Reconquistar a cidadania, antes que seja tarde

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A luta, ao longo dos anos, nas áreas da Engenharia, Arquitetura e Construção, tem sido em favor da retomado do crescimento econômico, a partir dos efeitos multiplicadores que a ampliação e melhoria da infra-estrutura brasileira podem oferecer nesse sentido. Todos os meios de comunicação em geral, e a imprensa especializada, em particular, têm batido na tecla de que o País exige regras claras que possibilitem a aplicação de investimentos públicos e privados em programas de obras de saneamento, habitação, energia, transporte público, outros equipamentos urbanos, rodovias, ferrovias, portos, hidrovias e nos meios que assegurem a plena operação do transporte aéreo. Pois bem. Com exceção de alguns desses segmentos, a construção imobiliária entre eles, o País continua hoje como estava ontem ou anteontem. E, não fosse a divulgação sistemática e oficialmente articulada do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que não passa de uma compilação de planos idos e vividos neste e em governos anteriores, aqueles temas continuariam como sempre foram. A diferença, hoje, consiste na novidade da sigla. No fundo, no fundo, nada foi feito para mudar a realidade que exige as obras reclamadas pela sociedade. Enquanto as obras continuam na promessa, outra realidade se impõe: a da violência urbana, assunto que temos enfocado aqui e em outras páginas da revista. E vale a pena insistir nesse tema porque ele diz respeito à sobrevivência da sociedade organizada, onde os cidadãos têm seus direitos e deveres e esperam das autoridades da Segurança Pública, do Judiciário, do Executivo e Legislativo e dos demais órgãos da República, as garantias de que eles lhes sejam permanentemente assegurados. Lastimavelmente isso não acontece. As cidades brasileiras, sejam elas pequenas, médias ou grandes, vivem à sombra do medo. Os cidadãos não dispõem de segurança para fazer o que usualmente lhes seriam corriqueiro e natural: trabalhar, morar, praticar lazer. Para onde quer que eles se virem, estão sujeitos ao assalto e morte. A menos que se incluam naquele reduzido número de privilegiados que podem andar para cima e para baixo com um aparato de segurança nos calcanhares. É que o crime se sofisticou e se organizou. Na medida em que a sociedade não soube mobilizar o Estado e ela própria para garantir os meios para a manutenção dos valores da cidadania, as quadrilhas prosperaram e criaram a sua forma de sobrevivência paralela. Hoje, ninguém está seguro. O delinqüente pode estar ao lado. Na próxima porta ou na próxima esquina. Ou dentro de casa. Por isso, é ilustrativa a reportagem recentemente publicada em primeira página, no The Washington Post, intitulada In Rio, Death Comes Early (No Rio, a morte chega mais cedo). Em São Paulo, um jornalista e a família, vítimas de assalto, tiveram de abandonar a casa com a mulher, filho, nora e neto, diante das ameaças de que os delinqüentes retornariam para consumar outro crime: um seqüestro. E a criança indagou ao avô: “Por que estamos fugindo?” – Uma pergunta que ele encampa e repassa às autoridades de seu País. Em síntese, chegou-se àquele patamar da barbárie urbana em que ninguém pode se revelar imune e isento. Acreditamos que se os pleitos históricos da Indústria, Comércio, Engenharia, Construção, Arquitetura e de todas as demais atividades legalizadas e sólidas, em favor do crescimento, tivessem sido atendidos, no todo ou em parte, o cenário brasileiro seria outro. Mas isso não justifica a passividade de entidades, sobretudo as empresariais, sobre a violência cotidiana que atinge a população dos grandes centros. Depois de ônibus incendiados com passageiros e criança arrastada pelas ruas por criminosos num veículo em fuga, que outro ato inominável precisa se repetir para que a sociedade se mobilize a fim de exigir medidas imediatas do governo, nos três níveis, para combater a violência urbana? O assunto diz respeito a todos, pois se trata de reconquistar o direito de ser cidadãos livres, antes que seja tarde.
Fonte: Estadão


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