ThyssenKrupp e Vale acionam a maior siderúrgica da América Latina para exportar
US$ 1 bilhão em aço sem poluir a atmosfera
Com capacidade de produção de 5 milhões de t/ano de placas de aço, o complexo ThyssenKrupp Companhia Siderúrgica do Atlântico (TKSA) foi inaugurado em junho. Custou US$ 8,2 bilhões para ser implantado, o maior investimento privado feito no Brasil nos últimos 15 anos, gerando mais de 30 mil empregos durante as obras e 3,5 mil diretos na operação. Construído a partir dos mais modernos conceitos técnicos nas áreas de segurança, saúde e meio ambiente, o complexo siderúrgico, localizado na zona Oeste do município do Rio de Janeiro, no distrito industrial de Santa Cruz, num terreno de 9 km2, se transformou em um novo pólo de desenvolvimento regional.
Toda a produção será exportada, o que representa um aumento de 40% nas exportações brasileiras de aço e uma contribuição anual de US$ 1 bilhão no balanço de pagamentos. A Vale, parceira na empreitada, possui uma carteira de investimentos para outras três usinas no valor de US$ 13,4 bilhões, e está em busca parceiros para avançar. Para a Vale, o melhor perfil de parceiro é aquele que costuma elaborar produtos lá fora e vira um cliente cativo que consome os minérios da empresa.
Fruto da parceria da ThyssenKrupp Steel, maior produtor de aço da Alemanha, com 188 mil empregados em 70 países, e principal acionista com 73%, e da Vale, maior produtora de minério de ferro do mundo, que participa da TKCSA com 27%, a construção do complexo siderúrgico orquestrou uma das maiores movimentações de mão de obra da história do país. Do total de cinco milhões, 3 milhões de t da produção anual de placas de aço pela ThyssenKrupp CSA segue para alimentar a unidade de acabamento no Alabama, Estados Unidos, enquanto os outros 2 milhões de t atendem à expansão da companhia na Alemanha.
Além dessa usina, a Vale acompanha a terraplenagem de mais dois empreendimentos: a Alpa, Aços Laminados do Pará, em Marabá, e a Companhia Siderúrgica do Pecém, no Ceará; e aguarda a licença ambiental para dar início à Companhia Siderúrgica de Ubu, em Anchieta, no Espírito Santo. As três usinas devem entrar em operação entre 2013 e 2014. A previsão da Vale é de vender 19 milhões t de minério no mercado doméstico enquanto as importações chinesas podem absorver 40% da produção da empresa.
A lógica dos empreendimentos, como o complexo TKCSA, seria encadear a produção de placas no Brasil com a de chapas finas, laminação de bobinas e outros produtos acabados por parceiros no exterior. A Alpa seria uma exceção. Produziria placas para exportação e laminados para o mercado interno importador. Segundo a Folha de S. Paulo, o plano de negócios da mineradora, ainda não divulgado, pode chegar a US$ 90 bilhões.
Esse empreendimento metalúrgico de uma empresa privada que se autodenomina "grupo tecnológico" atua há 30 anos no Brasil e promete trazer um novo fôlego para a economia carioca que, há mais de dez anos sofre com a falta de investimentos industriais de ponta. A ThyssenKrupp possui 22 unidades no território brasileiro e emprega mais de 12 mil pessoas.
A importância da obra dessa usina está na consolidação do Brasil no setor siderúrgico, alavancando o Rio de Janeiro ao posto de player global.
Segundo dados do IABr, Instituto Aço Brasil, a produção de aço bruto conta com uma capacidade instalada de 48,5 milhões t para um consumo interno de 25,4 milhões t. Mesmo com a manutenção da estimativa de exportação e com uma carteira de investimentos que poderia levar a produção a 77 milhões t nos próximos anos, o excedente mundial de 600 milhões t poderia levar o País a uma situação de ociosidade. Mas para o diretor-presidente da Vale, Roger Agnelli, "o nosso papel é fomentar o crescimento da produção siderúrgica no Brasil, gerando riqueza e desenvolvimento sustentável. A TKCSA é a concretização disso".
O empreendimento da ThyssenKrupp CSA engloba ainda uma usina termelétrica, com capacidade instalada de 490 MW, acionada por gases produzidos durante o processo siderúrgico. Além de garantir a autossuficiência da siderúrgica em energia, cerca de 200 MW serão canalizados para o Sistema Interligado Nacional, a partir de 2011.
