Passo São João marca volta da Eletrosul à geração

 

Com a primeira unidade da usina hidrelétrica Passo São João, no rio Ijuí (RS), entrando em operação comercial, a Eletrosul dá o primeiro passo na retomada de investimentos em geração, sua vocação original, antes da privatização de seu parque gerador em 1999

 

Nildo Carlos Oliveira

 

É um dado que a Eletrosul considera histórico: no dia 21 de março último entrou em operação comercial a primeira das duas unidades geradoras da usina hidrelétrica Passo São João. Cada uma tem capacidade instalada de 38,5 MW. A segunda unidade deve entrar em funcionamento no mês que vem.

Com investimentos da ordem de R$ 595 milhões, o empreendimento amplia a geração de energia no estado, em especial na região das Missões, e recoloca a estatal em seu hábitat natural: o processo de geração e transmissão de energia. Adicionalmente, do ponto de vista da engenharia, a obra tem aspectosimportantes, em sua escala, registrados, sobretudo, nos trabalhos para a otimização do circuito hidráulico de geração.

Eurides Mescolotto, presidente da Eletrosul, diz que a empresa havia sido retirada do Programa Nacional de Desestatização (PND), do governo federal, em 2004, depois de privatizada em fins da década de 1990. Contudo, já em dezembro de 2005 ela foi autorizada a retomar investimentos em geração e transmissão por meio da Lei 10.848, de março do ano anterior. Então, ela arrematou, em leilão, a usina Passo São João, que de imediato passou a constituir um marco nesse processo da volta da estatal a esse mercado.

O primeiro empreendimento de geração da Eletrosul a entrar em operação foi o Complexo Eólico Cerro Chato, em Sant´Anna do Livramento, também no estado gaúcho, em junho do ano passado. Mas isso não elimina a importância da primazia de Passo São João, que representa a retomada da empresa na efetiva geração hidrelétrica. E, este, é o primeiro empreendimento de geração considerado 100% da Eletrosul.

Depois que arrematou a Passo São João, em leilão, a estatal conquistou outros empreendimentos de geração, só ou em parcerias, que somam, até agora, 1,8 GW de potência e R$ 6,5 bilhões em investimentos. Ela, por exemplo, obteve autorização do Ministério de Minas e Energia para implantar e explorar, como produtora independente de energia elétrica, quatro pequenas centrais hidrelétricas em Santa Catarina; conquistou o direito de implantar e explorar a Usina Hidrelétrica Mauá, com 361 MW, em construção no estado do Paraná, em consórcio com a Companhia de Energia Elétrica do Paraná (Copel). E, no estado do Mato Grosso do Sul, obteve a concessão para construir a Usina Hidrelétrica São Domingos (48 MW), no rio Verde, a 180 km de Campo Grande.

Além disso, em parceria com as empresas Suez Energy, Camargo Corrêa Investimentos e Companhia Hidrelétrica do São Francisco, participa do Consórcio Energia Sustentável do Brasil, que constrói a usina de Jirau, em Rondônia. É bom lembrar que em parceria com as empresas Furnas, Neoenergia e Odebrecht, ela participa também da Companhia Hidrelétrica Teles Pires, que venceu o leilão para implantar e explorar a usina hidrelétrica do mesmo nome,  com 1.810 MW de potência, e que está em construção no Mato Grosso entre os municípios de Paranaíta (MT) e Jacareacanga (PA), na área  conhecida como Cachoeira Sete Quedas. 

 

 

