O noticiário sobre o trem de alta velocidade, que deverá ligar Rio-São Paulo num piscar de olho, ao final de uma viagem a 360 km/h, instiga a imaginação. E começamos a ver a operação da linha, a partir de 2015, com o trem deixando a Central do Brasil, no Rio e chegando à Estação da Luz, aqui em São Paulo, em nada menos que em uma hora e 25 minutos.
Tem havido natural movimentação inspirada pelo projeto. A ministra Dilma Vana Rousseff, por exemplo, já esteve em Roma, onde se reuniu com representantes do Banco Internacional Europeu, o BEI, para difundir a idéia e despertar interesses no financiamento da construção.
E José Francisco das Neves, presidente da empresa que estrutura o projeto, a Valec Engenharia, Construções e Ferrovias, chegou a dizer, no ano passado: “É, ninguém acreditava nessa iniciativa. Agora só está faltando a licença a ser liberada pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais, o Ibama, para o paulistano sair cedinho de sua cidade, tomar um banho em Copacabana e voltar para o batente à tarde”.
Se, em 2007, quando o bilhete do trem-bala, a um custo previsto de R$ 114,36, já seria uma grande vantagem em relação ao preço da passagem aérea, passa a compensar ainda mais agora – ou em futuro próximo – quando as companhias de aviação começam a praticar aumento destinado a “testar a elasticidade da demanda”, segundo afirmou um empresário dessa atividade.
Mas construir o traçado do trem de alta velocidade não será coisa fácil. Serão, em princípio, 403 km de linha ferroviária, cerca de 130 km de túneis e provavelmente mais de 100 km de viadutos, incluindo, nessas obras de arte especiais, a travessia pela Serra do Mar, na Serra das Araras.
E foi aí, ao observar a menção à Serra do Mar, na subida para a abertura da paisagem do Vale do Paraíba, que veio à memória a constatação de que o Brasil já teve um trem-bala. Funcionou na fase do “milagre brasileiro”. Hoje, seria apenas um simulacro dos atuais trens de alta velocidade, se comparado a eles.
A viagem inaugural do nosso “trem-bala” ocorreu no dia 25 de janeiro de 1974, coincidentemente data de aniversário de São Paulo. A época, conforme documento da antiga Empresa Brasileira de Planejamento de Transportes, o Geipot, era de viva euforia cívica. O País vivia a febre do crescimento econômico e, para enfatizar a potencialidade do “milagre”, nada melhor, para o governo, do que mostrar um sistema moderno e eficiente de trens de passageiros entre as duas principais cidades.
Lembra o Geipot que se optou por trens-unidades diesel-hidráulicos fabricados pela Ganz-Mavag, da Hungria. A então Rede Ferroviária Federal resolveu comprar logo uma dúzia: seis unidades foram adaptadas para circular em bitola larga, entre Rio e SP, e as demais, no Rio Grande do Sul, em bitola métrica, para substituir o histórico trem que levava o nome do vento decantado em O Tempo e o Vento, do Érico Veríssimo – o “Minuano”.
Com o inicio das operações do trem-bala verificou-se que o equipamento definitivamente não fora projetado para vencer trechos extremamente montanhosos, notadamente a Serra do Mar. Ele apontava no começo da serra e já ia empacando. Não desenvolvia a velocidade compatível à de um trem-bala e, para alcançar o planalto, tinha de ser puxado por uma locomotiva comum diesel-elétrica. Além desse problema, verificou-se outro, de maior ou igual gravidade: não havia como obter aqui ou em praças próximas, com a eventual urgência necessária, peças de reposição. Os problemas foram se acumulando e, aos poucos, se verificou que o trem-bala não emplacava. O serviço, mal-servido, acabou desativado em 1978, depois de levado a outros testes entre São Paulo e Campinas e na Baixada Santista.
Acreditamos que a tecnologia atual não admite obstáculos intransponíveis. Resta saber a que custo e qual será o retorno sobre o capital investido.
Fonte: Estadão