PORTO E COPA, as duas âncoras do crescimento

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De um lado, Suape, que se consolida como centro logístico e industrial. Do outro, as obras da Copa, que poderão modernizar Recife. A sociedade local reivindica, no entanto, um crescimento contínuo, que independa de datas e eventos esporádicos

Nildo Carlos Oliveira

Ciclo de palestras regional, organizado pela revista O Empreiteiro e pela TOTVS, dia 2 deste mês (agosto), no JCPM Trade Center, Recife, expôs um conjunto de ideias, projetos e polêmica, que derivou para a via de mão única do interesse maior de Pernambuco: a necessidade de um crescimento organizado e contínuo, ancorado, atualmente, na terra e no mar: no porto de Suape e nas obras da Copa do Mundo 2014, que sinalizam com melhorias viárias, ferroviárias, rodoviárias, aeroportuárias e de transporte de massa.

Um palestrante deixou no ar uma reflexão: nem tanto ao mar, nem tanto à terra. Sem um crescimento organizado, que estabeleça uma conexão de infraestrutura entre as duas âncoras, o porto corre o risco de se tornar um enclave – uma área rica, mas divorciada do resto do Estado.

A abertura do ciclo de palestras coube ao diretor editorial da revista, Joseph Young, que se manifestou sobre a oportunidade do encontro, a partir do qual O Empreiteiro vai costurando tendências e informações, tendo em conta o evento maior: o 2º Fórum Brasileiro da Construção, que OE/TOTVS articulam para o dia 27 de setembro próximo, no Espaço Apas, em São Paulo (SP). Ele foi seguido por Marcos Vinicius de Brito e Castro, que apresentou um perfil da TOTVS e a expectativa da empresa, na economia do País.

O empresário Gustavo Miranda, presidente do Sindicato da Indústria da Construção em Pernambuco (Sinduscon-PE), mostrou alguns aspectos da economia local, enfatizando a importância do porto, das obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC 1 e PAC 2) e do programa Minha Casa, Minha Vida, considerando que elas “refletem um cenário de mudança de um patamar histórico.”

Contou que o mercado imobiliário, como consequência do crescimento geral, vive momento de euforia: “A quantidade de opções de crédito, com os bancos voltando a financiar empreendimentos e as empresas maiores podendo ir à Bolsa para se capitalizarem, tem favorecido o mercado…”

O engenheiro Abel de Oliveira Filho, presidente regional do Sindicato Nacional das Empresas de Arquitetura e Engenharia Consultiva (Sinaenco), concorda com Gustavo Miranda: “O segmento de consultoria de projetos nunca passou, nos últimos 25 anos, por momento de tanta demanda. É compreensível, nessa nova realidade, que até estejamos perdendo quadros para o segmento da construção e para o segmento do setor público, com a abertura de concursos. Os nossos quadros são muito qualificados, disciplinados, preparados e têm sido buscados em nossas empresas, que adotam diversas formas de atratividade para conservá-los.”

Primeira âncora

Frederico Amâncio, vice-presidente do Complexo Industrial e Portuário Suape, lembrou a história do porto, concebido há 33 anos, e cuja construção se deve à ação de vários governos. Criado segundo a concepção de um porto-indústria, veio recebendo ajustes ao longo do tempo e atualmente é uma estrutura integrada, com a proposta de não ser apenas uma porta de entrada para o desenvolvimento do Estado, mas um polo concentrador de grandes cargas para o País.

O Plano diretor 2030 elaborado para Suape estabelece metas de construção e ampliação para os próximos 20 anos. Distribui-se espacialmente por 13.500 ha, mas mantém uma área permanente de proteção ecológica. Sua dimensão corresponde ao tamanho de pelo menos sete dos municípios da Região Metropolitana do Recife. Ali trabalham 40 mil operários, 23 mil dos quais na Refinaria Abreu e Lima. No conjunto, incluindo os habitantes do complexo, a população é da ordem de 90 mil pessoas.

O plano prevê a construção de três novos terminais: o segundo terminal de contêineres (cais 6 e 7), que terá investimentos de US$ 181,68 milhões; o terminal para granéis sólidos na ilha de Cocais, cujas obras deverão custar US$ 262,45 milhões, e o terminal de grãos (8 e 9), com investimentos de US$ 166,67 milhões.