PASSO SÃO JOÃO, PASSO A PASSO
Os estudos para o aproveitamento do potencial hidroenergético da bacia do rio Ijuí foram iniciados na década de 1980 pela Companhia Estadual de Energia Elétrica do Rio Grande do Sul (CEEE) que, em 1999 realizou o inventário hidrelétrico da sub-bacia 75.
O estudo de viabilidade da UHE Passo São João foi posteriormente elaborado pela CEEE, em 2002, para ser apresentado e aprovado junto à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), o que aconteceu em 26 de outubro de 2005.
Para otimizar e adaptar o estudo de viabilidade, a Eletrosul realizou uma série de estudos complementares de topografia e geologia na região do empreendimento. Esses estudos levaram às seguintes modificações de projeto em relação ao estudo de viabilidade inicial:
• Adoção de duas unidades geradoras de 38,5 MW de potência nominal cada uma, mantendo-se a potência original sem perda de energia;
• Locação do vertedouro na margem direita rio, com 6 comportas de 13 m por 18,35 m de altura, para facilitar o planejamento construtivo do empreendimento;
• Barragem no leito do rio e diques de fechamento da casa de força optando-se pelo enrocamento com núcleo de argila, para melhor o aproveitamento do balanceamento dos materiais de construção;
• Retificação do nível de água de montante do reservatório para 128,35 m e de jusante para 99,30 m, sem alterar a queda natural existente, em função de diferenças na referência topográfica altimétrica encontrada no novo levantamento topográfico.
Pelos dados do projeto executivo, o barramento do rio, construído em terra, e o vertedouro, têm extensão total de 737 m e altura média de 21 m. O circuito hidráulico de geração, que conduz a água armazenada no reservatório até as unidades geradoras, é constituído por um canal de adução, tomada d’água acoplada à casa de força em arranjo típico de baixa queda e canal de fuga.
O canal de adução, com cerca de 310 m de comprimento e 40 m de largura, foi escavado na sela topográfica. O conjunto formado pela tomada d’água e casa de força é fechado à sela através de dois diques de enrocamento com núcleo de argila, com a crista na elevação de 131,50 m, nas ombreiras esquerda e direita.
A casa de força é provida de duas unidades geradoras com turbina Kaplan de eixo vertical, perfazendo um total de 77 MW de potência instalada. O canal de fuga, por onde a água retorna ao curso do rio, e que passa pela casa de força e vai até a calha do Ijuí, tem 440 m de comprimento.
O desvio do rio foi realizado em duas fases: na 1ª, as obras de construção da barragem da margem direita e vertedouro foram protegidas por ensecadeira projetada para uma vazão de TR = 10 anos, 3.540 m³/s, sendo o rio desviado pela margem esquerda onde foi prevista uma escavação adicional para aumentar a largura do canal. Na 2ª etapa houve o fechamento do leito do rio na margem esquerda, através de duas ensecadeiras de montante e jusante com elevação das cotas do coroamento 120 m e 119 m respectivamente. O rio foi desviado pela ogiva dos seis vãos do vertedouro para uma vazão de 3.540 m³/s correspondente a um TR superior a uma cheia
de 50 anos para o período outubro/abril. A vazão máxima de escoamento do vertedouro corresponde à vazão decamilenar e será da ordem de 11.570 m³/s.
As obras na área da casa de força foram protegidas por uma ensecadeira na margem direita do rio, estimada para a cheia de TR = 100 anos, 6.220 m³/s. O vertedouro foi construído na margem direita, sendo do tipo “ogiva baixa”, com controle exercido por meio de seis comportas tipo segmento de 13 m de largura por 18,35 m de altura, projetado para escoar a vazão decamilenar Q10.000 = 11.570 m³/s, com o reservatório no nível d’água máximo normal, sem sobrelevação.
Ao redor do lago artificial há uma área de Preservação Permanente, com largura média de 100 m, onde milhares de mudas nativas foram plantadas.

 

AS PRINCIPAIS SOLUÇÕES DE ENGENHARIA
Circuito hidráulico. Devido à conformação do que os técnicos da Eletrosul chamam de “a sela do rio Ijuí” e em razão também das maiores facilidades de acesso de equipamentos, uma vez que se dispunha de estradas asfaltadas até a cidade de Roque Gonzales, a cerca de 5 km do barramento, o circuito hidráulico de geração foi posicionado na margem direita, conforme previa o estudo de viabilidade. Concluiu-se que o posicionamento da tomada  d’água e da casa de força, mesmo após a realização da nova campanha de sondagens, deveria ficar no mesmo local definido na etapa do estudo de viabilidade.
A estrutura da tomada d’água/casa de força foi otimizada, adotando-se dois blocos, separadas por juntas de dilatação da área de montagem e entre si.
O canal de adução tem 310 m de comprimento e foi escavado em solo e rocha, sendo mantida a largura de 40 m prevista. O canal de fuga, de 440 m de comprimento, teve a sua largura reduzida de 42 m para 40, sendo o principal fornecedor de rocha para o concreto da obra em virtude da expressiva escavação em rocha basáltica de boa qualidade.
Barragem. Após estudos de balanceamento dos materiais de construções com alternativas de barramento, optou-se pela alternativa com barragem de enrocamento com núcleo de argila no leito do rio, o que condizia com o melhor aproveitamento dos materiais nas diversas fases de construção. Na margem esquerda foi construída a barragem de terra, devido à necessidade de se otimizar o cronograma.
Vertedouro. Baseados em resultados do modelo reduzido realizado em escala 1:75 no Lactec/Cehpar, verificou-se que o vertedouro com seis comportas na margem tinha capacidade suficiente para a vazão de projeto decamilenar igual a 11.570 m³/s. Por conta disso foi prevista a instalação de uma comporta flap no vão 3, para manter a vazão sanitária no trecho entre o barramento e canal de fuga da casa de força.

FICHA TÉCNICA

As principais empresas que operaram na construção da UHE Passo São João são as seguintes:
Elaboração do projeto básico consolidado e engenharia do proprietário – Leme Engenharia
Obras civis – Construtora CVP
Montagem eletromecânica, fornecimentos de sistemas auxiliares eletromecânicos, suprimentos de partes das turbinas, comissionamento das unidades e gerenciamento geral
e integração das atividades eletromecânicas – Engevix Engenharia
Fornecimento das turbinas – AndritzHydro Brasil
Empresa russa fornecedora dos geradores – Power Machines

Principais quantitativos:
– Volume de Concreto CCV (m³) – 110.000
– Quantidade de Aço (t) – 7.480
– Quantidade de Cimento (t) – 42.747
– Escavação Comum (m³) -413.582
– Escavação em Rocha (m³) -378.169
– Aterro Compactado (m³) – 450.000

 

Fonte: Padrão

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