Recursos hídricos demandam novas tecnologias e obras de grande porte

Há quem preveja guerras por água no futuro. Para evitar que a escassez chegue a esse ponto, existe uma onda de soluções que reduzem o custo de tratamento d’água e de efluente para reúso. Enquanto isso, a Cidade do México mostra que somente obras de grande porte, como “o maior túnel de esgoto do mundo”, pode solucionar problemas seculares como inundações

Joseph Young – Munique (Alemanha)

Moradores da Cidade do México consomem em média 500 l de água potável engarrafada por pessoa/ano — o maior consumo per capita no mundo. O problema é a falta de água tratada em muitos bairros, como Iztapalapa, a sudoeste da capital mexicana, onde moram 1,8 milhão de pessoas. Há manhãs em que apenas um fio de água marrom sai das torneiras. Daí, os moradores aguardam os caminhões-pipa brancos, pintados com os dizeres “água potável gratuita”, para encher os seus latões e barris. Para economizar essa água, eles recolhem a água dos chuveiros para tarefas de limpeza ou molhar os jardins. E compram água engarrafada no supermercado para cozinhar e banhar as crianças.
 

Essas ruas também se transformam em mar de lama com as tempestades repentinas. Esse paradoxo aflige Iztapalapa e toda a capital mexicana há décadas, onde moram 22 milhões de pessoas, e é o terceiro maior centro urbano de terra. O consumo local de água atinge 62 mil l/s — duas vezes maior que a Alemanha, por exemplo. Três-quartos desse volume vêm do subsolo, extraído por cerca de 3 mil poços na área metropolitana, alguns com até 400 m de profundidade.

Essa superextração d’água do subsolo está afundando literalmente a Cidade do México. Isso é visível em toda a parte, com as rachaduras nas ruas e casas. O centro histórico está 9 m abaixo do seu nível há 100 anos. Há locais que estão cedendo até 40 cm ao ano. Isso leva a um outro problema — a drenagem não funciona mais, nem a vazão do esgoto, o que é feita por estações de bombeamento, as quais entretanto não conseguem lidar com as chuvas torrenciais, provocando inundações regulares em muitos bairros da capital.

A oeste da capital, sobre os morros, fica a estação de tratamento de Los Berros, onde 19 m³/s de água são tratados, fornecida por uma extensa rede de reservatórios conhecida como sistema Cutzamala. A água é bombeada para vencer uma diferença de cota de até 1.100 m a fim de ser tratada, seguindo depois por 130 km até a Cidade do México. Cutzamala, juntamente com o sistema Lerma, fornece 30% do consumo da capital. Um terço dessa água é perdida nos vazamentos das redes, agravados pelo recalque constante do solo. A estatal Conagua realiza reparos de vazamentos praticamente em toda a cidade, mas outros aparecem.

Uma campanha de economia, que inclui a proibição de lavar carros nas ruas, conseguiu uma redução de 10% no consumo doméstico nos anos recentes. Discute-se também o fim do subsídio atual dado à água na capital mexicana. 

O diretor Peter Cornel, do Instituto IWAR, da Universidade Técnica de Darmstadt — uma das muitas instituições alemãs presentes na IFAT 2014 (maior feira do mundo de gestão de água, esgoto, lixo e materiais brutos, realizada em Munique, Alemanha, de 30 de maio a 3 de junho) —, defendeu o reúso da água.

De acordo com ele, a água usada nos chuveiros e máquinas de lavar roupa pode receber um pré-tratamento e ser aproveitada na descarga dos sanitários; as estações de tratamento de esgoto dotadas de plantas de biogás podem produzir eletricidade e calor, a exemplo do que ocorre em Hanoi, no Vietnã, Qingdao, na China, e Outapi, na Namíbia, cujas obras estão em curso.

Túnel de 62 km

Na Cidade do México, a maior parte do esgoto não recebe tratamento e é despejado nos rios que deságuam no mar. Ao norte da capital, está em obras o Túnel Emissor Oriente, de 6 m de diâmetro, 62 km de extensão, que vai captar até 150 m³/s da drenagem e esgoto da capital. Quando entrar em serviço em toda sua extensão, em 2018, a expectativa é de que venha a pôr fim às inundações.