O píer de granéis líquidos-1 terá 330 m de extensão, dois berços para navios de 190 m de comprimento e 14 m de profundidade para atracação de navios de 45 mil t. O píer de granéis líquidos-2 contará com 386 m de extensão, dois berços para navios de 270 m e 14,5 m de profundidade para atracação de navios de 90 mil toneladas. Já o píer de granéis líquidos-3 se destinará à atracação de navios petroleiros com até 170 mil t, com calado operacional de 17 m. Para permitir a atracagem desses navios a profundidade do canal, hoje da ordem de 15 m, ela será aumentada para até 18 m. Além das obras de dragagem para esse fim, haverá reforço do molhe, sinalização do canal de acesso e outras melhorias do ponto de vista de logística para atendimento da Refinaria Abreu e Lima, ora em obras.

O complexo, segundo Frederico Amâncio, está consolidando Pernambuco como polo provedor de bens e serviços para as indústrias de petróleo, gás, offshore e naval. Ao longo de 30 anos de funcionamento atraiu mais de 100 empresas nos segmentos da siderurgia, refinaria e petroquímica.

Contraponto

O economista Alexandre Rands, presidente da Datamétrica Consultoria, interveio para destacar que Pernambuco, sejam quais forem as circunstâncias, não é uma ilha, incólume ao que acontece em outras regiões do País. Tanto assim que, quanto o Brasil sofre abalos econômicos, ele também sofre. E, diferentemente do que pensavam alguns economistas em épocas passadas, segundo os quais, quando ocorria alguma crise, os investimentos então previstos poderiam ser retomados com o mesmo fôlego e direção mais tarde, as coisas não são bem assim. Quando sobrevém uma mudança econômica, os projetos se perdem, são redirecionados ou deixam de ser implementados.

Foi que aconteceu com o projeto de um parque turístico concebido para ser implantado no litoral sul do Estado, de responsabilidade de uma empresa espanhola. Veio a crise, os ventos mudaram de direção e as empresas contratadas para construir o parque acabaram desmobilizadas.

Alexandre Rands acha que o Brasil continuará crescendo ao longo dos próximos dez anos, mas seu otimismo não vai ao ponto de considerar que tudo continuará no melhor dos mundos. Pondera que o Brasil é um país vulnerável, registra déficit nas contas correntes e que esse problema só não é ma

ior porque “cresceram nossas exportações e os preços, nesse item, aumentaram.” Resumindo: se o País tiver uma crise de preços nas exportações de commodities, a situação se tornará desconfortável.

Em sua avaliação, Pernambuco, nesse cenário, continuará crescendo. Ele citou o fato de que os investimentos de Suape são da ordem de US$ 22 bilhões. E, como os investimentos dos grandes projetos no Brasil somam R$ 46 bilhões, esse fato pode levar ao raciocínio de que Pernambuco vai se tornar a grande potência do Nordeste. “Não é bem assim”, reflete o economista, salientando que Pernambuco sequer chegará perto da Bahia, que vai continuar sendo o maior Estado da região, embora tenham renda per capita similar.

Gustavo Miranda, presidente do Sinduscon-PE, também interveio na discussão. Entende que o governo pernambucano tem adotado uma política de descentralização de empreendimentos no Estado e que o grande mérito dessas medidas é não “focar apenas a dimensão de Suape”. Contudo, compartilha da visão de Alexandre Rands de que é importante que “não nos deixamos tomar por um excesso de otimismo”, pois “de Itamaracá à Paraíba, também há vida.”

Abel de Oliveira, presidente do Sinaenco, afirmou que a participação das empresas de consultoria de projetos em Suape ocorre de duas formas: “As grandes plantas, quando vêm para o complexo, já chegam com os seus projetos praticamente prontos. Contudo, quando os investimentos são realizados ali pelo poder público, a coisa muda de figura e as empresas locais conseguem participar.”

