Brasil é o terceiro país no mundo com selo de sustentabilidade em edificações

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José Carlos Videira

“Maior custo de uma edificação não é a construção, mas a operação ao longo de seu funcionamento”

 

Felipe Faria, diretor do Green Building Council Brasil (GBC-Brasil), fala do crescimento das construções sustentáveis no Brasil, das vantagens e dos desafios. Acompanhe a seguir a entrevista concedida à O Empreiteiro.

O que é o Green Building Council (GBC)?

Fazemos parte de um movimento internacional que visa influenciar ou acelerar a transformação das indústrias nacionais da construção, em direção à sustentabilidade. Atualmente são 100 Green Building Council, em diferentes países, cada um com determinado grau de desenvolvimento e atuação no seu país. O Brasil é um dos mais atuantes.

Há quanto tempo o GBC está no Brasil?

Iniciamos em 2007, com 31 empresas. Hoje já são cerca de 850.

Quem são essas empresas?

O leque é variado, são construtoras, incorporadoras, instituições financeiras, fundos de investimento para o mercado imobiliário, fornecedores de materiais, prestadores de serviços. E ainda as grandes contratantes de obras e as administradoras prediais.

Como funciona a organização?

Nossa atuação está centrada em quatro áreas. A primeira é capacitação profissional. Desde 2008, 60 mil profissionais participaram do nosso programa nacional de educação. Informação, que dissemina conhecimento, melhores práticas e casos de sucesso. Outra área é a de relações governamentais, que busca o lobby positivo junto às autoridades, visando políticas de fomento, e a área de certificação internacional de edificações, a Leadership in Energy and Environmental Design (Leed).

Como funciona essa certificação?

Temos diferentes certificações Leed. A voltada para novas construções, que se inicia na conceituação de projeto, passa por toda a fase de construção, e só é concedida depois que a edificação entra em operação. Nos mesmos moldes, também existem certificações específicas para hospitais, para escolas, para prédios existentes e até para bairros.

Como está a demanda por esse tipo de certificação no Brasil?

Hoje o Brasil é o terceiro país com maior número de projetos registrados buscando a certificação, presente em 150 países. São 906 empreendimentos. Desses, 196 já estão certificados. O empreendedor registra o projeto ainda em fase de conceituação. Nessa fase do projeto se visa ter o menor impacto possível da operação dessa edificação ao longo de todo o seu ciclo de vida.

Qual foi a primeira obra certificada no Brasil?

A primeira edificação certificada foi uma agência do então ABN AMRO Bank, atual Santander, na Granja Viana, em 2007.

Quais setores são mais demandantes?

As edificações corporativas são a grande maioria. Prédios comerciais de alto padrão. Todos os novos prédios comerciais de alto padrão, em construção ou recentemente construídos, foram certificados ou estão buscando certificação.

Onde se concentram essas edificações no Brasil?

A grande maioria dos edifícios certificados ou em processo de certificação se concentra em São Paulo, seguido pelo Rio de Janeiro, Paraná e Brasília.

Quais os benefícios da certificação?

Independentemente do valor do m², entre os benefícios de um edifício certificado podemos citar o aumento da velocidade de ocupação e da retenção nessas edificações, o que reduz o risco do investimento. O investidor do mercado imobiliário nesse segmento está atento a essa diferenciação. O cliente desse investidor também já é consciente de que o maior custo de uma edificação não é a construção, mas a operação ao longo de seu funcionamento.

Esse conceito de construção só vale para edifícios comerciais?

Também está crescendo em data centers e plantas industriais. A Coca-Cola, por exemplo, está certificando todas as plantas existentes no Brasil e quer certificar as novas.

O conceito também se aplica a obras de infraestrutura?

Tivemos uma boa experiência, por exemplo, em relação aos estádios da Copa, que buscaram essa certificação.

Não são bem obras de infraestrutura, mas são grandes obras.

Todos os estádios da Copa registraram seus projetos, além dos estádios do Grêmio e do Palmeiras. O do Grêmio já está certificado, assim como outros oito da Copa do Mundo. Os demais ainda não finalizaram o processo da certificação. Foi a primeira vez na Copa do Mundo que tivemos estádios com certificação em construção sustentável, que abrange questões não apenas de eficiência energética mas de uso racional de água, qualidade ambiental interna, material de baixo impacto ambiental e a edificação em relação ao seu entorno. O Estádio do Mineirão, por exemplo, tem capacidade de captar em torno de 6 milhões de litros de água de chuva por ano, usada para a irrigação de gramados, limpeza, uso em banheiros etc.

“Foi a primeira vez na Copa do Mundo que tivemos estádios com certificação em construção sustentável”

Se aplica a obras clássicas de infraestrutura, como pontes, viadutos, rodovias, hidrelétricas, entre outras obras?

Não. Está bem restrita a edificações comerciais. Mas o que foi interessante com a experiência com os estádios é que as empresas que compunham os consórcios também lidam com obras de infraestrutura no País. Passou a ser mais comum o contato de engenheiros desse tipo de obra
querendo compartilhar suas boas práticas em obras de infraestrutura.

Já existe interesse acadêmico nessa área?

Há muitas universidades com MBA ou pós-graduação em construção sustentável, ou universidades com cursos de extensão universitária bem específicos, com temas relacionados ao Green Building. Há muito interesse do ponto de vista acadêmico, na busca de conhecimento e expertise em matérias correlacionadas ao movimento de construção sustentável.

Qual o custo para uma edificação tornar-se sustentável?

Esse acréscimo de custo de construção gira em torno de zero a 4%.

Como se gerencia uma obra que busca ser sustentável?

Uma das barreiras para a construção sustentável é a falta de comunicação entre profissionais. Quando o arquiteto não conversa com o engenheiro, que não conversa com os construtores, com o fornecedor de material. Isso inibe práticas de maior eficiência. Um dos conceitos do Green Building é obrigar a interação entre equipes. Por mais que se tenha uma empresa gerenciando a obra, alinhada com a decisão de certificação, todos os demais prestadores de serviço terão que estar adaptados e adequados a esse desafio.

Como se insere esse conceito construtivo e qual sua importância diante da situação atual de escassez de água em São Paulo?

As edificações certificadas apresentam em média de 20% a 30% de redução de consumo de energia e de 30% a 50% no de água.

No caso de água, quais são os mecanismos de economia?

Vão desde sistemas de captação de água de chuva, passando por louças e metais sanitários de alta eficiência, sensores em torneiras, válvulas com duplo acionamento em bacias sanitárias ao reúso de água. Prédios certificados praticamente zeram a necessidade de água potável para irrigação.

Existem resistências no Brasil ao conceito de construção sustentável?

Entendemos a resistência como falta de informação ou conhecimento da informação errada. Muito se subestima a questão do custo de construção; acham que é muito mais do que é, realmente. Há falta de informação quanto ao principal custo de uma edificação. Não é a construção, mas a operação ao longo do ciclo de vida do edifício.

Fonte: Revista O Empreiteiro


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