O complexo, composto de uma coqueria de 1,9 milhão t, uma sinterização de 5,7 milhões t e dois altos-fornos de 95 m de altura pode produzir até 5,3 milhões t/ano de gusa. A TKCSA conta ainda com um píer de cinco guindastes, capaz de receber dois navios de 75 mil t ao mesmo tempo. Com isso, o Rio de Janeiro vira polo produtor de aço e de energia. A parceira Vale, responsável pelo fornecimento de 130 milhões t de minério de ferro durante 15 anos, calcula que, durante a fase de implantação, as compras de produtos e serviços atingiram, até maio deste ano, R$ 10 bilhões, sendo mais de R$ 5 bilhões no Estado do Rio de Janeiro. Além disso, durante a construção, R$ 1,6 bilhão foi pago em salários e encargos trabalhistas.
Os reflexos da renda gerada com essa injeção de recursos ficaram visíveis na região próxima, no bairro Santa Cruz e no município vizinho, Itaguaí, onde houve expansão de estabelecimentos comerciais e de micro e pequenas empresas. A política de contratação dos mais de 30 mil operários que trabalharam na obra priorizou os moradores da região do entorno. O mesmo critério foi adotado no preenchimento das 3.500 vagas da fase operacional.
"A economia local continuará sendo prioridade nas aquisições de produtos e serviços durante a fase operacional, estimadas em R$ 250 milhões anuais", afirma Ekkehard Schulz, CEO da ThyssenKrupp.
Novo contrato
Em setembro de 2008, com as obras em 20% de avanço físico, a UTC Engenharia assumiu o contrato da obra. Na época, siderúrgica tomou a decisão de transferir o contrato para a UTC ao considerar a expertise da empreiteira em obras de montagem industrial nas áreas de petróleo, gás, energia e siderurgia para clientes como a Companhia Siderúrgica de Tubarão e a Gerdau Açominas. Antes de dar o start na retomada, o engenheiro da UTC, Carlos Galvão, elaborou um diagnóstico do status da obra. Um das principais decisões foi a substituição da mão de obra direta. "Entramos, logo de cara, com cerca de 500 profissionais dos nossos quadros e fomos, aos poucos, treinando e motivando os demais", relembra Galvão. A UTC chegou a aproveitar uns mil homens que trabalhavam na obra desde o início.
Em julho do ano passado, com o içamento da última galeria do transportador principal, com 210 toneladas, a obra atingiu um turning point no cronograma: ficou antecipada em quase trê
;s meses, o que possibilitou a desmobilização do guindaste Liebherr LR 1800, com capacidade de 800 t e lança de 119 m. Essa antecipação permitiu o início das atividades de mecânica no topo do forno, como tubulação, hidráulica, elétrica e instrumentação. No final da obra, mais de 1.200 km de estacas haviam sido empregadas nas fundações e o concreto utilizado atingiu a marca de 950 mil m3.
Uma tarefa que exigiu muito da UTC foi a montagem dos regeneradores com cerca de 2 mil t de caldeiraria pesada. Foram mais de 600 peças de chapas planas de aço vindas do exterior, curvadas e soldadas no Brasil para formar aneis, antes de serem montadas no canteiro. Na obra inteira foram utilizadas 110 mil t de estruturas metálicas.
Inovações tecnológicas
"Essas modernas instalações são motivo de orgulho para nós porque concretizam nossos mais caros princípios, como a busca pela inovação tecnológica a serviço da produção eficiente com respeito à comunidade e ao meio ambiente", afirma Ekkehard Schulz, CEO da ThyssenKrupp.
Para responder à tese de que o mundo desenvolvido repassa a produção de produtos siderúrgicos básicos – a etapa mais poluente da metalurgia pesada – à países menos desenvolvidos, a TKCSA elevou ao grau máximo a preocupação com conceitos de sustentabilidade, desde a fase de elaboração do projeto. Para isso, a ThyssenKrupp Steel trouxe da Alemanha avançadas tecnologias do setor, que garantem níveis mínimos de impacto ao meio ambiente, com o máximo de eficiência e segurança operacional.
A usina termelétrica do complexo siderúrgico também está programada para reduzir a emissão de gases de efeito estufa na atmosfera. A geração de energia também irá proporcionar outro benefício ao País, que será atendido com a venda de 200 MW de energia excedente. Antes mesmo de operar a plena capacidade, a siderúrgica do Rio de Janeiro desenvolveu projetos de redução de emissões que totalizaram 1,7 milhão t/ano de CO2. Desse total, 1,1 milhão toneladas anuais correspondem à redução proporcionada pelo fornecimento de escória produzida pela usina à fabrica de cimento Portland da Votorantim que funcionará dentro do complexo siderúrgico. A escória substitui o clínquer, uma das matérias-primas do cimento, cuja fabricação resulta em grandes emissões de CO2.
Outras 660 mil t/ano de CO2 deixarão de ser emitidas com a utilização dos gases gerados na fabricação do aço para a geração de energia na usina termelétrica. Os projetos foram protocolados nas Nações Unidas para futura negociação de créditos de carbono e estão em fase de validação pela sociedade de avaliação norueguesa Det Norske Veritas.