Copa, a segunda âncora

Amir Schvartz, secretário de Planejamento da Prefeitura do Recife e responsável pela Secretaria Extraordinária da Copa, falou do conjunto de obras de mobilidade urbana incluídas no projeto da construção da Cidade da Copa, que se situa no município de São Lourenço da Mata. Ela será um complexo, que não se limitará apenas à construção da arena, cuja construção é da responsabilidade da Construtora Norberto Odebrecht, que para esse fim firmou um contrato, na modalidade PPP, com o governo do Estado. É uma cidade, que deverá privar de todos os equipamentos urbanos e, futuramente, até de uma universidade. Contudo, a arena, dada a distância em que está situada – a cerca de 22 km do centro do Recife – tem sido duramente questionada pela população. Afinal, a cidade já dispõe de três estádios (usados pelos times locais Sport, Náutico e Santa Cruz), bem localizados, e poderia dispensar uma quarta arena, que vai depender de um conjunto amplo de infraestrutura para facilitar o acesso popular e custará R$ 532 milhões.

O secretário de Planejamento disse que a prefeitura ficou com a responsabilidade de executar diversas obras viárias, incluindo a via Mangue, iniciada em abril último, enquanto o governo do Estado passa a responder por diversas outras, incluindo o terminal integrado Cosme e Damião, em construção no município de São Lourenço da Mata, e a implantação de 52 km de corredores exclusivos do Transporte Rápido de Ônibus (TRO), nos eixos Norte-Sul, Leste-Oeste, além do Ramal Cidade da Copa, um investimento de R$ 476 milhões.

O Corredor Leste-Oeste vai da Praça do Derby ao terminal integrado de Camaragibe, atravessando a avenida Caxanguá, onde as paradas serão substituídas por estações. Com 12,5 km de extensão, esse corredor vai passar por 22 estações e atender aos terminais integradas da 3ª Perimetral, que será construída no cruzamento da avenida Caxangá com a General San Maertin.

O Corredor Norte-Sul vai do terminal integrado de Igarassu até a estação central do metrô, centro do Recife, passando pela PE-15, pelo Complexo de Salgadinho e pela avenida Cruz Cabugá, num percurso de 33,2 km.

Além dessas obras dos corredores, quatro viadutos vão cruzar a avenida Agamenon Magalhães, entre a ilha do Leite e o Parque Amorim. A previsão é de que até novembro próximo já estejam concluídos o estudo técnico e o projeto básico e executivo para a licitação dos quatro viadutos.

A vez de atualizar o metrô

O engenheiro Bartolomeu Carvalho, gerente regional de manutenção do metrô do Recife, disse que as obras atualmente em curso estão relacionadas com a Copa de 2014, embora as expectativas de ampliação da malha metroviária tenham em conta um horizonte mais amplo.

A configuração atual da malha da linha Centro define uma linha tronco que, partindo da Estação Coqueiral, onde se divide em dois ramais, atende Jaboatão e o ramal de Camaragibe. Com 20 estações e 29,3 km de extensão, o metrô transporta atualmente cerca de 190 mil passageiros/dia. Opera em via dupla e exclusiva com bitola de 1,60 m, com telecomando para controle de tráfego e de potência.

A linha Centro foi inaugurada na década de 1980 e atendia originalmente o trecho Recife-Jaboatão, com um ramal que a conectava com a Rodoviária. Em 2002 houve a ampliação do trecho Rodoviária-Timbi (Camaragibe). Durante a construção desse trecho, e por conta da pressão popular, cogitou-se do projeto de uma futura estação – exatamente onde hoje está em construção a estação Cosme e Damião, que se localiza a 1,5 km da arena da Copa. Deverá ser concluída em dezembro próximo.

O metrô dispõe também da linha Diesel, chamada de linha Verde, que funciona com oito estações entre Cajueiro Seco e Cabo, no município do mesmo nome. É operada com trens não eletrificados, que deverão ser substituídos, até a Copa, por trens modernos.

Abel de Oliveira interveio na palestra de Bartolomeu Carvalho e lembrou que, na década de 1960, o Brasil fez opção pelo sistema rodoviário. Por causa disso, desprezou a infraestrutura ferroviária então disponível. Salientou que embora o modal ferroviário exija investimento maior, no horizonte e na análise custo/benefício, ele se torna competitivo. Há uma malha ferroviária ampla no Recife e esse potencial deveria ser canalizado para resolver os problemas de mobilidade urbana local, “e não só para a Copa, que afinal poderá ser apenas um detalhe”.

Fonte: Estadão


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