São Salvador, uma obra amigável, do ponto de vista sócio-ambiental

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Em meados de 2002, quando fez o primeiro estudo para construir a usina hidrelétrica São Salvador, no sul do Tocantins, a Tractebel Energia, controlada pela Suez Energy South America Participações Ltda., braço brasileiro do grupo franco-belga GDF Suez, encontrou na região que seria ocupada pelo reservatório do empreendimento 112 famílias que não eram proprietárias de terras. Eram funcionários das fazendas vizinhas, ocupantes ou meeiros. Dois anos depois, quando recebeu a licença de instalação para iniciar as obras, já viviam no local 466 famílias. Elas se mudaram para lá motivadas pelos boatos de que poderiam ganhar terras, casas e dinheiro ao serem transferidas para outro lugar.
As desapropriações e remanejamento dos habitantes da região, no entanto, foram apenas alguns dos problemas enfrentados pela empresa, que decidiu adotar a responsabilidade socioambiental como principal ferramenta de gestão de riscos, para minimizar os potenciais passivos na Justiça e manter o projeto dentro do cronograma. Durante a construção, tanto a Tractebel quanto as empresas contratadas para as obras mantiveram negociações diretas com os habitantes da região, que fundaram o Movimento dos ministérios públicos federal e estadual e com as prefeituras dos municípios atingidos, visando não só definir critérios para as indenizações como para a mitigação dos impactos ambientais. Segundo o diretor de Meio Ambiente da usina, Odilon Parente, todos os envolvidos foram integrados ao processo, o que facilitou a aceitação pública do projeto.
A estratégia foi acertada. Tanto que São Salvador, um dos primeiros projetos de energia enquadrados no PAC, com fi nanciamento do BNDES, fi cou pronto em tempo recorde – 32 meses, dois anos antes do previsto. Inaugurada no início de fevereiro, a hidrelétrica, com custo estimado em R$ 850 milhões, tem capacidade instalada de 243 MW, energia sufi ciente para abastecer uma cidade do tamanho de Campinas (SP), com cerca de 1 milhão de habitantes.
As áreas sociais e ambientais receberam investimentos de mais de R$ 100 milhões aplicados em 35 programas relativos à educação ambiental, ao remanejamento da população, ao monitoramento, salvamento e conservação de fauna, flora e ictiofauna locais, entre outros. Na avaliação do presidente da Tractebel Energia, Manoel Zaroni Torres, esses investimentos vão ao encontro da cultura da sustentabilidade defendida pela empresa. "Estamos orgulhosos em chegar à inauguração sem ter sofrido nenhum entrave com os órgãos ambientais, nem ação do Ministério Público", ressalta Zaroni.
Dois reconhecimentos importantes já foram dados à hidrelétrica, que recebeu a certifi cação inovadora da Declaração de Conformidade Legal e Socioambiental concedida pelo BVQI (Bureau Veritas) para os procedimentos e critérios dos programas socioambientais desenvolvidos. Já o Plano de Comunicação Social da usina venceu, na categoria Comunicação e Relacionamento com a Comunidade, o prêmio Aberje de Jornalismo Empresarial 2008.

GERAÇÃO DE EMPREGOS

As obras foram executadas pelo Consórcio São Salvador (CSS), formado pelas empresas Odebrecht (líder), Andrade Gutierrez (responsáveis pelas obras civis) e Andritz Hydro Inepar (responsável por fornecimento e montagem eletromecânica). O Projeto Conceitual, Projeto Básico, Projeto Executivo – Civil, Elétrico e Mecânico, ficaram a cargo da Intertechne Consultores S.A., e os equipamentos de maior porte foram fornecidos pela Voith-Siemens Hydropower Generation.
A construção e montagem eletromecânica exigiram a contratação direta de 4.500 homens no pico, além de 9 mil empregados indiretos. A usina é composta de três barragens: duas de terra, de 34 m de altura, e uma de concreto, de 50 m, no centro, onde estão a tomada d’água, o vertedouro e a casa de força, equipada com duas turbinas tipo Kaplan. De uma margem a outra do rio Tocantins são 1.196 m de extensão.
O empreendimento compreende ainda a construção de uma linha de transmissão de 75 km, de 230 kV, que leva a energia gerada por São Salvador até a usina de Cana Brava. De lá, parte da energia gerada passa a alimentar o sistema Eletronorte e parte é vendida pela Tractebel ao mercado livre, dos grandes usuários.