Para harmonizar o meio ambiente e os processos industriais com o aspecto visual da TKCSA foi criado um projeto, pelo designer alemão Friedrich Ernst von Garnier, para todas as unidades da usina. A idéia é substituir o ambiente cinzento e impessoal das siderúrgicas por uma combinação de cores que integra as instalações e os trabalhadores com a paisagem natural da região.
Responsabilidade social
Segundo o site da empresa, o diretor-presidente da Vale, avaliou as ações de empresas que estimulam a economia local. Roger Agnelli destacou a necessidade de estar alerta aos anseios das comunidades. "O apoio da comunidade é fundamental para operar um empreendimento como este. Não adianta começar um projeto que não esteja em sintonia com a comunidade."
Uma parceria firmada com o Senai do Rio de Janeiro realizou a capacitação de cerca de 1.800 alunos. O programa, que recebeu da ThyssenKrupp CSA investimento de R$ 10 milhões e ainda está em andamento, não apenas forma técnicos que trabalharão na siderúrgica mas também em outros setores, com a perspectiva de crescimento na região, nos próximos anos.
Quando concluído, o Centro de Formação Profissional de Itaguaí, financiado pela ThyssenKrupp CSA, oferecerá cursos de formação profissional voltados para processos industriais e para as áreas de administração, comércio e serviços. A escola técnica terá capacidade para atender 2.864 alunos por ano e será equipada com laboratórios, oficinas, salas de aula e auditório.
Estacas em alto-mar
O complexo TKCSA conta com um píer de cinco guindastes, capaz de receber dois navios de 75 mil t ao mesmo tempo, tanto para receber insumo, o carvão necessário para a operação da usina, como para escoar o aço produzido. Construída pelo consórcio liderado pela Carioca Christiani-Nielsen e pela Andrade Gutierrez, a obra exigiu grandes desafios como a montagem dos equipamentos de grande porte sobre o píer – descarregadores de carvão, guindastes para o carregamento de placas e o sistema de correias transportadoras", declarou Luiz Fernando dos Santos Reis, diretor presidente da líder do consórcio, durante a fase intermediária da construção.
A ponte de acesso, com 3.800 m de extensão e 20 m de largura, possui duas pistas de rolamento para o tráfego de caminhões que transportarão as placas da siderúrgica até o embarque nos navios e, ainda, uma faixa para o sistema de correias transportadoras, responsáveis pela movimentação do carvão até os pátios de estocagem.
Com vãos de 17 m de extensão, a ponte foi construída com vigas transversais apoiadas sobre três estacas cilíndricas pré-moldadas em concreto protendido, diâmetro externo de 80 cm e interno de 50 cm e comprimento médio de 45 m. As estacas foram fabricadas em canteiros especiais montados em área próxima, dentro da usina siderúrgica.
A segunda estrutura, o píer, está constituído por dois berços de atracação situados sobre uma plataforma de 700 m de extensão por 40 m de largura, sobre lâmina d’água de 16 m. O primeiro berço recebe o carvão e o segundo embarca as placas. Essas duas estruturas estão apoiadas em estacas iguais às da ponte de acesso e são constituídas por vigas pré-moldadas em concreto protendido, solidarizadas por uma laje de concreto armado.
"Foram empregados dois sistemas construtivos, segundo as características do terreno e das profundidades da lâmina d’água nos locais de implantação", diz Santos Reis. Ele explicou que os primeiros mil metros da ponte de acesso estão sobre área de mangue, em que o terreno não apresenta nenhuma capacidade de suporte para operação de equipamentos, e a lâmina d’água que varia de +1 a -1,50 m (zona de variação da maré), que impedia a operação de qualquer equipamento flutuante de porte.
Para vencer este trecho, foi empregado o equipamento cantitraveller, que crava as
estacas no solo em alto mar. Nos trechos da ponte que permitiram a operação de equipamentos flutuantes, o consórcio optou por dois bate-estacas flutuantes de grande porte, da Carioca, capazes de cravar até 62 m de comprimento. "Dessa forma, havia três frentes simultâneas de cravação de estacas e montagem de vigas e quatro frentes de fabricação de peças pré-moldadas", contou Santos Reis. Essa abordagem permitiu ao consórcio cumprir os prazos determinados em contrato.
Números da obra
Área de edificações: 8 mil m2
Estacas: 1.800 unidades
Concreto: 110 mil m3
Armação: 17 mil t
Bate-estacas flutuantes: 2
Martelos para cravação de estacas: 4
Guindastes flutuantes: 3
Cantritraveller (com guindaste de 300 t) : 1
Pórticos para 30 t: 12
Operários: 1.900
Engenheiros: 25
Principais fornecedores
Aço: Gerdau
Cimento: Liz
Concreto: Wanmix
Fonte: Estadão