A retórica e os gastos com a máquina pública chegam primeiro. Depois, a realidade se incumbe de mostrar que os projetos e obras, até aquelas consideradas absolutamente prioritárias, chegam sempre depois, quando chegam. O País não se acostumou a preparar-se para enfrentar as condições adversas, que sempre existem, sejam elas internas ou externas.
As crises, sobretudo aquelas provocadas por fenômenos naturais, a maior parte deles previsível, pois chuvas e inundações, que comprometem rodovias, portos e aeroportos, com graves prejuízos materiais e humanos, ocorrem invariavelmente todos os anos, têm se encarregado de demonstrar as vulnerabilidades da infra-estrutura brasileira.
No caso das chuvas, especialistas têm apontado, com antecedência, onde elas vão acontecer e até indicam o volume de difi culdades que elas acarretarão para populações do campo e das cidades, no Norte, Sul, Leste ou Oeste. As cidades, que são o microcosmo das diversas regiões brasileiras, são mapeadas e qualquer pessoa nas ruas é capaz de mostrar as áreas sujeitas a alagamentos e que podem, de uma hora para outra, convulsionar um centro urbano.
Apesar disso, as administrações públicas ignoram as evidências e apostam na alegada falta de memória do povo para não fazer nada e deixar, para as administrações futuras, as tarefas que fi caram inconclusas ou que ininterruptamente voltarão a ser postergadas.
Caso os governantes assumissem as responsabilidades que lhes são conferidas pelos eleitores,tragédias como as que ocorreram recentemente em Santa Catarina e que continuam a acontecer no Norte e no Nordeste, ocasionadas pelas chuvas, poderiam ser, ao menos, minimizadas.
Mas o País não se antecipa aos acontecimentos. E até documentos, comprobatórios de que ele precisaria aplicar, todo ano, cerca de R$ 108,4 bilhões de investimentos em obras de infra-estrutura – em todos os seus segmentos – são ignorados e, talvez, sequer examinados com a prudência e os cuidados que merecem. E, no entanto, a falta de capacidade do ponto de vista de planejamento e gestão acaba se refl etindo nas defi ciências observadas na geração e distribuição de energia, nos transportes públicos, nas malhas rodoviária e ferroviária, nos portos e aeroportos e no saneamento.
O Programa de Aceleração do Crescimento, por exemplo, continua a ser uma colcha de retalhos. Agrega empreendimentos passados e remotos, outros mais recentes e outros que estariam somente em projeções. Quando examinados sob a óptica técnica e gerencial, o que se vê são obras esparsas, muitas das quais em absoluta contradição com os cronogramas que haviam sido estabelecidos.
Um programa que espelha bem essa contradição brasileira é este que tem em vista construir 1 milhão de moradias para famílias com renda de até 10 salários mínimos. Não é de hoje que vem se falando em um défi cit habitacional da ordem de quase 8 milhões de moradias. Pois bem. O programa referido prevê a construção de 1 milhão de casas, em um prazo que o governo decidiu cautelosamente deixar indefi nido. Uma prova de que a meta pode ficar para as calendas.
Outra constatação de que o governo, quando chega, chega atrasado, é o que acaba de acontecerno Congresso Nacional. Somente depois da divulgação, insistente, diária, dos escândalos com a farra das passagens aéreas, é que Senado e Câmara dos Deputados resolveram adotar medidas – tímidas – para frear a iniquidade. Detalhe: A manutenção de um senador custa, hoje, aos cofres públicos, R$ 120 mil por mês; um deputado, R$ 62 mil.
Fonte: Estadão