PARTICIPAÇÃO IMPORTANTE

A usina é a décima oitava da Tractebel e a terceira inaugurada no Rio Tocantins. As outras duas usinas instaladas no Rio Tocantins são a UHE Lajeado, concluída em 2001 e com capacidade para gerar 902,5 MW de energia, e a UHE Peixe Angical, que entrou em funcionamento em 2006 e tem capacidade para produzir 452 MW. Também estão em andamento as obras da Usina Hidrelétrica de Estreito, entre os municípios de Aguiarnópolis e Palmeiras do Tocantins e o município de Estreito, no Maranhão com capacidade instalada de 1.087 MW.
Para o presidente do Conselho de Administração da Tractebel Energia, e presidente da GDF SUEZ Brasil, Maurício Bähr, a UH São Salvador consolida a posição do grupo como o principal gerador privado e reforça o interesse de investir na expansão da oferta de energia elétrica no País. "Até 2.012, iniciaremos a operação comercial de mais quatro usinas, sendo duas grandes hidrelétricas, Estreito e Jirau, que sozinhas representam 4.387 MW e R$ 12 bilhões de investimento".

SOLUÇÕES CRIATIVAS

A hidrelétrica de São Salvador já começou a operar, mas ainda não atingiu sua capacidade plena. Esse ponto só será atingido, na primeira unidade em final de junho, e na segunda, no início de agosto.
A execução do projeto trouxe ao consórcio responsável pelas obras poucas surpresas. A maior delas foi a geologia do leito do rio, no ponto da ensecadeira de segunda fase, considerada desfavorável. Após a constatação de alguns vazamentos incontroláveis, optou-se por uma solução de engenharia relativamente simples: fazer um esgotamento do recinto ensecado, por células. "Esgotamos uma parte, desviamos aágua para o lado, fizemos o aterro e dominamos a fundação. Depois disso pronto nós esgotamos a outra célula, desviamos a água de novo e também ganhamos a fundação" afi rma Ricardo Muzzi, superintendente de Operação da Andrade Gutierrez.
Fora isso,

ele conta que não houve surpresas. "A geologia daquela região do Rio Tocantins é muito parecida e já era nossa conhecida, por termos executado as obras das barragens do Peixe e Lageado.
Outra solução de engenharia interessante, adotada na obra foi a construção da parte inferior da bacia de dissipação do vertedouro utilizado concreto compactado a rolo. Isso resultou em signifi cativa economia de cimento.
Mas a solução que maior impacto no cronograma da obra, que contribuiu muito para a sua aceleração, foi na área da logística. Como estava sendo desmobilizado o canteiro de obras da barragem do Peixe, a cerca de 120 km de distância a juzante de São Salvador, optou-se por fazer o transporte das máquinas, equipamentos pesados e formas através de balsas, navegando no próprio rio Tocantins.
Usamos balsas de 120 e 150 t., que atracavam em qualquer lugar onde fizéssemos uma terraplenagem simples. Com elas nós gastávamos dois dias de viagem, de peixes até São Salvador, praricamente o mesmo tempo que gastaríamos usando carretas, sóque com as balsas conseguíamos movimentar volumes muitos maiores de cada vez.

RESPONSABILIDADE SÓCIO-AMBIENTAL

São considerados méritos indiretos do projeto a melhoria na infra-estrutura regional e a capacitação de mão-de-obra local. Junto com a construção da hidrelétrica, foram realizados, na região, investimentos em programas de geração de renda e inserção social da população local, com conseqüente melhoria do Índice de Desenvolvimento Humano nos municípios vizinhos
A hidrelétrica exigiu a construção de um reservatório com superfície de 104 km de água, comprimento da ordem de 80 km e um perímetro de 312 km. O volume armazenado não afetará a sazonalidade do rio, ou seja, não irá alterar seu regime de estiagens e cheias. A represa banha cinco municípios: São Salvador, Paraná, Minaçu, Cavalcante e Palmerópolis.
Para a concessão da licença ambiental ao empreendimento foram realizadas audiências públicas com centenas de representantes dos municípios afetados. A empresa responsável pela construção da obra também teve que apresentar estudo sobre o impacto cumulativo da usina com outros empreendimentos no Rio Tocantins, como as usinas de Serra da Mesa, Canabrava, Lajeado, Peixe Angical e Estreito.
Além disso, foram atendidas exigências específicas pelo Ibama, obrigando a elaboração de um projeto básico ambiental para evitar uma eventual contaminação e minimizar a degradação prevista para a área geográfi caatingida pela construção.
Após um ano de iniciadas as obras, o Consórcio São Salvador realizou a primeira edição do programa Escola Esperança, projeto de alfabetização destinado a operários que não possuíam o primeiro grau completo. Com aulas de segunda a sexta-feira, o programa teve duas edições e formou cerca de 100 funcionários. Os diplomas do programa foram reconhecidos pelo Ministério da Educação e têm validade em todo o território nacional.
Além disso, a usina recebeu três certificações nas áreas de Qualidade (ISO 9001:2000), Meio Ambiente (ISO 14001:2004) e Saúde e Segurança (OHSAS 18001:1999). Foi a primeira vez que tanto a Tractebel quanto a Odebrecht tiveram uma obra de hidrelétrica certifi cada nas três conformidades.

