pública

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Nildo Carlos Oliveira

Há os que se julgam donos da informação pública. Eles querem mantê-la engavetada a sete chaves. Ou então disponibilizá-la, mas segundo os seus interesses, que no todo e em parte colidem com os interesses públicos.
Digo isso a partir de experiências diárias. Todos os dias, quando a redação se debruça para pautar matérias e, depois, sai a campo para fazê-las, sabe que vai encontrar os senhores das capitanias hereditárias da informação pela frente.
São esses donatários que se enquistam em órgãos públicos – e privados – e agem como se não tivessem nenhuma explicação a dar ao público. Para eles, público é o último degrau da escada. Talvez o quarto de despejo do poder público.
O jornalista quer fazer matéria sobre uma estrada. Ou sobre uma hidrelétrica. Talvez sobre o metrô. É difícil, às vezes impossível, desenvolver um texto sobre obras nesses e em outros campos, sem a palavra abalizada de um técnico. Às vezes, quando tudo está engatilhado, surge o donatário. Ele é o "dono" da informação que deve ser repassada ao público. E sonega-a. Em algumas ocasiões, utiliza um expediente solertemente iníquo. Recorre à assessoria de comunicação para ocultar o golpe preparado para despistar a imprensa. Comete, assim, dois deslizes: sonega a informação e deforma o papel da assessoria, que está ali, a rigor, para dar suporte e abrir caminho para o luxo da informação e não para acobertar a vilania do donatário.
Mas há outro deslize, além desses. O donatário se julga acima do bem e do mal e sugere mudar a pauta, para mudar o curso da informação pública. Ele quer fornecer ao público, não o que o público quer saber, mas aquilo que ele deseja que o público saiba. Além de dono, ele pretende ser o "sábio" da informação. Se isso ocorre em órgãos públicos, acontece também nas empresas privadas que operam serviços públicos.
Vamos e convenhamos:
Se tivesse sido repassada ao público a informação de que os sensores de velocidade das aeronaves Airbus A330 e A340 da AirFrance andavam tão vulneráveis, talvez, hoje, tantas famílias não estivessem chorando por causa da tragédia no vôo 447.
Se tivesse sido repassada ao público a informação de que o valor da construção do gasoduto Urucu-Manaus iria pular de R$ 2,4 bilhões para R$ 4,58 bilhões, certamente o contrato da obra já teria sido questionado pelo público há muito tempo.
Se tivesse sido repassada ao público a informação sobre os desmandos do auxílio-moradia de tantos senadores sonsos, certamente o presidente atual da Casa não precisaria ter vindo a público a fim de dizer que não sabia que o dinheiro caía todo mês em sua conta bancária.
Se tivesse sido repassada ao público a informação de que o decreto 6.640, recentemente assinado pelo presidente Lula da Silva, permite a destruição de 7.300 cavernas pelo país afora, a reação do público contribuiria para bloqueá-lo no nascedouro.
Se o público tivesse sabido que o deputado Sérgio Moraes, do PTB gaúcho, "se lixa para a opinião pública", ele não estaria na Câmara dos Deputados.
Mas, em pleno começo do século 21, ainda há os donatários da informação de interesse público. E ainda dizem que a Imprensa é que é culpada.

Frase da coluna

"… a viabilidade brasileira, de uma maneira geral, depende da credibilidade da vigência da lei e da ordem no País". Do empresário Murillo Mendes, presidente da Mendes Júnior Trading e Engenharia, que lançou, em 2004, em Belo Horizonte – MG, o livro Quebra de Contrato – o pesadelo dos brasileiros, escrito em parceria com o jornalista Leonardo Attuch.

Fonte: Estadão


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