Brasília: agora, o depoimento do mestre Joaquim Cardozo

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Agora que todos já falaram o que quiseram e puderam sobre Brasília e os seus 50 anos, mesmo os que nada mais tinham ou nunca tiveram o que dizer ou jamais saberiam como fazê-lo – que tal dar a palavra ao mais discreto e, no entanto, mais produtivo de seus pioneiros e – por que não dizê-lo – criadores?

A oportunidade de dar a palavra ao poeta e engenheiro Joaquim Cardozo, para lembrar o centésimo décimo aniversário de seu nascimento, teve o apoio de muita gente, incluindo o pessoal do Centro de Documentação e Informação da Câmara dos Deputados. Sob a organização de Danilo Matoso Macedo e Fabiano José Arcadio Sobreira, foi publicado nas Edições Câmara (2009), o volume Forma estática – forma estética.

O livro reúne vários dos preciosos ensaios que Cardozo escreveu sobre engenharia e arquitetura ao longo de sua vida (ele nasceu no Recife em 1897 e faleceu em Olinda em 1978), incluindo a experiência anterior no Recife, antes do golpe de estado de 10 de novembro de 1937; o trabalho que realizou em Pampulha, Belo Horizonte, no período de 1941-1945, de notável importância para a modernização da arquitetura brasileira, e, depois, o marco definitivo: Brasília. Aí, ele teve a oportunidade de elaborar as soluções estruturais que colocaram de pé as edificações projetadas por Niemeyer no espaço urbanístico desenhado por Lúcio Costa. Eis as palavras de Joaquim Cardozo:

"Brasília oferece um exemplo de cidade nova, construída como por encanto. Uma cidade que não começou em torno de um burgo ou de um castelo feudal ou de uma catedral; ou, ainda, de uma praça de mercado; em torno de um pouso de peregrinação ou de um rush para a conquista do ouro. Surgiu no deserto, pelos meios únicos e modernos adequados ao seu surgimento. Surgiu, se expandiu, se desenvolveu a partir das margens das pistas de um aeroporto, porque foram estas as primeiras obras reais da sua origem, as razões do seu milagre.

Lúcio Costa, encarregado da urbanização, procurou nela utilizar tudo o que era então teoricamente conhecido como possível, para o bom funcionamento de uma cidade moderna.

A construção da barragem sobre o Paranoá se fazia quase que como um trabalho à parte, mas obedecendo a uma cuidadosa investigação do terreno, e hoje o lago artificial é um dos encantos da cidade.

O lago, como toda a cidade, é um prolongamento das pistas do aeroporto, cabeça de Brasília, que representa a síntese das possibilidades brasileiras no campo da tecnologia e da cultura.

A parte correspondente às estruturas de concreto armado, utilizadas para manter o equilíbrio dos edifícios da cidade, oferece aspectos novos: a cúpula correspondente ao Senado é um paraboloide de revolução apoiado sobre as vigas da grande plataforma da cobertura. A que corresponde, no mesmo edifício, à Câmara dos Deputados, é um conjunto constituído de uma casca limitada pela superfície de uma zona de elipsoide de revolução…

Os grandes trabalhos arquitetônicos de Brasília, que colocaram Niemeyer na vanguarda dos mais importantes artistas de todos os tempos, e que, entretanto, são apenas uma parte de sua imensa obra, só comparável, em volume, à do pintor Pablo Picasso, foram incompreensivelmente mutilados pela não execução do seu projeto para o aeroporto da cidade.

Brasília nasceu como têm nascido muitas cidades: de uma posse, de um pouso, de uma parada para descanso ou orientação.

Duas linhas cruzadas, duas direções, quatro sentidos, quatro pontos cardeais; um aperto de mão, um signo de paz, de compreensão, de cordialidade entre os homens."

Frase da coluna

"O Brasil criou uma legislação de meio ambiente extremamente rigorosa, só exigida para construções regulares e privadas. O poder público não é multado ou acionado quando se omite, permitindo construções irregulares em encostas e nas margens dos rios".

De Francis Bogossian, presidente do Clube de Engenharia do Rio de Janeiro, no recente evento da revista O Empreiteiro e da Totvs, em São Paulo (SP).


Fonte: Estadão


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