INDENIZAÇÕES

O grande diferencial do modelo adotado em São Salvador foi o caráter negociador adotado pela Tractebel desde o início. Tanto o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), quanto os ministérios públicos federal e estadual assinaram com a companhia um compromisso de identifi car as famílias que deveriam receber as indenizações. Sob a coordenação do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), foi criado um fórum de negociações, que realizou 11 reuniões e avaliou, caso a caso, os direitos de cada família sediada na área. Normalmente o Ibama exige a criação dos fóruns, mas nem sempre as partes chegam a um acordo amigável, como ocorreu em São Salvador.
Ao fim de um processo que o executivo chama de "auditoria social", em que agrônomos, assistentes sociais e outros técnicos avaliaram a situação de todas as famílias, chegou-se ao número de 122 famílias a serem indenizadas ou receber terras em outras localidades, por estarem na área antes do estudo inicial. Segundo os advogados das famílias, o grande diferencial para que as negociações fossem amigáveis foi o fato de elas poderem escolher o local para onde queriam ir. Ainda assim, houve casos em que foi preciso insistir para que elas aceitassem terras melhores do que as de onde vinham, que tivessem água disponível, por exemplo.
Para remunerar o vínculo com a terracriado pelos ocupantes que chegaram depois da licença inicial da usina, a empresa indenizou as benfeitorias realizadas nas terras, mesmo que fossem em muitos casos apenas barracas de lona, com um mínimo de R$ 2 mil cada. Quase todas as negociações foram amigáveis. Só meia dúzia de famílias saiu com a presença de oficiais de Justiça ou força policial. O sucesso de São Salvador deverá servir de referência para os próximos empreendimentos da Tractebel no País.

BNDES FINANCIOU R$ 570 MILHÕES
PARA SÃO SALVADOR

Para viabilizar a construção e operar a usina hidrelétrica São Salvador, a Tractebel Energia S/A criou a Companhia Energética São Salvador (CESS), uma Sociedade de Propósito Específico (SPE), que conseguiu, junto ao BNDES, financiamento de R$ 570 milhões, destinados não só à construção da hidrelétrica, como também de linhas de transmissão e de sub-transmissão associadas ao Sistema Interligado Nacional.
A participação do BNDES equivale a 67,25% do investimento total do projeto, de R$ 847,7 milhões. Parte dos recursos aprovados pelo Banco, R$ 380,1 milhões, foram repassados por meio de cinco agentes financeiros (Unibanco, Bradesco, Itaú BBA, Santander e Votorantim). A participação direta do BNDES foi de 22,42% do total do investimento, contribuindo para redução da exposição direta do Banco ao setor, sem restringir sua capacidade de financiamento setorial.
Nos últimos anos, o BNDES aprovou financiamentos de R$ 10 bilhões para 84 projetos de geração de energia, equivalentes a 11,6 mil MW e que resultaram em investimentos totais de R$ 23 bilhões. Para construção de 7 mil km de linhas de transmissão, foram aprovados financiamentos de R$ 3,9 bilhões (R$ 6,1 bilhões de investimento total) e para o setor de distribuição, os financiamentos aprovados pelo banco somaram R$ 2,6 bilhões, que responderam por investimentos de R$ 4,6 bilhões. A car

teira do BNDES para o setor de energia, incluindo as operações ainda não aprovadas, somam financiamentos de R$ 15,2 bilhões equivalentes a investimentos de R$ 32 bilhões que vão gerar 15 mil MW.
Para fins de comercialização de energia, a Companhia Energética São Salvador foi qualificada como empreendimento gerador da chamada energia nova. Nesse sentido, a energia gerada será comercializada no Ambiente de Comercialização Regulado via leilões de energia promovidos pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE). Em leilão de energia nova, realizado em outubro de 2006, a CESS vendeu a totalidade de energia assegurada de 148,5 MW médios pelo preço de R$ 135,01 MWh, com entrega prevista a partir de 2011. Os contratos de compra e venda de energia no ambiente regulado têm duração de 30 anos.


Fonte: Estadão


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