No fim do túnel, a ETE de Atotonilco vai converter 60% dessa vazão de água negra para cinza, à razão de 50 m³/s, suficiente para irrigar 80 mil ha de terra na região. A lama do esgoto vai seguir para uma planta de biogás, com capacidade de suprir 60% da energia consumida na ETE.

No total, 10 km do Túnel Emissor Oriente já estão operando, com estações de bombeamento conectadas à rede existente de esgotos. As bombas são protegidas por peneiras automatizadas fornecidas pela Bilfinger Water Technologies, da Alemanha, as quais são instaladas em poços de 30 m a 50 m de profundidade que interceptam o fluxo do esgoto. As peneiras possuem filas de barras de aço inoxidável, medindo de 4 m a 6 m, que formam uma barreira para reter todo tipo de detrito — de sapatos, garrafas PET, roupas, pneus a bicicletas — que destruiriam as bombas a jusante.

Para evitar que os detritos acabem bloqueando o fluxo de água, sensores monitoram o nível da água antes e depois das peneiras, acionando, quando necessário, uma caçamba de mandíbulas que desce por um monotrilho para remover o material retido, que segue por correia transportadora para contêineres. Foi instalado recentemente o maior desses sistemas automatizados de peneiras na estação de bombeamento El Caracol, onde o poço tem 50 m de profundidade.

       ”Os piscinões nas cidades brasileiras fariam bom uso desse peneiramento automático de detritos, não acumulando resíduos urbanos como ocorre hoje 

 

A Bilfinger está fornecendo válvulas para regular a vazão do Emissor Oriente e coletores de esgoto secundários, que também são fechados quando se executam serviços de manutenção. Enquanto válvulas similares em uso na Europa medem de 1 m² a 4 m², no túnel mexicano possuem superfície bem maiores e pesam 98 t.

Bomba manual produz água potável a 5 centavos/l

Empresa que aplica complexas tecnologias para purificar água ou tratar efluentes, a Bioworks f
oi quem roubou a cena na abertura da exposição IFAT, ao lançar uma bomba manual para purificar água potável em regiões rurais, de uma simplicidade cartesiana, porque dispensa fonte de energia. Uma alavanca, desenhada com curvatura e comprimento suficientes para minimizar o esforço humano, gera a pressão necessária para que a água passe por micro e ultrafiltragem sucessivas, produzindo 500 l/hora de água potável purificada, de acordo com os padrões da Organização Mundial de Saúde. 

O processo de multifiltragem não remove apenas sólidos em suspensão, como as estações de tratamento tradicionais, mas também retém e elimina vírus, bactérias e protozoários.

A bomba chamada Villagepump é uma unidade autônoma, operada manualmente, que é despachada pronta para uso em contêineres. Segundo o fabricante, pode produzir água potável a 5 centavos de dólar por litro. O segredo da bomba é uma unidade de ultrafiltração (UF), combinada com um sistema inovador de retrolavagem pressurizada. O processo UF em si foi empregado com sucesso em sistemas de tratamento de água potável para uso industrial e municipal desde os anos 70. Nos 20 anos recentes, tornou-se um processo reconhecido por sua eficiência para tratamento não químico da água. Ao criar uma barreira de separação com poros muito pequenos, a ultrafiltração bloqueia agentes patológicos, como vírus e bactérias.

A Villagepump faz primeiro a microfiltração com um microfiltro autolimpante, que remove partículas maiores que 50 micra, como silte e areia. Depois, segue-se a ultrafiltração, em que um módulo de membrana bloqueia vírus, bactérias e protozoários, enquanto sais minerais conseguem passar. O equipamento pode ser usado opcionalmente com um filtro de carvão ativado, que remove cor e odor da água, além de melhorar seu gosto.

O filtro de membrana emprega válvulas inteligentes para retrolavagem, para eliminar partículas e sólidos que fiquem retidos nele. A retrolavagem automática ocorre a cada 5 até 8 minutos, independentemente da água que está sendo tratada e bombeada manualmente. O sistema de retrolavagem opera por pressurização, o que prolonga sua durabilidade. O cloro fornecido por um tanque embutido na bomba faz a esterilização periódica da membrana. Não possui componentes eletrônicos sensíveis nem sujeitos a furto. Pode tratar água de rio ou lago, reservatório, ou poço de até 20 m de profundidade.

Fonte: Revista O Empreiteiro

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